26/02/2006

ESTA SEMANA

CARNAVAL
O senhor Sócrates foi passar o Carnaval à Madeira para se divertir e apreciar as máscaras e as coreografias das escolas integradas no corso que desfilará na avenida marginal do Funchal.
Certamente que a escolha deste local para passar mais umas férias teve a ver com a possibilidade de poder apreciar as performances do seu “amigo” Alberto João, que, para grande decepção de muita gente, já anunciou que este ano não iria ser o bombo da festa.
Seria interessante ver os dois a desfilarem mascarados, mas, segundo a D. Maria Adelaide, progenitora do primeiro-ministro, ela sempre teve muita pena de não conseguir convencer o seu filho a fantasiar-se. Desde pequenino que todos os anos tentava mascará-lo, mas nunca conseguiu, apesar de ele ser uma pessoa muito divertida. Tão divertida que anda a gozar connosco o ano todo.

JUSTIÇA ?
O governo que temos em conluio com a oposição que não existe, está a congeminar uma nova Lei em que os senhores políticos só possam ser investigados por decisão dos Tribunais Superiores.
Esta proposta partiu de uma sugestão do ministro da Justiça, o socialista Alberto Costa, no âmbito dos encontros que manteve com os partidos com representação parlamentar, tendo em conta as reformas dos códigos Penal e do Processo Penal.
É desta maneira que o governo prestigia a Justiça e quem nela trabalha, pois se considera que os Tribunais de Instrução Criminal não prestam para eles porque os Juízes têm menos experiência, está a dar um bom exemplo a todos nós da confiança que eles depositam no sistema, que só deve servir para os Juízes irem praticando com o povinho. E viva a democracia.

22/02/2006

É preciso dizer «Basta!» a estas bestas

Numa altura em que o grupo Sonae, de Belmiro de Azevedo, se prepara para estender a sua teia de negócios à área da saúde, onde outro dos mais poderosos grupos financeiros, o Grupo Mello, já controla fatia de leão, estando, como sabemos, bem instalado nos chamados «hospitais SA», veio o ministro da Saúde do governo socialista, Correia de Campos, mesmo a propósito, ameaçar pôr os portugueses a pagar ainda mais pelo acesso ao Serviço Nacional de Saúde, direito que a Constituição consagra e diz que deverá ser tendencialmente gratuito.

Aproveitando o facto de estarmos todos muito contentinhos, aos pulos e aos gritinhos porque, nesta região do globo, chamada Mundo Ocidental – e auto-proclamado espaço civilizacional inquestionavelmente democrático, cristão, tolerante e detentor das chaves da harmonia universal, onde a miséria e a injustiça foram há muito erradicadas – existe, para além do mais, uma coisa chamada liberdade de expressão, também eu quero manifestar a minha opinião, sob a forma de caricaturas verbais, isto é, opinião de palavras construída, pois desenhar para ouvintes, aos microfones de uma rádio, é coisa que nem mesmo num país de videntes, aparições e outros fenómenos alguma vez se viu – e jamais se verá, suponho eu.

Então, numa das caricaturas, vêem-se o senhor ministro da Saúde, mais o resto do governo – com um tal Sócrates ao meio – mais a bancada de deputados que os apoia, mais o senhor presidente da República, mais o partido a que esta gente toda pertence, o PS, e todos eles são um bando de vampiros esvoaçando sobre um país de mansa carneirada, cada vez mais magra e escanzelada, quase pele e osso, que rói um pasto de cardos secos.
«Não há dinheiro», dizem os gordos e lustrosos vampiros para o rebanho, que já foi devidamente tosquiado, vendo-se em cima, no lugar do céu, a lã dando forma a belas nuvens brancas, onde descansam Mellos e Belmiros, simbolizando, uns e outros, o poder divino do dinheiro. Ali ao pé, de manto azul e com uma coroa de ouro na cabeça gentilmente inclinada, está a Nossa Senhora da Economia, dizendo ao rebanho para ser paciente e ter esperança, que no paraíso celestial, após morrerem, todos os carneiros serão, finalmente, felizes.

Noutra caricatura, à volta de uma mesa farta, chamada Mesa do Orçamento, vêem-se várias caras conhecidas, como Fernando Gomes, o ex-deputado socialista e actual administrador da Galp, que vai começar a receber já em Março, uma reforma de 3.172 euros, um valor que irá acrescentar ao seu salário mensal na ordem de 15 mil euros. Está a ler um ofício da Caixa Geral de Aposentações, onde se diz que o antigo presidente da Câmara do Porto tem direito à pensão desde 1 de Novembro de 2005, o que significa que irá receber ainda os quatro meses em atraso. Está a rir-se e a recitar: «Ó linda democracia, pelo PS amanhada, quem tem um job tem tudo, quem não é boy, não tem nada».

Ao lado dele, risonhos, vemos altos quadros da Portugal Telecom, brindando ao regime especial de aposentação aprovado por Cavaco Silva e confirmado por António Guterres, que lhes dá uma bonificação de 20% na contagem de tempo de serviço para a reforma. Já entregaram os «papéis» para a reforma junto da Caixa Geral de Aposentações. Um deles é Horta e Costa, outro é Iriarte Esteves, outro é Briosa e Gala, outro, ainda, é Graça Bau. Erguem as taças de champanhe e cantam o hino da antiga mocidade portuguesa: «Lá vamos, cantando e rindo…».

Noutro lugar da mesa, estão os cinco administradores do Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento, mais conhecido por Infarmed, a quem o vampiro Sócrates vai aumentar os ordenados em 30 por cento. A proposta partiu dos vampiros das Finanças e da Saúde, e só o presidente do Infarmed passa a ganhar mais 1.300 euros por mês, ou seja, um aumento de 260 contos, mais do que três salários mínimos. Cá em baixo, o rebanho da Função Pública, que não sabe, há anos, o que é aumento de pasto, olha para o banquete que decorre lá em cima, e, cabisbaixo, fica à espera que, quando os vampiros voltarem a atacar, só levem o sangue do carneiro do lado.

