26/07/2008

A ESTRATÉGIA DE MAQUIAVEL

Raúl fez muito bem em guardar um digno silêncio sobre as declarações publicadas na passada segunda-feira 21 de Julho por Izvestia, relacionadas com a eventual instalação de bases para os bombardeiros estratégicos russos no nosso país. A notícia era dada a partir das hipóteses elaboradas na Rússia, pela teimosia ianque com a ideia de montar radares e plataformas de lançamento do escudo nuclear nas proximidades da fronteira dessa grande potência.

Ontem dia 22 o general Norton Schwartz, nomeado para ser o novo chefe do Estado-maior da Força Aérea Norte-americana, declarou no Senado que se a Rússia fizesse isso cruzaria a linha vermelha, o qual é inadmissível para a segurança dos Estados Unidos.

Se disseres que sim, mato-te. Se disseres que não, é igual, de todas as formas te mato. É a estratégia de Maquiavel que o império aplica a Cuba. Não é preciso dar-lhe explicações, nem pedir desculpas ou perdão.

O que é preciso são nervos de aço nestes tempos de genocídio, e Cuba os tem. O império sabe disso. No sábado 26 de Julho se completarão 55 anos de luta sem descanso. Não existe melhor homenagem aos mortos naquela acção, aos que morreram depois sem abandonar nunca os seus princípios e aos que ainda combatem. São símbolos de toda uma geração que lutou. É bem justa a alegria com que o nosso povo se lembra deles.


Fidel Castro Ruz
23 de Julho de 2008

23/07/2008

SANGUESSUGA E MENTIROSO

Quando Sócrates impõe aumentos de ordenados e de pensões que ficam muito abaixo do aumento do custo de vida, está a sangrar o povo português. A exauri-lo. E quando Sócrates diz, por exemplo, que aplica uma «Taxa Robin dos Bosques» às petrolíferas, para canalizar essas verbas para os mais desfavorecidos, está a mentir com quantos dentes tem na boca. Mente, também, quando diz que os registos notariais baixaram, quando é, exactamente, o contrário que se verifica. Por isso, posso dizer que, em termos políticos, Sócrates é uma repugnante e perigosa sanguessuga e, simultaneamente, um mentiroso rafeiro e sem vergonha.

Poderia dizer, também, que a sua arte de mentir e de conseguir vantagens duvidosas transvazam para a sua vida privada, pois, como todos sabemos – mas é bom repeti-lo, quanto mais não seja para arreliar certos ouvintes apoiantes da criatura – fez-se passar por engenheiro quando ainda não tinha obtido (e todos sabemos como, depois, o obteve…) o almejado diplomazinho que lhe confere o título – mas não, seguramente, as reais habilitações.

Mas vamos a factos.

Fala-se muito em aumento dos combustíveis, em aumentos das prestações dos empréstimos à habitação, em aumentos dos medicamentos e das taxas moderadores. E fala-se bem. Porém, há coisas que aumentam à socapa e, porque os seus valores, em termos absolutos, não são muito relevantes, esses aumentos passam despercebidos. Refiro-me, por exemplo, aos legumes, um bem alimentar de fundamental importância numa alimentação saudável e equilibrada. Só no prazo de um ano, o preço dos legumes, em Portugal, aumentou cerca de 50%. Em alguns, como a alface e o feijão verde, quase duplicou. O que se comprava com cinco euros, em Julho de 2007, custa agora 7,5 euros.

No entanto, se a escalada de preços se verificou nos mercados abastecedores e nos super e hipermercados, praticamente não se fez sentir ao nível do produtor. Diz o Correio da Manhã, na sua edição de ontem, que «do produtor para o hipermercado, os preços sobem mais de 270%. Por exemplo, o feijão verde custa 40 cêntimos por quilo no produtor, sobe para 1,7 euros no mercado abastecedor, e para os 2,99 euros nas grandes superfícies».