Noutra caricatura, vê-se Bush em pose imperial, vestido com uma farda das SS, de braçadeira vermelha com a suástica no braço esquerdo, o direito estendido na saudação nazi, e aos seus pés, prostrados, lambendo-lhe as botas de cano alto, estão os membros do governo português em peso.

Olhando respeitosamente para cima, o vampiro da defesa, Luís Amado, pede desculpa por só ter enviado mais 115 militares para o Afeganistão, mas explica que, mesmo assim, vai ser forçado a aumentar o orçamento, pois os 58 milhões de euros previstos para a função não vão chegar. Diz ele. «Fazemos o que nos é possível, Senhor, seja na Bósnia, no Iraque, no Afeganistão ou no Kosovo. Temos perto de mil homens na ajuda ao combate ao Eixo do Mal, mais viaturas, armas, munições, fardas e equipamentos. Se o vampiro da Saúde conseguir pôr a carneirada a pagar mais pelas consultas, análises, exames e internamentos, pode ser que, em breve reforcemos a nossa ajuda a vossa majestade imperial». Ao lado, Freitas do Amaral faz figas, e mais ao longe, uma ave estranhíssima, lembrando uma pomba travestida de abutre, bate as asas, aplaudindo. Parece Paulo Portas.

Nessa altura, a vampira da Educação pede a palavra e garante a Bush que, se conseguir fechar mais 5 mil escolas do que o previsto, o vampiro das Finanças já pode dotar o ministério da defesa com mais uns milhões de euros para ajudar no esforço de guerra. «Esforço de paz, sua burra!», corrige o vampiro Sócrates, muito aflito e exaltado, o que lhe esganiça ainda mais a vozinha de falsete, levemente ciosa.

Bom, e por aqui ficam os nossos cartoons, as nossas caricaturas verbais de hoje, e muitas mais faríamos se tempo houvesse, porque matéria não falta.

Por exemplo, sobre o desemprego, já que lemos ontem, no insuspeito DN, que os números reais do desemprego ultrapassam largamente os números oficiais, coisa que para nós nem sequer é novidade. Segundo o DN, a taxa do desemprego real já rondará os 11%, em vez dos 8% apregoados pelo Governo. Por outro lado, aumenta a praga dos contratos a prazo, que já ronda os 600 mil – e com tendência para aumentar – o que significa que a lei da selva está instituída no mercado de trabalho.

E é fruto das políticas deste governo – que é, de todos os que conheci ao longo da minha vida, incluindo os governos de Salazar e Marcelo Caetano, o mais violento, cruel, desumano e descarado no vampirizar das classes trabalhadores – que as contas públicas estão como dizem que estão.

Relembro o que aqui já afirmei vezes sem conta. Os desempregados e os trabalhadores com baixos salários consomem o menos possível – e, na maior parte dos casos, nem o indispensável consomem. Em consequência, as empresas produzem e vendem cada vez menos, muitas vêem-se obrigadas a fechar as portas, logo aumenta ainda mais o desemprego. A juntar a isto – e em sua consequência directa – as receitas do IVA, do IRS e do IRC não sobem, embora subam as prestações sociais. É um círculo vicioso infernal, mas necessário à acumulação de capitais, como provam os lucros dos bancos e os balanços das empresas que prestam serviços essenciais, aliás, já devidamente privatizadas, ou a caminho de o serem a 100%.

Por isso, torna-se necessário fechar escolas, centros de saúde, hospitais e aumentar os preços dos serviços públicos, mesmo que isso ponha em risco a saúde e a vida de milhares de portugueses.

Na sua louca cavalgada, Sócrates e companhia não mostram respeitar nada, nem ninguém. Da mais frágil das crianças, ao mais débil dos idosos, todos estamos a ser triturados pela maioria absoluta do PS. É a carnificina absoluta que o governo socialista tem em marcha.

Nenhum meio será excessivo para travar esta bestialidade.

Por isso, é preciso dizer «Basta!» a estas bestas.


(Crónica de João Carlos Pereira - Lida aos microfones da Rádio Baía em 22/02/2006)

19/02/2006

ESTA SEMANA

MAIS MEDALHAS
Já deixou de ser notícia as condecorações que o ainda Presidente da República em exercício tem vindo a atribuir em catadupa, não só porque não se vislumbra qual o critério que ele tem seguido, como também porque agora até as entrega às escondidas.
E pensávamos nós que estas distinções deveriam ser públicas para servirem de exemplo e para, de forma inequívoca, serem o reconhecimento do País a personalidades que se destacaram nas suas actividades em prol de Portugal ou dos portugueses...
A única coisa que se aproveita de tudo isto é que estas acções têm dado muito trabalho à empresa que fabrica as condecorações, podendo assim manter-se activa e continuar a manter os postos de trabalho.

DESEMPREGO
Por falar em postos de trabalho e de acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatística referentes ao último trimestre de 2005, o desemprego continua a aumentar, tendo chegado já aos 8%, cifrando-se em 447.000 o número de cidadãos que continuam à espera da promessa feita pelo então candidato Sócrates, que disse, iria criar novos 150.000 postos de trabalho se fosse eleito.
De certo modo ele até está a querer cumprir, pois só para o seu gabinete já nomeou 15 secretárias pessoais, 18 assessores e 13 adjuntos, para além das 2148 pessoas para os gabinetes ministeriais.
Dizem alguns sindicatos e centrais sindicais que a tendência para o aumento do desemprego só pode ser invertida se houver uma reformulação da economia. Mas qual economia ? Só se for a de monopólio do Sr. Belmiro e dos seus colegas e amigos.
Antes de 1974 a economia portuguesa estava ao sabor de meia dúzia de famílias. Hoje as famílias são no mesmo número, só se juntaram foram uns quantos primos espanhóis.