Apressam-se os senhores engravatados dessas grandes superfícies, como as dos grupos Sonae e Jerónimo Martins, a clamar que tudo se deve ao aumento dos combustíveis, que estão pela hora da morte. Pergunto eu, na minha santa ignorância, plebeia e sem gravata, como é possível um aumento de 270%, se os combustíveis, tendo aumentado brutalmente, nem por sombras chegaram a essa percentagem? Então, quem se anda a encher à conta da crise? E à custa das carências alimentares de milhões de portugueses, incluindo crianças e idosos? Ou serão os legumes um artigo de luxo, como o caviar ou as ostras? Se calhar…

Falámos na «Taxa Robin dos Bosques», uma das últimas grandes aldrabices do político intrujão que governa o país, e que quis fazer crer que o governo, a abarrotar de preocupações sociais, se atreveu a tirar aos ricos – à Galp, por exemplo – para dar aos pobres. Mentira chapada! A verdade é esta, explicada pelo economista Eugénio Rosa:

«A mudança de sistema de custeio que o governo pretende impor às petrolíferas não aumenta o IRC pago pela GALP. Apenas altera o valor de IRC pago em cada ano (mais, actualmente; e menos, no futuro, no lugar do contrário). O principal beneficio é que o governo poderá dispor mais cedo de uma parcela maior do IRC (estima-se entre 110 e 150 milhões, só referente a 2008), o que lhe permitirá aplicar medidas sociais com efeitos eleitoralistas, como já começou a fazer».

Chega para explicar a aldrabice? Se não chega, vamos a outra: o governo apregoou que os preços dos registos tinham baixado e que se iria pagar menos pela compra de casa. Outra «galga» descarada do «engenheiro».

Joaquim Barata Lopes, Bastonário dos Notários, afirmou ao mesmo jornal: «Os preços dos registos aumentaram e, em alguns casos, passaram a custar o dobro. De um modo geral, aumentaram todos. Só o preço da ‘Casa Pronta’ é que baixou. Um registo, simples, de compra de uma casa, custava, sexta-feira passada, 125 euros. A partir de ontem, passou a custar 250 euros. É um facto objectivo. A mesma operação, mas com hipoteca, subiu de 135 euros para 250 euros. O que aconteceu foi que o Governo reuniu todos os actos possíveis num pacote que, até sexta, custava 526 euros e desde ontem passou para os 500 euros. Mas nestes casos todos os actos são pagos, mesmo os que não foram praticados. Trata-se de engenharia financeira».

Entretanto, a rapaziada cor-de-rosa, espalhada um pouco por toda a comunicação social portuguesa, esganiça-se a difundir a ideia de que a situação grave de muitas famílias se deve, exclusivamente, à falta de cabeça. Não sou eu quem afirmará que não haverá imensos casos em que à falta de juízo também se deverá a corda na garganta de muita gente. Mas a grande verdade está noutro lado, ou seja, nas PAC, isto é: nas Políticas Assassinas em Curso.

De facto, não há nada que um português comum compre hoje que não tenha aumentado muito mais – violenta e sanguinariamente mais – do que aumentou o seu ordenado. Ou a sua pensão.

Do leite ao pão, da carne e do peixe aos ovos e aos legumes, dos medicamentos aos transportes, das taxas moderadoras aos livros escolares, da prestação da casa à bilha de gás, da electricidade aos artigos de higiene, nada subiu abaixo dos aumentos de ordenados e pensões do Zé Povinho, designação onde não cabem Sócrates e socretinos, belmiros e amorins, espíritos santos e demais malignidades da escória política e financeira deste país, incluindo os seus dedicados sabujos, esbirros e lacaios.

Por isso, quando o crédito malparado volta a bater recordes, atingindo os 2,59 mil milhões de euros nos 131 mil milhões de euros em empréstimos contraídos à Banca, não me digam que é porque as famílias portuguesas não se sabem governar.

A única coisa de que eu posso acusar as famílias portuguesas nesta terrível conjuntura, é que deram as rédeas do mando ao político mais desqualificado que conheci em toda a minha vida, incluindo durante os chamados anos negros da ditadura fascista.


Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 23/07/2008.
(Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).

16/07/2008

O FESTIM

«Os líderes das oito economias mais industrializadas do mundo (G8), reunidos numa cimeira no Japão, causaram espanto e repúdio na opinião pública internacional, após ter sido divulgada a ementa dos seus almoços de trabalho e jantares de gala.

Reunidos sob o signo dos altos preços dos bens alimentares nos países desenvolvidos – e consequente apelo à poupança – bem como da escassez de comida nos países mais pobres, os chefes de Estado e de Governo não se inibiram de experimentar 24 pratos, incluindo entradas e sobremesas, num jantar que terá custado, por cabeça, a módica quantia de 300 euros.

Trufas pretas, caranguejos gigantes, cordeiro assado com cogumelos, bolbos de lírio de Inverno, supremos de galinha com espuma de raiz de beterraba e uma selecção de queijos acompanhados de mel e amêndoas caramelizadas, foram apenas alguns dos pratos à disposição dos líderes mundiais, que acompanharam a refeição da noite com cinco vinhos diferentes, entre os quais um Château-Grillet 2005, que está avaliado, em casas da especialidade “online”, a cerca de 70 euros cada garrafa.

Não faltou também caviar legítimo com champanhe, salmão fumado, bifes de vaca de Quioto e espargos brancos. Nas refeições estiveram envolvidos 25 chefs japoneses e estrangeiros, entre os quais alguns galardoados com as afamadas três estrelas do Guia Michelin.

Segundo a imprensa britânica, o "decoro" dos líderes do G8 - ou, no mínimo, dos anfitriões japoneses - impediu-os de convidar para o jantar alguns dos participantes nas reuniões sobre as questões alimentares, como sejam os representantes da Etiópia, Tanzânia ou Senegal.

Os jornais e as televisões inglesas estiveram na linha da frente da divulgação do serviço de mesa e das reacções seguintes. Dominic Nutt, da organização Britain Save the Children, citado por várias folhas “online”, referiu que "é bastante hipócrita que os líderes do G8 não tenham resistido a um festim destes numa altura em que existe uma crise alimentar e milhões de pessoas não conseguem sequer uma refeição decente por dia". Para Andrew Mitchell, do governo-sombra conservador, "é irracional que cada um destes líderes tenha dado a garantia de que vão ajudar os mais pobres, e depois façam isto".

”A cimeira, realizada no Japão, custou um total de 358 milhões de euros, o suficiente para comprar 100 milhões de mosquiteiros, que ajudam a impedir a propagação da malária em África, ou medicamentos para 4 milhões de doentes com sida. Só o centro de imprensa, construído propositadamente para o evento, custou 30 milhões de euros».

Esta nota foi uma das muitas que me chegou via Internet. Escolhi-a, precisamente, porque, cai como sopa no mel, na crónica que tinha idealizado para esta semana.

Vimos, então, como se comprazem os políticos que governam o mundo. Deixem-me melhorar a frase: vimos, então, como se comprazem, com o dinheiro dos contribuintes (muitos deles esfomeados), os políticos que governam o mundo. Dirão algumas consciências mais dóceis ou domesticadas, a par de outras mais cínicas e malévolas, que nem todos os governantes são assim, tentando pôr de fora da insultuosa imoralidade atrás referida, os governantes nacionais. Os nossos políticos, em geral. Pois eu digo-vos, meus amigos, que, nessa insaciável ânsia de comerem à conta dos orçamentos, nada os distingue uns dos outros.

Por exemplo: repare-se, como se fosse a primeira vez, no espectáculo, a um tempo medonho e repugnante, dado pelos senhores deputados e membros do governo, em dia de debate parlamentar sobre a situação do país.

Olhe-se, primeiro, em cada um deles. Bem vestidos, bem calçados, bem nutridos. Segundo me dizem, só em perfumes, farpelas, gravatas, cabeleireiro e massagista, há ali quem gaste, num só mês, o equivalente a dois salários mínimos nacionais.

Para além de deputados na nação, suas excelências têm, na sua esmagadora maioria, um ou vários empregos cá fora. Que acumulam, muitos deles, com faustosas reformas. A que se juntarão, mais tarde, ainda outras, sem esquecer a reforma pela actividade parlamentar ou governativa, paga, é claro, por todos nós.

Ninguém, ali, sabe o que é o desemprego, o salário mínimo, os salários em atraso, o orçamento familiar que não estica até ao fim do mês, o despejo da casa, o medicamento que não se pode comprar, as urgências hospitalares, as listas de espera para uma intervenção cirúrgica ou consulta da especialidade. Ninguém, ali, tem medo do futuro, a não ser quando pensam no que poderá um dia acontecer se o bom e manso povo português abrir os olhos e lhes pedir contas por aquilo que fizeram e, em nome da moral e da decência, não deveriam ter feito, e por aquilo que não fizerem mas que, em nome do que prometeram e, sobretudo, das suas obrigações morais e constitucionais, deveriam ter feito.