PIDESCOS
É inconcebível o acto praticado pelo Ministério Público na redacção do Jornal “24 Horas”, sendo inqualificável esta atitude de contornos pidescos, cujo único objectivo que se pode vislumbrar é o de vingança pelo que o periódico tem divulgado sobre os misteriosos procedimentos de investigação, não só em relação ao processo de pedofilia, como em relação a outros processos.
Por aquilo que vamos constatando, hoje a investigação é feita de forma tão atabalhoada e inconsistente que os processos quando chegam a tribunal acabam por dar em nada, salvo em raríssimas excepções que só vêm confirmar a regra.
O ainda Presidente da República em exercício exigiu ao Procurador Geral um inquérito urgente para se saber os motivos que levaram o Ministério Público a solicitar e a guardar informações sobre o movimento de alguns números de telefone atribuídos a altas figuras do Estado.
Já se passou mais de um mês sem qualquer resultado e como são impotentes (ou querem sê-lo) para investigarem dentro da sua própria casa, viraram-se para o “24 Horas”.
É uma vergonha. Alguém ponha cobro a mais esta prepotência e demitam urgentemente o Sr. Souto Moura.

15/02/2006

Hoje, estou muito satisfeito…

Hoje, estou muito satisfeito. Ao contrário do que é habitual, só tive boas notícias, daquelas que me fazem perceber como a nossa civilização, a nossa cultura, o nosso sistema económico e o nosso sistema político são a coisa melhor que há. Que nunca se desfaçam!

Eu explico: em 4 de Dezembro de 2003, e a propósito de um relatório do Banco de Portugal, escrevia eu, no editorial do jornal Outra Banda, o seguinte: «É neste cenário absurdo que o Banco de Portugal veio dizer, pela severa pena do socialista Constâncio, que o pagamento das pensões e as despesas com o subsídio de desemprego estão a complicar a consolidação orçamental. Por outro lado – e aqui é que está o busílis – a esperada retoma só poderá acontecer para o ano (e é se for…) se houver contenção salarial». Escrevi isto, notem bem, em Dezembro de 2003.

Dois anos e dois meses depois, o mesmo senhor Constâncio vem dizer que a economia portuguesa só regressará a um crescimento "mais normal" dentro de dois ou três anos, mas que tal não significará a retoma da convergência geral com a média da União Europeia, o que quer dizer: ninguém pense em melhorar, em ganhar mais, se trabalha por conta de outrem. E nem é preciso sermos bruxos para sabermos que, daqui a outros dois ou três aninhos, o mesmo senhor (ou outro igual a ele), dirá aos portugueses o mesmo que disse agora, e que, como acabámos de lembrar, já tinha dito em 2003..

Pois foi. A retoma não aconteceu em 2005, apesar das palavras de 2003 para se justificarem os cortes orçamentais na Saúde, na Segurança Social e, principalmente, apesar dos funcionários públicos terem sido aumentados sempre abaixo da inflação. Houve contenção salarial, os portugueses fizeram sacrifícios, muitos sacrifícios, (menos o senhor Constâncio e respectivo séquito, actual e passado, menos os senhores deputados e membros do Governo, menos o senhor presidente da República e os ex-presidentes da República, menos os senhores presidentes das câmaras municipais e seus vereadores, menos os senhores presidentes disto e daquilo e respectivas equipas de gestão, menos os senhores que se assentam nos conselhos de administração das empresas públicas e que, como os outros que atrás disse, vivem do erário público, ou seja, do nosso rico dinheirinho, já para não falarmos dos donos dos bancos e das companhias de seguro, ou dos grandes grupos económicos, porque esses só fazem um «sacrifício»: o de viverem à grande e à francesa, expressão que mais deveria ser: «À grande e à portuguesa»), então, como eu dizia, os outros portugueses todos fizerem (que remédio!), os sacrifícios que sabemos, mas, ou porque os governantes não prestam para nada, ou porque a coisa está feita para ser assim mesmo, tudo está como estava em 2003 – ou pior.

E pergunta o Zé, mas aquele Zé que não é estúpido de todo, aquele que já percebeu que aqui anda marosca – e da grossa: «Então, isto é sempre o vira o disco e toca o mesmo, que é como quem diz: isto toca sempre aos mesmos? Pagam uns a engorda dos outros? Mas a malta não aprende?».

Parece que não. Somos levados ao engano, como o touro na arena, e até parece que gostamos, de tão mansos, cegos e broncos que somos. Disse alguém que o homem é o único animal que tropeça duas vezes na mesma pedra; e quem descobriu a anomalia, decerto ainda não conhecia o caso português, se não diria, em vez de duas, uma data delas, que arriscar um número, e acertar, deve ser mais difícil que adivinhar a chave do euromilhões.

Mas isto estou eu farto de dizer, e só o repito para desabafar – e, também, na esperança que algum cego me ouça, um cego dos piores, que, como sabemos, são aqueles que não querem ver. Que me ouça… e abra os olhos. Mas, disse eu que hoje só falava de coisas boas e, pelos vistos, estava a tentar ser irónico. Nada disso, são boas as notícias do Banco de Portugal e do socialista Constâncio, pois indo os portugueses continuar a apertar o cinto, sempre será uma ajuda na luta contra a obesidade e o colesterol, apesar de alguns dizerem que se engorda muito mais por se comer mal, do que por comer muito.

Depois, quero dizer da minha satisfação ao ver os civilizadíssimos, corajosos e honrados soldados britânicos da força de ocupação do Iraque a espancarem garotos desarmados, após terem sido convenientemente arrastados para um pátio resguardado, numa demonstração do que é o verdadeiro espírito ocidental, quando lhe soltam a rédea. Garotos ingratos, que apedrejaram os seus benfeitores e nunca mais aprendem que devem os povos primitivos sujeitar-se às botas invasoras, pois o que a invasão lhes leva, já não é tanto a cruz (se é que alguma vez o foi, e não passava apenas de pretexto) mas o modo de vida ocidental, brilhante, justo, humano, solidário, até ao dia em que só haja Ocidente até à consumação dos séculos. Ámen. E isto é coisa que, certamente, com jeitinho ou à bomba, se há-de ensinar a toda a gente, o que sempre será mais fácil do que pôr a terra a girar ao contrário, fazendo o sol nascer do lado da gloriosa mãe de tudo o que é bom, a fantástica nação norte-americana. YESSSSS!