E uma das coisas que fizeram, como sabemos, foi tratarem das respectivas vidinhas – ou seja: para si próprios – amanhando para toda a classe política, desde o presidente da República até ao mais cinzento dos senhores autarcas, um esquema remuneratório e de reformas impensável para o cidadão comum.

E uma das coisas que não fizeram, como também sabemos, foi acabar com a miséria que afecta milhões de seus concidadãos (se assim se pode dizer, pois de comum, entre eles e o povo, nada há) verificando-se, pelo contrário, que as desigualdades alastram e que o país apresenta dos piores índices de desenvolvimento de toda a União Europeia.

Ouçamos, agora, o que dizem. Digladiam-se em redondos e repetitivos discursos, centrados no respectivo umbigo e no da seita a que pertencem, enaltecendo inexistentes méritos próprios e assinalando os deméritos alheios, partindo sempre do princípio de que salvariam o país se poder fossem, ou de que, sendo poder, ninguém os poderá ultrapassar em competência e discernimento.

Uns e outros assim falam, à vez, sem memória – ou melhor: sem vergonha – como se a verdade não fosse que, de há décadas a esta parte, de uma maneira ou de outra, por ali andam repetindo discursos e ineficácias, sendo que a única coisa de sucesso que fizeram foi legislar em proveito próprio, garantindo para si, em termos de retribuição e granjeios vários, sem esquecer as já referidas rápidas e sumarentas reformas, um presente e um futuro tranquilos e à prova de qualquer crise. Enfim, um festim escabroso a pedir, no mínimo, um ensaio de paulada.

Não. Não me esqueci que outra preocupação deu corda à distinta classe política que nos tem governado e exercido o poder legislativo. A de garantir, seja lá como for, que o verdadeiro poder – o poder económico – continue intocável e a determinar (qual governo, qual Assembleia da República, qual carapuça!) os destinos do povo e do país.

E se provas fossem necessárias do que afirmo, aqui ficam dois breves exemplos que, para esse fim, são claros e bastantes.

A Comissão Europeia revelou que, no conjunto dos seus 27 países, só os búlgaros ultrapassam os portugueses nas dificuldades em pagar as suas despesas ao fim do mês. Ou seja: só a Bulgária está em piores condições em termos de baixos salários e falta de poder de compra. Prova-se, assim, a incompetência e o dolo da classe política no seu todo, já que ao país e ao povo não servem, como se extrai de todos os dados estatísticos nacionais e comunitários. A classe política governou e legislou para si própria e, como ficará claro a seguir, para os detentores do capital financeiro.

De facto, as investigações desencadeadas em 2005, no âmbito da chamada Operação Furacão, que visavam detectar graves situações de fuga ao fisco e branqueamento de dinheiro, estão em risco de dar em águas de bacalhau. Em causa estão empresas como o BCP, BES, BPN, Finibanco, Soares da Costa, Mota-Engil (estas duas já com cadastro devido ao célebre caso das facturas falsas), a Porto Editora, os grupos Delta e Casino Estoril/Sol, o Grupo Amorim, as empresas de Jo Berardo e Horácio Roque, entre outras menos conhecidas, mas onde se destaca o nome de Pinto da Costa. Só em fuga ao fisco, estima-se que o valor rondasse os 160 milhões de euros, muitos dos quais apressadamente pagos sem outras consequências, tendo sido diligentemente abafados os nomes dos responsáveis.

E tudo pode dar nas tais águas de bacalhau porque o poder político – nesta caso o governo do PS, de Sócrates – produziu legislação (o célebre Código do Processo Penal) à medida dos interesses dos infractores. Na verdade, os prazos definidos para a investigação de um caso como este são incompatíveis com as necessidades de realizar aturadas averiguações, pelo que vai suceder o levantamento do segredo de justiça, permitindo que, a partir de agora, os prevaricadores estejam em pé de igualdade com os investigadores, antecipando-se aos seus passos e, objectivamente, sabotando toda a possibilidade de conseguir-se prova consistente.

A isto chegámos.

E assim, entre os banquetes de Tóquio e o festim de Portugal, as diferenças, bem vistas as coisas, não existem.

É, num caso e no outro, «o povo, essa enorme e possante besta» (como dizia Erasmo de Roterdão), a pagar este lúgubre regabofe.


Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 16/07/2008.
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09/07/2008

O CONSELHEIRO ACÁCIO, OU CONDE DE ABRANHOS?

Começo por recordar duas personagens célebres da obra de Eça de Queiroz.

O primeiro, é o Conselheiro Acácio. Personagem do romance O Primo Basílio, é o indivíduo hipócrita, arrogante e enfatuado, ridículo e convencido. É o símbolo do convencionalismo e da respeitabilidade burguesa. Representa o constitucionalismo e o formalismo oficial.

Natural de Lisboa, ex-director geral, fora nomeado conselheiro por carta régia. Os seus gestos eram sempre medidos. Crítico severo e autor. Não tinha família e habitava o 3.º andar da Rua do Ferragial. Vivia amantizado com uma criada.

Ocupava-se da economia política e era cavaleiro da Ordem de Santiago.

Fisicamente, era alto, magro, de rosto comprido, afilado e calvo, vestia-se habitualmente de preto, "com o pescoço entalado num colarinho direito".

O segundo, é o Conde de Abranhos. De seu nome completo Alípio Severo de Noronha Abranhos, é natural de Penafiel e nascido a 25 de Dezembro de 1826. Personagem central da obra, é o símbolo do político imbecil, hipócrita, oportunista e inculto. É filho de um alfaiate. Os Abranhos provêm de Amarante, "aliados, pelas mulheres, à ilustre casa de Noronha".

Ao que vem isto? Já veremos. Por agora, falemos de coisas actuais.

O consumo do pão baixou 20%, enquanto a aquisição de carros de luxo subiu 40%. Ou seja: enquanto a maioria da população já corta no pãozinho para a boca, a tal minoria endinheirada – e, em cada dia que passa, um pouco mais endinheirada – rebola-se no esplendor de uma crise que a engorda sem parança. Já temos dado aqui vários exemplos destes, e prometemos continuar a dá-los, para que uns acordem, outros se mordam de raiva e os mais lúcidos e honrados ganhem novas forças para resistir na sua luta contra a ditadura disfarçada em que vivemos.

A propósito disto, recordo que, na semana passada, um ouvinte de direita manifestou o seu incómodo por eu ter voltado a referir as nebulosas e nada edificantes manobras de Sócrates para se armar em engenheiro. Notoriamente, tal cavalheiro não gosta que o seu ídolo de momento seja desnudado e visto à luz da sua nauseabunda realidade. Gostaria que nos calássemos e esquecêssemos o triste e revelador episódio. Naturalmente que, se pudesse, impediria, pela via censória, que a tal coisa nos referíssemos, por ser desgastante para a imagem de um político que, como consequência das suas práticas governativas, leva a que a fome alastre e haja cada vez mais portugueses a cortarem nos bens essenciais – como o pão – enquanto uns poucos devoram, literalmente, carros sumptuosos e condomínios de luxo.

Longe de me incomodar – pelo contrário – tal intervenção só veio comprovar que pus o dedo na ferida. Ali mesmo, onde lhes dói. Fossem as nossas Provocações uma tolice rematada, um ramalhete de mentiras e dislates, e não se daria sua excelência ao incómodo de sair em defesa do tal «engenheiro» e das suas políticas assassinas. Sem querer – mas porque a isso se vê obrigado – este aspirante a Conselheiro Acácio mostra, através das suas incautas aparições, a face sinistra daqueles que defendem uma sociedade desequilibrada e injusta, onde milhões de seres humanos, pretensamente acéfalos e inconscientes, devem subordinar-se à liderança de uma elite bem pensante que, afinal, mais não faz que acumular riqueza à conta do suor e do sangue alheios.

Nada de novo, afinal. Era assim nos tempos que Eça tão bem caracterizou. Era assim nos tempos de Salazar e Marcelo. É assim nos tempos de Sócrates. Conselheiros Acácios (ou, se calhar, meros Condes de Abranhos) – ou a isso aspirantes – afinal, é o que por aí mais há.