Por isso, também fiquei muito contente com as notícias que nos falam do próximo ataque dos EUA ao Irão, não só para impedir que eles recebam euros em vez de dólares pelo petróleo que por lá existe, mas porque a energia nuclear está totalmente proibida a gente de cor menos clara, ou mesmo escura, a menos que se trate de alguém de alguma confiança (até ver), como os paquistaneses ou os indianos, ou, tão forte, como os chineses, que ainda é arriscado aos rambos armarem-se em maus com gente mais musculada. Para o Irão, pois, rapidamente e em força, principalmente porque a produção de petróleo já passou o seu pico e há que arrebanhar o que resta.

Outra notícia deliciosa prende-se com a ida de dona Fátima Felgueiras à outra Fátima, a da Nossa Senhora, acompanhada por uns milhares de felgueirenses, ao que consta em manifestação espontânea, o que muito surpreendeu a distinta e católica senhora. Se eu fosse o Major Valentim, aproveitava a deixa e rumava já à Terra Santa, mais uns milhares de Gondomarenses, e, no caso de Isaltino, fazia uma excursão ao Vaticano, com passagem pela Suiça, levando, pois claro, os seus apoiantes de Oeiras. Depois disso, que poderes terrenos se atreveriam a pedir-lhes que prestassem contas à Justiça, sem que corressem o risco de arderem juízes, tribunais, Código do Processo Penal e demais instrumentos judiciários, nas profundezas crepitantes do inferno?

Festejemos, agora, os mais de 370 despedimentos (372, para sermos exactos) que a fábrica de calçado luso-alemã, chamada Rohde, vai realizar em Pinhel. Nem os vários processos de “lay-off” a que a administração recorreu em 2004 e 2005 salvaram a empresa, o que quer dizer que esse famoso expediente legal não serve para nada, a não ser para ir buscar ao Estado mais umas coroas destinadas a financiarem a deslocalização que se segue. Mas a notícia é boa, porque vem provar uma velha teoria que nos diz que a raça humana é mais débil do que as outras espécies do reino animal, porque usa roupa e calçado a partir do momento em que nasce. Se fizermos, por exemplo, como as aves, como os ratos, como os cães e os gatos, que nunca se vestem, saberíamos suportar o frio e a chuva e, de um modo geral, todas as agressões climatéricas, como esses animais suportam.

A Rohde, ao fechar a sua fábrica, por alegada quebra nas encomendas, só prova que as políticas seguidas pelos nossos governos, e inspiradas e aplaudidas pelo senhor Constâncio, o tal socialista que governa o Banco de Portugal, estão a ensinar os portugueses a viverem de forma mais saudável, o que significa comer pouquíssimo e andarem nus e descalços, daí a menor procura de calçado. Já viram algum pardal, às seis da manhã, na fila do centro de saúde dos pardais, só porque dormiu no ramo de uma árvore, em pleno Inverno, sem pijama, lençóis, cobertores e saco de água quente? Eu nunca vi. Finalmente, meus caros ouvintes, os portugueses começam a ver os resultados das corajosas políticas governamentais. E eram tão fáceis de adivinhar!

Não queria acabar esta conversa sem duas boas notícias Uma, é que a minha vizinha, a dona Maria Venância, viúva, vai receber, graças a mim, um subsídio do Estado para atenuar as suas dificuldades. É que eu vi-a prestes a deitar fora a carta da Segurança Social onde era informada de que, se tivesse mais de 80 anos e recebesse menos de não sei quantos euros por ano, podia requerer esse subsídio. «O que é que está fazer, dona Venância?», perguntei eu, suspeitando de que havia ali disparate. «É uma carta qualquer, mas eu não percebo nada daquilo…», confessou ela, habituada que está a receber muita palha e conversa da treta na caixa do correio. «Mostre cá». Ela mostrou, eu li e perguntei-lhe: «Já tem mais de 80 anos?». Respondeu: «Já. E já não devo andar por cá muito mais tempo». E eu: «E quanto é que recebe de pensão por ano?». «Eu sei lá disso, filho! Eu nem sei quanto recebo por mês, agora cá por ano… Olha, só sei que é pouco». A boa notícia é, portanto, esta: fi-la guardar a carta e encaminhei-a para uma amiga minha que, aqui na nossa freguesia, trata destas e doutras papeladas. Com esta não se safa o Sócrates. O pior, são os outros, aos milhares, que não têm a sorte de conhecer um gajo porreirinho como eu…

A outra notícia ainda é melhor. Está para breve, por iniciativa do PS, a discussão da possibilidade dos meninos e das meninas, e dos homens e das mulheres com opções sexuais anormais, quer-se dizer: que gostem de fazer sexo com parceiros do mesmo exactíssimo sexo – e se digo anormais não é com sentido depreciativo ou insultuoso, mas porque estou convencido que a maioria dos seres humanos não tem essas opções sexuais, preferindo ir a vias de facto com indivíduos do sexo oposto, o que também é normal, se quisermos perpetuar a espécie – mas dizia eu, está para breve a discussão, por iniciativa da JS, da possibilidade de termos casamentos homossexuais. E se esta notícia já é boa, a melhor – e é a ela que me refiro – é a que li ontem, segundo as quais existem cães sexualmente abusados por humanos. É também uma opção sexual, tão legítima como outra qualquer, prova do amor sem limites que pode haver entre um canídeo e um humano. E quem fala em cães fala em galinhas, em vacas e mulas, e bastante bibliografia existe a relatar-nos casos destes amores extremos. A Selva, de Ferreira de Castro, por exemplo.

E… já agora: se a lei pode vir a contemplar o casamento entre duas pessoas do mesmo sexo, pelas razões sabidas e, entre elas, porque as coisas são como são – e nada há como encarar a realidade – não estaremos a um passo de, para além de podermos casar com o nosso cão, cadela, galinha ou avestruz, podermos dar forma de lei àquilo que ainda é mais comum no plano amoroso e sexual: o casamento polígamo, ou seja, cada um casar com quantos amores, aconchegos ou arranjinhos, relações tiver, se para aí lhes der a veneta?