Seja como for, nada mais útil ao nosso programa e às nossas crónicas do que estas investidas periódicas do tal ouvinte, dado que mostram a face cínica, hedionda e desumana da direita mais troglodita onde, como se prova, Sócrates encaixa na perfeição.

Mas nem só de intervenções em directo vivemos nós, pois a minha caixa de e-mails abarrota de contributos, críticas e sugestões de ouvintes e leitores destas Provocações, de que é exemplo o texto que passo a ler:

«Será que os portugueses continuarão a demitir-se das suas responsabilidades de intervenção, deixando os políticos fazer o que querem? O país assiste a "roubos institucionalizados e legalizados" por parte de algumas empresas públicas que praticam "taxas e preços especulativos, muito acima do livre jogo da oferta e da procura de mercado". ... "não há sequer um sistema de Justiça, que ponha cobro e saiba moralizar esta situação porque o sistema público está organizado, não em função das pessoas, mas dos interesses das empresas".
(Marinho Pinto - Bastonário da Ordem dos Advogados)

As empresas e entidades que foram proibidas de cobrar o aluguer de contadores, arranjaram logo uma nova taxa, pelo que a medida não beneficiou ninguém.

Está em curso a ideia de imputar aos consumidores de energia eléctrica os incobráveis (imagina-se que assim será muito mais fácil receber, sem qualquer julgamento do critério subjacente às dívidas). A ser assim, o princípio tornar-se-ia válido para todas as empresas, do merceeiro da esquina aos grandes hipermercados, que deixariam de tentar resolver os calotes, passando logo a factura aos consumidores cumpridores. Que grande negócio!

Com a redução do IVA num ponto percentual, a manobra não é menos desavergonhada. A mesma bilha de gás, comprada antes e depois da baixa do IVA, custa precisamente o mesmo, ficando, no caso em apreço, o 1% para a Galp. E o governo mudo e quedo.

Nos combustíveis ninguém se lembra de perguntar:

- Como é possível calarmo-nos perante o argumento falacioso de que a redução da taxa do ISP seria uma redução de impostos, quando o que se passa é que, perante a subida dos combustíveis, manter a taxa do IVA permite uma fabulosa arrecadação de receitas? Será que os portugueses estão a dormir?

- Como é possível aceitar que os preços de venda dos combustíveis não tenham qualquer controlo? Afinal, quem está a lucrar com a especulação que provoca a subida de preços? ».

A esta dúvida, postas por um ouvinte, responde o economista Eugénio Rosa:

«Nas últimas semanas, o presidente da GALP desdobrou-se em declarações aos media, procurando branquear o comportamento das petrolíferas aos olhos dos portugueses. "Não gosto que nos chamem ladrões", afirmou ele ao Expresso. Mas como já tinha acontecido com a AdC e com o governo, fugiu aos principais problemas e não esclareceu os portugueses sobre as causas internas que estão a contribuir também para o aumento dos preços dos combustíveis em Portugal. A sua preocupação foi justificar as petrolíferas que continuaram a escalada de preços.

Assim, não explicou aos portugueses por que razão os preços sem impostos dos combustíveis em Portugal continuam a ser superiores aos preços médios sem impostos da União Europeia. Por exemplo: em relação ao gasóleo, e relativamente à Alemanha, Áustria, Finlândia, França, Irlanda, Inglaterra e Suécia, o preço do gasóleo sem impostos, em Portugal, era superior ao de qualquer um destes sete países entre 2% (França) e 21,1% (Irlanda), sendo superior ao preço sem impostos da Finlândia e Inglaterra em mais de 7%.

O presidente da GALP também não explicou porque razão, apesar do petróleo utilizado na refinação dos combustíveis ser o adquirido 2 a 2,5 meses antes, portanto a um preço mais baixo, na fixação do preço à saída do combustível das refinarias, as petrolíferas não consideram esse preço, mas sim o preço do barril de petróleo registado uma semana antes, embolsando desta forma lucros elevadíssimos à custa dos consumidores portugueses. De acordo com dados da própria Direcção Geral de Energia do Ministério da Economia, entre 28/12/2007 e 27/06/2008, o preço da gasolina em Portugal aumentou 11,8%; o gasóleo rodoviário subiu 21,1%, e o preço do gasóleo para aquecimento cresceu 30,7%, mas o preço do petróleo, entre Dezembro de 2007 e Abril de 2008, subiu, em euros, apenas 9,1%, portanto, muito menos que a subida verificada nos combustíveis em Portugal (menos de metade da subida do gasóleo).

Esta diferença de preços dá origem a um lucro extraordinário elevadíssimo, a que as petrolíferas, para ocultar, designam pelo eufemismo "efeito stock". E só no período 2004 a 2007, de acordo com as próprias contas da GALP, esta empresa obteve um lucro extraordinário de 1.029 milhões de euros devido ao "efeito stock", ou seja, o lucro que resulta do facto de se verificar no mercado internacional de petróleo uma grande especulação de que as petrolíferas se aproveitam para vender aos portugueses os combustíveis mais caros, embolsando, desta forma, elevadíssimos lucros. E, no 1º trimestre de 2008, o lucro extraordinário da GALP, resultante do "efeito stock", disparou para 69 milhões de euros, mais 228,6% do que idêntico período de 2007, o que somados aos acumulados no período 2004-2007, dá 1.098 milhões de euros».

Não sei o que o Conselheiro Acácio – ou será Conde de Abranhos? – terá a dizer a isto, mas, certamente, achará que assim mesmo é que é.

O mais engraçado, meus amigos, será quando o povo abrir os olhos.

E cerrar os punhos.


Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 09/07/2008.
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02/07/2008

O PAÍS – E O MUNDO – EM REVISTA

A descida da taxa do IVA em 1% (depois de o Governo o ter subido em 2%) não se vai fazer sentir no dia-a-dia do português comum. Dizem todos os analistas que o que vai acontecer é os preços subirem também 1%, de modo a que tudo fique na mesma. Mas dizem mais: se essa manobra pode ser facilmente aplicável nos bens de menor valor, mas de consumo corrente, já o mesmo não acontecerá nos artigos mais caros, especialmente nos artigos de luxo, onde a descida, de facto, terá efeitos bem palpáveis. Um carro topo de gama, por exemplo, passará a custar menos um milhar de euros. E assim as «grandes medidas» do governo, como não podia deixar de ser, lá vão favorecer os do costume.

Ao mesmo tempo que isto se discutia e a barulheira do Euro à volta da selecção não deixava ouvir mais nada, o Governo aprovou um decreto-lei que define, como elemento mais relevante para uma indemnização por acidente de viação, o rendimento declarado, para efeitos fiscais, por parte do lesado. Conclusão: um pobretana qualquer sofre um acidente de viação, no qual não tem qualquer culpa, e recebe uma bagatela. Um acidente igual, com as mesmas consequências, sofrido por alguém de altos e repolhudos rendimentos, já lhe dá direito a uma indemnização muitas vezes superior à do pobre coitado. Se isto não é governar para os ricos – ou melhor: se isto não é governar contra os pobres – então vou ali e já venho. Na verdade, até nos mais ínfimos pormenores José Sócrates e a sua camarilha socialista mostram a sua verdadeira natureza de classe.

Percebendo isso – e sempre que pode – o «engenheiro» desdobra-se em inflamados discursos, garantindo que é ele, o seu partido e o seu governo que representam a verdadeira esquerda, aquela que se preocupa com as questões sociais e os mais desfavorecidos. Sem dúvida. A prová-lo nada melhor que os relatórios do Eurostat e do próprio Banco de Portugal, que provam, sem margem para quaisquer dúvidas, que os anos da governação socialista, com especial destaque para os negros anos socretianos, são aqueles onde aumenta o número de pobres, alastra a miséria e se alargam as desigualdades.

Outra frente de batalha, onde a manipulação atinge as raias da pouca-vergonha, é a da Educação. Sócrates enche a boca com palavrões como «modernidade», «competitividade», «excelência», e «rigor», mas os recentes exames nacionais provam que as provas foram elaboradas para permitir a passagem de todos – ou quase todos – com a única finalidade de dourar as estatísticas que serão apresentadas aos parceiros europeus, pondo de lado a necessidade de formar pessoas com méritos e conhecimentos, capazes de contribuírem para a construção de um país realmente moderno e competitivo. É a política do facilitismo e do faz-de-conta a imperar sobre os reais interesses nacionais.