Não! Não me digam que a poligamia não faz parte da nossa cultura cristã, ocidental. Mentir em certas coisas, como, seja na política, até se compreende. Mas mentir nisto, francamente, já me cheira a hipocrisia…


(Crónica de João Carlos Pereira - Lida aos microfones da Rádio Baía em 15/02/2006)

12/02/2006

ESTA SEMANA

O RESPEITO PELOS MUÇULMANOS
Muito já se disse sobre os acontecimentos resultantes das caricaturas do Profeta Maomé e algumas opiniões de uns quantos iluminados da nossa praça roçam a imbecilidade e ignorância, apenas querendo colocar a questão na óptica da liberdade de expressão. Ou seja, eu posso ofender o pai, a mãe, a família toda desses cretinos, porque nada me pode impedir de utilizar a liberdade de me exprimir. Eles têm o direito de contestar (sempre pacificamente) porque nas democracias é assim.

Por razões de ordem profissional, pessoalmente já estive por diversas vezes em Países cuja religião predominante é o Islamismo (algumas delas até em época de Ramadão), pelo que me sinto à vontade para poder compreender e respeitar as crenças de cada um, sendo impossível comparar a fé ou poder afirmar que esta ou aquela religião é melhor ou pior que a outra. Aquilo que para uns pode não ser ofensivo, para outros é e isso basta para que sejam respeitados.

Já testemunhei “in loco” situações de profundas manifestações de fé e de sacrifício em nome daquilo em que se acredita, nalguns casos até que considero exageradas, mas isso não me dá o direito de julgar ninguém ou de querer que pensem da mesma maneira que eu, não só porque temos educações e princípios diferentes, mas fundamentalmente porque liberdade é também tolerância e o respeito pela liberdade dos outros.
Tudo o resto é demagogia.


PORTUGUESES DE BADAJOZ ?
As mulheres da região de Elvas poderão passar a ter os seus filhos na maternidade de Badajoz, se, como se admite, venha a ser encerrada a maternidade de Elvas, hipótese que está a ser analisada pelos responsáveis regionais de saúde.
Actualmente, as mulheres do concelho de Elvas e das regiões limítrofes da raia têm habitualmente os filhos na maternidade de Elvas. No entanto, nos últimos tempos tem aumentado também o número de mulheres da região que optam por dar à luz em Badajoz, recorrendo sobretudo a clínicas privadas, através de seguros de saúde.

Para Luís Ribeiro, presidente do conselho de administração dos hospitais de Portalegre e de Elvas, as mulheres portuguesas do interior "têm o direito a fazer os partos em condições idênticas às de Lisboa", considerando indiferente se um bebé nasce em Elvas ou Badajoz. "se for filho de portugueses, a criança é portuguesa", argumentou.

Pegando nas declarações do Sr. Ribeiro e seguindo o seu raciocínio, poder-se-ia estender estes “benefícios” a outras especialidades médicas, passando também os 234 mil cidadãos portugueses em lista de espera para intervenções cirúrgicas a poderem ser operados em Vigo, Salamanca, Badajoz ou Huelva. Também não deixariam de ser portugueses e veriam os seus problemas de saúde resolvidos rapidamente.

Se tudo isto não fosse ridículo e triste, dava para rir. Ao que se chegou em Portugal naquilo que era suposto ser um Serviço Nacional de Saúde.


ALCATIFAS DA LOUSÃ
Aqui há uns anos foi notícia que o dono das Alcatifas da Lousâ (salvo erro de nome Jorge Gonçalves) queria oferecer “jeeps” aos seus colaboradores, tendo alguns dos seus herdeiros entrado com uma petição em tribunal para que fosse travado esse processo com a alegação de insanidade mental do velho senhor.
Parece que o tribunal lhes deu razão e o benemérito acabou por morrer sem ter podido cumprir a promessa que fez àqueles que o ajudaram a criar a riqueza e de que os familiares parasitas vieram a beneficiar, sem nunca terem trabalhado ou contribuído para isso.

Soube-se agora que um dos herdeiros irá cumprir a vontade do falecido tio, abdicando da sua quota parte, homenageando assim a memória de quem muito fez pela sua terra e pelos seus colaboradores.

Aqui está um bom exemplo de empresário que o nosso Presidente ainda em exercício se esqueceu de condecorar, mesmo que a título póstumo. E este sim, bem o merecia.

08/02/2006

E Jesus Cristo é marine?

Não sigo qualquer religião, pelo que, de um modo ou de outro, todas elas me parecem coisas estranhas, meras fantasias desnecessárias – e só não digo que existem fora de qualquer contexto racional, porque as considero, em muitos casos, meios excepcionalmente racionais de arregimentação e controlo de milhões de seres humanos: os crentes. Contudo, não tento impor a minha não crença a ninguém, da mesma maneira que não reajo bem quando alguém tenta impingir-me aquilo em que acredita.

Como é normal, conheço melhor a religião católica, na qual, aliás, fui iniciado ainda garotinho, e tive de suportar, a contra-gosto, as missas dominicais, a catequese e a primeira comunhão. Mas, aí por volta dos onze, doze anos, consegui libertar-me do sacrifício que era sujeitar-me aos ritos litúrgicos e às ladainhas, e nunca se me revelou, daí para cá – como antes nunca se me revelara – qualquer vestígio do chamado mistério divino. Se tivesse vivido nos santificados tempos da Santa Inquisição, o mais certo era ter acabado os meus dias feito archote, depois de ter passado tratos de polé nos cárceres misericordiosos do Santo Ofício.

Não acredito, nunca acreditei, e pronto! Mas também não hostilizo. Porém, vivo numa sociedade onde o fenómeno religioso é uma realidade que afecta crentes e não crentes, e onde, pelas mais diversas vias, a influência da hierarquia religiosa sai do âmbito restrito dos locais de culto e tenta impor os seus pontos de vista – os seus dogmas – como algo inquestionável, não só para os seguidores do culto, como – e especialmente – para a generalidade da população. É como se existisse sempre, sobre a cabeça de quem não obedece a Roma, uma espada e um estigma. Como se os não crentes fossem as ovelhas negras do rebanho humano, algo que oscila entre um ser depravado e um ser incapaz de entender a verdade revelada por ela, a hierarquia religiosa. Um ser, em suma, a quem está reservada a condenação eterna, mesmo sabendo-se que o catolicismo é apenas uma religião – e não a maior – entre muitas outras. Não crentes à parte.

E é precisamente porque vivo numa sociedade onde a religião se intromete em tudo e, por consequência, se intromete diariamente no nosso quotidiano, onde tenta impor-se como detentora da verdade absoluta, que, aqui ou ali, me sinto legitimado para reagir ao abuso. Serve isto para dizer que não me daria ao trabalho de abordar assuntos religiosos, se os assuntos religiosos não me fossem servidos a qualquer hora do dia ou da noite.

Mas vem isto tudo propósito das caricaturas do profeta Maomé, publicadas por um jornal dinamarquês.

Em primeiro lugar, deve dizer-se que essas caricaturas não se limitaram a usar a figura de Maomé para ilustrar uma qualquer brincadeira religiosa, ou não. Nada disso: elas associavam o profeta àquilo a que o mundo ocidental decidiu etiquetar como radicalismo islâmico de matriz terrorista. Mais do que a utilização de uma figura central da religiosidade islâmica, está a visão arrogante de um cartoonista – o mesmo é dizer, neste caso, de uma civilização que se julga com o direito de tratar todas as outras como coisas menores, que podem ser espezinhadas e ridicularizadas sempre que lhe der na realíssima gana. Por isso, as caricaturas, para além de utilizarem uma entidade religiosa, servem o espírito de cruzada que o Ocidente, levado pelo cheiro do petróleo, reacendeu, especialmente com o advento do inominável George Bush, em relação ao mundo islâmico.

Em segundo lugar, e fruto dos vários séculos em que milhões de muçulmanos foram (e continuam a ser) duramente explorados, especialmente no chamado Médio Oriente, quer através do domínio colonial exercido por várias potências ocidentais, quer pelas monarquias ou ditaduras, que depois lá deixaram para tratar dos seus interesses, quase sempre com o petróleo relacionados – e algumas ainda hoje subsistem na região – pouco restou a esses povos para além de entregar a Alá a condução da sua vida. Povos sujeitos à injustiça, à miséria e à ignorância, povos condenados à mais dura sobrevivência, onde a esperança de um futuro menos sombrio é tão irreal como as miragem no deserto. E é aqui que o radicalismo é gerado, como única saída aparente para uma vida onde a dignidade humana deixe de ser tão fortemente aviltada. Uma vida que, de tão má, confere à morte o sentido de libertação redentora.

Em terceiro lugar, quanto mais inculto e oprimido é um povo, mais se agarra à força divina como tábua de salvação. Falam os nossos ricos, os ricos ocidentais, em Deus, mas não lhe pedem – se é que pedem alguma coisa – o que lhe pede o pobre. Deus, para os ricos, é uma figura de retórica, um adorno, um acessório, pois se o não fosse, agiriam de acordo com aquilo que se diz ser a sua vontade, e que Jesus Cristo terá pregado de forma tão clara. Nada que tenha a ver com aquilo que por esse mundo fora se faz, já que o que se prega é o contrário do que se pratica. Deus, para os pobres, no entanto, é a última esperança, é o bálsamo para as suas dores, o pão para a fome dos seus filhos.

Dizem os nossos arautos da liberdade de expressão – da chamada liberdade de imprensa – que caricaturas como aquelas, que tanta polémica estão a gerar, não passam, na nossa civilização (que é a única que se aproveita), de coisas aceitáveis e próprias de uma sociedade livre e democrática, onde a crítica e a opinião podem assumir as mais diversas formas. E dizem mais: que nós, «os civilizados», nunca reagiríamos como certos sectores do mundo islâmico estão a reagir.

Pode ser. Mas é muito fácil viver no meio da prosperidade, auferir ordenados principescos como comentarista, cartoonista, jornalista ou analista político – e só viver nessa prosperidade porque se sabe escrever, dizer ou desenhar o que convém aos seus patrões – e, do alto dessa abastança, não só gozar com a crença dos outros, como fazer disso um meio para contrabandear as ideias racistas e neocolonialistas que alastram por este civilizadíssimo mundo ocidental. E se o mundo islâmico é, como se diz, radical, pobre e ignorante, não será o mundo ocidental um espaço sem valores, insensível e pleno de arrogância intelectual, onde o dinheiro é o único e verdadeiro Deus?

Não é, por tudo o que disse, o aspecto religioso que me preocupa nas famigeradas caricaturas, embora suspeite que o artista não seria capaz de utilizar a ironia da sua arte noutros quadrantes. Para, por exemplo, denunciar as contradições entre a miséria que existe na Europa do Sul e a na América Latina, regiões de clara influência católica, e o ouro e os brocados que cintilam no Vaticano. Para chamar a atenção para essa obscenidade, que é o conforto luxuoso da hierarquia católica, quase toda anafada e coradinha, ao pé da miséria extrema que afecta milhões de católicos, sem que a Igreja faça mais do que pregar à resignação e à esperança na outra vida, a que chamam de vida eterna, enquanto os governos ocidentais, muitos deles seguidores de Roma e declarando-se tementes a Deus, são responsáveis por injustiças e atrocidades sem nome, onde uma guerra – ou várias guerras – são apenas meros detalhes. A ferro e fogo, como agora se vê, sempre governaram os donos da cristandade.

Por isso, pergunto se faria o senhor caricaturista dinamarquês, sem pôr em risco o seu emprego, (apesar da tal liberdade de imprensa) meia dúzia de caricaturas para, por exemplo, responsabilizar Jesus Cristo, o filho de Deus, pelo genocídio atómico em Hiroshima e Nagazaki, pelos bombardeamentos na ex-Jugoslávia e no Afeganistão? Seria capaz de desenhar Cristo, fardado de Marine, a pilhar os museus de Bagdade, a assassinar civis em Falujah, ou a bombardear aldeias no Paquistão? Atrever-se-ia a caricaturar o Deus dos católicos, disfarçado de agente da CIA, a torturar suspeitos na base de Guantanamo, a assassinar resistentes afegãos ou iraquianos, em prisões secretas na Europa e na Ásia, durante os interrogatórios a que os sujeitam? Ou de pôr a Virgem Maria em Abu Graib, em práticas obscenas com prisioneiros nus, empilhados em cima uns dos outros?

Que diria o senhor director do jornal dinamarquês se o seu caricaturista, à sombra da sua liberdade criativa e da jamais negada liberdade de imprensa e de opinião, fizesse umas graçinhas destas?