Ao mesmo tempo, as universidades públicas estão sem dinheiro para pagar os salários de professores e funcionários, a tal ponto que a Universidade de Aveiro revelou que foi obrigada a desviar fundos destinados à investigação – cerca de três milhões de euros – para garantir o pagamento de salários ao seu pessoal. Mas compreende-se. Que se lixe o ensino público, se o ensino privado é que é bom, pois aí formam-se engenheiros em três tempos, que até podem fazer as provas de Inglês Técnico em casa, e enviá-las por fax ao cuidado do amigo reitor.

Na agricultura, as coisas não vão melhor. Toda ela agoniza. O país desertifica-se e, cada vez mais, se faz uma agricultura de mera subsistência. Lembro-me que, há dias, o incrível ministro da Agricultura garantia que uma doença que afecta o pinheiro, provocada por um organismo chamado nemátodo, estava perfeitamente controlada. A verdade é que, dois meses depois, poderá ser todo o pinhal português que está em risco, a tal ponto que todo o país foi agora declarado área de risco.

Em termos de segurança, nada melhorou. A Ordem dos Médicos manifestou-se contra a insegurança que afecta centros de saúde e hospitais, onde as empresas de privadas substituem a PSP que, especialmente nas urgências, garantia alguma ordem e respeito. É a política dos cortes orçamentais a impor as suas regras, sem querer saber dos custos sociais e, consequentemente, dos custos económicos que essa ilusão de poupança depois acarreta. Mas que fazer, se até nos tribunais já um qualquer traficante de droga pode agredir à lambada e ao pontapé o juiz que o condenou? A Casa da Justiça está transformada num circo, numa paródia, numa coisa sem crédito, onde nem sequer o medo existe, depois do respeito ter ido à viola.

No meio desta lixeira verdadeiramente digna do chamado Terceiro Mundo, continua a insistir-se no novo aeroporto e no TGV, obras necessárias, principalmente, para encher os bolsos de alguns com luvas, comissões e outras suculentas gratificações. Na verdade, o TGV apenas reduzirá em 30 minutos a viagem entre Lisboa e o Porto, pelo que num pequeno país, como o nosso, a obra se torna verdadeiramente supérflua, para não dizer: ridícula.

Quem viajar, por exemplo, pelos países nórdicos, bem pode procurar um TGV, que não o encontrará, pois aí governa-se tendo em vista apenas os interesses nacionais. Por isso, eles são países desenvolvidos e nós, caros amigos, não passamos de uns saloios a quem um engenheiro de trazer por casa mete no bolso, como se fôssemos um diploma passado ao domingo.

Três notas sobre a situação internacional.

Os EUA e Israel voltam a ameaçar o Irão. O cheiro do petróleo continua a excitar a pituitária dos senhores da guerra, insaciáveis na sua desvairada caminhada de controlo planetário. Não sei se o Irão quer ter armas nucleares ou se, apenas, pretende usar a energia nuclear para fins energéticos. Sei – isso sim – que o Irão, tal como Israel, China, França, Índia, Paquistão ou os EUA, também pode dispor de armamento nuclear. Embora eu ache que ninguém, em boa verdade, o deveria ter.

Mugabe. Parece que o homem não é um democrata. Pelo menos, é o que toda a gente diz. Também não sei se o líder da oposição seja flor que se cheire. Na verdade – e isso é o que me importa – há ditadores maus e ditadores bons. Já alguém ouviu falar, por exemplo, de eleições na Arábia Saudita? Que direitos têm lá as mulheres? Quanto partidos existem? Há liberdade de expressão? O que se faz a quem afrontar o poder?

Então, qual a diferencia entre Mugabe e os xeques das Arábias. A cor? O dinheiro? O petróleo? As amizades? A subserviência aos brancos? Ou a promiscuidade com a rapinagem internacional, com sede em Washington e sucursal em Bruxelas? Responda quem souber.

Tratado de Lisboa. Depois da Irlanda, foi a Polónia a deitar uma pazada de terra sobre o Tratado de Lisboa. Paz à sua alma.

Porreiro, pá!
Porreiríssimo!


Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 02/07/2008.
(Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).

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