Fica a pergunta, porque a resposta, essa, todos nós a sabemos.


Crónica de João Carlos Pereira - Lida aos microfones da Rádio Baía em 08/02/2006

04/02/2006

ESTA SEMANA

BILL GATES
Pronto! Temos que dar a mão à palmatória e considerar que afinal o homem é podre de rico mas não deixa de ser um benemérito, que é uma pessoa simples mas que tem de possuir uma alta segurança pessoal, que não liga a grandes protocolos mas que merece ser condecorado por Reis e Presidentes, etc.
Ele até quer que toda a gente tenha um computador para que possam adquirir os produtos que as suas empresas vendem a preços exorbitantes.
Muitos governos, incluindo o português, regozijam-se por ele oferecer cursos e instalar os seus programas operativos gratuitamente, não se esquecendo de o compensar com uns contratos no valor de milhões de euros para a renovação e manutenção dos produtos que aparentemente não têm custos iniciais.
Qualquer semelhança com alguns operadores de telecomunicações que oferecem telemóveis para fidelizar (amarrar) os clientes durante anos, deve ser pura coincidência.

EMEL
Uma diligente funcionária da EMEL, empresa municipal que explora os condutores que têm necessidade de estacionar as suas viaturas na cidade de Lisboa, teve a ousadia de multar o motorista de sua excelência o Ministro da Justiça, sendo por isso, pela raridade da situação, notícia em jornais e televisões, conseguindo assim, pelo seu acto, o tal momento de glória a que todos têm direito.
Provavelmente, pelo impacto da notícia, irá ser louvada porque cumpriu profissionalmente as directivas dos seus superiores hierárquicos e não se intimidou por a viatura ser do Estado e estar ao serviço de um Ministro.
Faz lembrar aquele porteiro do Hospital de Faro que impediu, como lhe competia, vedar a passagem a pessoas estranhas ao serviço, só que a pessoa em causa era o Primeiro Ministro (hoje eleito Presidente da República) acabando por ser despedido.
Parece que o Tribunal ao fim de mais de uma década o mandou reintegrar, mas isso não o irá compensar por todos os anos que teve de sobreviver sem recursos, apenas porque cumpriu zelosamente as normas que estavam instituídas pelos seus superiores.
Esperemos que não aconteça o mesmo àquela jovem da EMEL e que ela continue a ter o seu emprego assegurado.

BARREIRAS ARQUITECTÓNICAS
Depois de vermos o nosso primeiro Sócrates andar amparado a duas canadianas (garanto que isto nada tem a ver com a piada que corre pela Internet) tivemos algumas esperanças que finalmente fosse cumprida a legislação sobre barreiras arquitectónicas.
Afinal como ele já está melhor e não necessita de andar agarrado a nada, o seu Partido Socialista que tem a maioria na Assembleia da República, rejeitou uma proposta votada favoravelmente por todos os outros, que, entre outras medidas, preconizava a introdução de novas normas técnicas aplicáveis exclusivamente aos edifícios habitacionais e o alargamento do âmbito de aplicação das normas técnicas de acessibilidades aos edifícios habitacionais com mais de dois pisos. Estabelecia ainda normas sobre o acesso de deficientes a edifícios e espaços públicos, bem como a criação de um Fundo de Apoio à Pessoa com Deficiência
Parece que a única solução é mandar esquiar para a Suiça todo o Governo acompanhado dos deputados da maioria; pode ser que assim, depois das quedas esperadas, se apercebam das dificuldades que os invisuais e os deficientes motores enfrentam no dia a dia.

01/02/2006

Havias de ver…

Há muitos ouvintes que, por não gostarem de entrar em directo entre as 9 e as 10 de cada quarta-feira, me contactam depois, pessoalmente, por e-mail, ou telefonicamente, dizendo de sua justiça sobre o que aqui se passa. Influenciado por isso – e porque uma mudança de estilo já germinava há algum tempo na minha cabeça – decidi dar um novo formato às nossas «provocações». Não mudarei de objectivos, mas tentarei mudar a forma, tanto mais que me sinto mais à vontade se puder fantasiar sobre a realidade.

Veremos se isso agrada aos ouvintes, porque é para isso – para lhes agradar – que aqui estamos. Para isso, e para continuar o nosso combate pela democracia política, económica, social e cultural. A nossa luta contra a mentira e a desigualdade, contra as políticas que têm conduzido o nosso país para o esgoto, sítio que, como todos sabem, está sempre abaixo da… cauda.

Para isso – para dar vida a esse novo formato – vou trazer-vos, numa primeira fase, textos que escrevi há alguns anos no jornal Outra Banda, algumas deles sob o pseudónimo de André. Descobri – vejam lá! – que se mantêm perfeitamente actuais, o que nos permite avaliar como este país não anda, nem desanda. Comecemos, hoje, por um texto subscrito por esse tal André, personagem que, no dizer de alguns leitores, «escrevia ainda melhor do que eu». Eles é que diziam…

Vamos a isso:

«Há dias, estava eu a descansar de estar vivo, refastelado num banco de jardim, ali ao pé de um sítio que ninguém conhece, quando um gajo se sentou ao meu lado e disse: «Olá, boa tarde. Dá-me licença?». Eu, que tinha os olhos semicerrados, como convém a um tipo que está meio hibernado, grunhi qualquer coisa e fiz que sim, com a cabeça.

O gajo pigarreou e vi logo que o fulano queria meter conversa. Tás lixado, pensei, disposto como estava a não aturar ninguém, a começar por mim. Se vens à espera de trela, vais ficar a falar sozinho, concluí para mim mesmo. Foi quando o gajo disse: «Olha lá, põe-te em condições, que precisamos de ter uma conversa». Eu abri o olho direito e mirei-o de soslaio. E dei um pulo. O gajo era eu! Não podia ser. Voltei a fechar o olho, tentei manter a calma e reflectir. Estavas a sonhar, agora vais abrir os olhos e reparar que não está aqui ninguém ao teu lado, muito menos tu. Foi quando ele disse: «Não estás a sonhar, não. Sou mesmo eu, quero dizer: és mesmo tu que estás aqui. Vá lá, pá, vamos conversar».

Abri os olhos e virei-me para ele. Isto é: para mim. E ali estava eu, um pouco diferente do que costumo aparecer-me ao espelho, pois aí só vejo o meu simétrico. Entrei no jogo. «O que é que tu queres», perguntei, pensando se aquela seria a melhor maneira de dirigir a palavra a mim próprio. E ele, muito calmo: «Estou farto de ti… bem… de nós, isto é, do eu que tu és. Por outras palavras: acho que o eu que sou eu, deve começar a prevalecer sobre o eu que és tu», disse ele… ou eu, sei lá!

Entendi que o melhor era encarar aquilo como se fôssemos dois: eu e o meu contrário. «Afinal, onde queres chegar. O que há de mal em mim?», perguntei-lhe de sobrolho franzido. Riu-se. «O que há de mal em ti?! Para começar, há que tu não te enxergas. És um eremita, uma relíquia, um fóssil, um atraso de vida. Andas para aí, prenhe de belos princípios, de altos valores morais, a dividir o mundo em bons e maus, e a apelar à sublevação dos fracos e oprimidos contra os poderosos. Para quê?! Onde é que isso nos leva e, principalmente, onde é que isso te leva?».

Assustei-me. Aquilo era eu? Aquilo era a outra parte de mim? Já estava infectado desta maneira? Balbuciei: «Já estás assim? Já falas e pensas como eles?». Respondeu-me com rispidez: «Qual eles, qual carapuça! Nós, homem. Nós! Abre os olhos e o espírito. Somos todos da raça humana. Só que uns, assim… e outros, assado. Uns mais fortes ou inteligentes, outros mais fracos ou estúpidos. E tu nem és estúpido de todo, embora pareças. Queres o quê? Justiça, igualdade? Repartir à força? E o que é isso de justiça? Será justo tirar ao que foi capaz de agarrar uma grande fatia, para dar um bocado ao que não soube agarrá-la antes? Se dividirmos tudo o que há por todos, viveremos todos mal, o que é que julgas?».

Fingi entrar no jogo: Afinal, o que me queres propor?», indaguei. Respondeu-me: «A vida é curta, homem, e tu não podes mudar o mundo. (Onde é que eu já ouvira isto antes?). Junta-te aos fortes, aos ganhadores, porque se não o fizeres, tu é que perdes e ninguém ganha. Não vês o que acontece na política? Não vês que até os partidos que defendem certas políticas fazem o contrário mal chegam ao poder? Olha como eles, na prática, não se distinguem uns dos outros, sejam de esquerda, sejam de direita. Eles falam muito bem enquanto não chegam lá. Depois, são todos iguais. Não vês o que vai por aí, ou queres melhores exemplos?».

Concedi: «Sim, sei de gente que rosnou contra os jobs e os boys, e hoje são boys com belos jobs. Sim, sei de quem condene e excomungue nos outros aquilo que, se for feito por si, já é tudo virtude ou, no mínimo, uma fatalidade incontornável, que um dia se há-de resolver. Sei de quem condene certo tipo de empresas, mas aceite um tachito na sua administração. Sim, sei de quem se bata pela transparência e pelo exercício do poder desinteressado, mas, depois de instalado, não há ninguém mais opaco e agarrado às vantagens dos cargos. É com esses que me queres ver alinhado?». Perguntei.

Resposta do gajo, isto é, da minha outra parte: «Claro! Porque não? Já pensaste numa bela vivenda? Em férias em Cancun ou na República Dominicana? Adere ao esquema, meu! Olha: deixas de escrever nesse pasquim para onde escreves agora, e aceitas um convite que me pediram para te transmitir, para escrever num jornal desses que há por aí, sempre que houver espaço livre entre os anúncios. Dizes duas ou três aldrabices, e pronto. Acalmas durante uns tempos e, daqui a uns meses, vais para adjunto, ou assessor de um gabinete de imprensa ou de relações públicas de uma autarquia, ou para bufo e lambe-botas de um vereador. Há almoços grátis quase todos os dias, homem, e olha que só em bons restaurantes. São os almoços de trabalho, não sabes? Andas de gravata e fatinho, que podes deixar aos fins-de-semana, para usar coisas mais desportivas e ligeiras (mais democráticas), mas de marca, claro. Alinhas? Havias de ver…».

Virei-me, voltei a fechar os olhos e pus-me a pensar. O que é que eu faço a este gajo? Mandava-o para a tal senhora que o pariu, mas, afinal, somos filhos da mesma mãe, que era uma mulher isenta de pecado. Cuspo-lhe? Mas cai-me em cima. Ainda de olhos fechados, virei a cara para o outro lado, depois abri os olhos, levantei-me e pus-me a andar, sem olhar para trás. Via as pessoas que por ali andavam, sombrias, tristes, pesadas, tristonhas, e senti-me como se fosse cada uma delas. Amei-as. E também senti que nunca estivera tão de bem comigo.

Olhei, então, para o banco que, naturalmente, estava vazio. Mas se ele estivesse lá… havias de ver».

Estas linhas foram escritas em Abril de 2004. Lembrei-me delas quando vi o Boletim Municipal do Seixal dar grande destaque ao facto de uma empresa intermunicipal ir tratar do saneamento básico do concelho, apresentando a coisa como se de um grande feito se tratasse. Não está lá dito, mas eu sei que essa empresa, onde as câmaras municipais são minoritárias, vai ser, mais dia, menos dia, privatizada. Então, nós iremos pagar taxas de saneamento elevadíssimas, pois seremos obrigados a pagar os lucros de quem a comprar.

Bem fez Almada, que, por nunca ter brincado com os dinheiros públicos, construiu a sua rede de saneamento à custa do seu próprio orçamento. Não pôs a qualidade de vida e os bolsos das suas populações nas mãos de interesses privados. Isso, caros ouvintes, é ser de esquerda. É trabalhar com honestidade e competência.

O resto... é conversa fiada.


Crónica de João Carlos Pereira - Lida aos microfones da Rádio Baía em 01/02/2006

1997, 2007 © Guia do Seixal

Visões do Seixal Blog Directório Informações Quem Somos Índice