28/01/2006

ESTA SEMANA


ELEIÇÕES
Muito já foi dito e escrito sobre a eleição do Presidente da República, levando diversos comentadores e analistas políticos a tecerem as mais variadas teses sobre a vitória ou derrota deste ou daquele candidato, conjecturando cenários futuros mais ou menos coloridos sobre os entendimentos entre Cavaco e Sócrates.
Pela minha parte julgo que não poderia existir um “casamento” mais perfeito e para eles tudo está bem quando acaba em bem, pois era notório que se desejavam mutuamente.
Talvez, quem sabe, um dia não muito longínquo, possamos vir a perceber porque foi escolhido o dr. Mário Soares como candidato oficial do PS a estas eleições.
É que há cada coincidência …

CONDECORAÇÕES
Mais umas quantas condecorações foram atribuídas pelo venerando Chefe de Estado ainda em funções, a quem já chamam de “Jorge o Medalheiro”, passando agora a contemplar para além dos mesmos empresários de sempre, também os estilistas que têm tratado do visual da primeira dama.
Parece até que Bill Gates já está na lista e por este andar poderemos esperar que até ao dia 8 de Março sejam chamados a Belém a manicure, o jardineiro ou o motorista de suas excelências – e não é que não mereçam tanto ou mais que os outros – mas parece ser um pouco excessivo desatar a distribuir comendas e graus de cavaleiro a tanta gente. Primeiro porque se banalizam as distinções, depois porque não temos cavalos que cheguem para todos.

BANCO DE PORTUGAL
Segundo noticiou o jornal Correio da Manhã, várias dezenas de ex-governantes e deputados, para além do Presidente da República eleito, recebem reformas do Banco de Portugal.
Eis apenas alguns dos reformados do nosso (deles) Banco Central:
. CAMPOS E CUNHA - reforma mensal de 8.000 euros
. TAVARES MOREIRA - reforma mensal de 3.062 euros
. MIGUEL BELEZA - reforma mensal de 3.062 euros
. CAVACO SILVA - reforma mensal de 2.679 euros
. OCTÁVIO TEIXEIRA - reforma mensal de 2.385 euros
. ERNÂNI LOPES - reforma mensal de 2.115 euros
. RUI VILAR - reforma mensal desconhecida
. ANTÓNIO DE SOUSA - reforma mensal desconhecida
Nada nos move em relação a estes senhores, mas é bom saber-se que foram eles que estipularam as regras para o cálculo das suas pensões, as quais são muito diferentes das de outros contribuintes que fizeram descontos durante uma vida inteira.
As normas que regem as pensões de reforma do Conselho de Administração do Banco de Portugal têm, no seu ponto 4.º, uma “garantia de reforma” que estipula o seguinte: “O Banco de Portugal, através do seu Fundo de Pensões, garantirá uma pensão de reforma correspondente ao período mínimo de cinco anos, ainda que o membro do Conselho de Administração cesse funções, a qualquer título”.
As pensões atribuídas aos membros do Conselho de Administração do Banco Central são actualizadas, a 100 por cento, na base da evolução das retribuições dos futuros Conselhos de Administração, sem prejuízo dos direitos adquiridos, especifica o ponto 6 das referidas normas.
O ponto 7 regula a cumulação de pensões, consagrando a possibilidade de, “obtida uma pensão de reforma do Banco de Portugal, o membro do Conselho de Administração pode obter nova pensão da Caixa Geral de Aposentações [CGA], ou de outro qualquer regime, cumulável com a primeira”. No entanto, a parte da nova pensão correspondente aos anos de serviço que já tenham sido contados para a reforma concedida pelo banco deverá ser restituída.
Para além da pensão, os membros reformados do Conselho de Administração gozam de todas as regalias sociais concedidas aos administradores no activo (carro e cartão de crédito) e também aquelas dadas aos trabalhadores da instituição.
A frota de automóveis do Banco de Portugal é de fazer inveja a muitos ministérios. Os contratos de ‘leasing’ das viaturas têm a duração de três anos, sendo os modelos renovados após esse período. Recentemente, foi divulgado que a administração encomendou no passado mês de Dezembro seis novas viaturas; três Volkswagen Passat, dois Audi A4 e um Mercedes classe E. No entanto, o CM sabe que, a somar a estes estão também encomendados dois Jaguar que deverão ficar adstritos a directores da instituição.
Recorde-se que, segundo um estudo realizado pelo ‘Central Banking Journal’, o Banco de Portugal é a terceira instituição de supervisão que mais gastos tem com pessoal em percentagem do PIB (0,08 por cento) entre os 30 países da OCDE, só superado pelo banco grego e islandês.
E depois venha o recém reconduzido Governador Victor Constâncio dizer que temos que fazer sacrifícios porque Portugal está em crise.

25/01/2006

Absolutamente…

Acabou-se a barafunda eleitoral. Entrámos no tempo do silêncio e dos tons escuros. Dos cinzentos carregados, quase pretos. Mas não interessa, porque agora Portugal vai ser, a curto prazo, um país moderno e desenvolvido, pois o governo pode concretizar o seu programa sem obstáculos. Sócrates tem, na Assembleia da República, uma maioria absoluta que lhe obedece. Na presidência da República, vai ter alguém que nada terá a apontar à governação, se ela for aquilo que tem sido, e se quiser levar por diante o que tem ameaçado fazer. O engenheiro Sócrates está, portanto, nas suas sete quintas. Aliás, convém não esquecer que o primeiro-ministro se situa, em termos ideológicos, ao lado de Cavaco Silva, e nem se pode dizer que seja do lado esquerdo. Há, de resto, no PSD, muita gente que é menos de direita do que Sócrates e o resto da facção que, no PS, apoia o actual líder e as suas políticas. Deus e os anjos, finalmente, encontraram-se… Isto não é uma crítica, nem é, sequer, uma afirmação irónica. É a constatação da realidade. Soares e Alegre que o digam, se é que aprenderam alguma coisa.

Então, com este governo, chefiado pelo mais inteligente e firme primeiro-ministro que alguma vez tivemos, e com este presidente, o mais competente e sério cidadão de Portugal e dos Algarves, o país vai entrar, finalmente, nos eixos. Acabará, por exemplo, a corrupção e o amiguismo, porque Cavaco Silva não pactua com essas coisas, como, de resto, compete ao mais alto magistrado da nação.

Por exemplo: Se Cavaco já fosse presidente, teria perguntado ao PS porque carga de água a menina Maria Monteiro, filha do antigo ministro, António Monteiro, e que actualmente ocupa o cargo de adjunta do porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, vai para a embaixada portuguesa em Londres. É que, para que a mudança seja possível, José Sócrates e o ministro das Finanças descongelaram, a título excepcional, uma contratação de pessoal especializado.

O mesmo porta-voz, o subtil e gentilíssimo Carneiro Jacinto, explicaria a Cavaco que a contratação de Maria Monteiro já tinha sido decidida antes do anúncio da redução para metade dos conselheiros e adidos das embaixadas. As medidas de contenção avançadas pelo actual governo, nomeadamente o congelamento das progressões na função pública, começam, como se vê, a dar frutos. É que são os sacrifícios pedidos aos portugueses que permitem assegurar a carreira desta jovem de 28 anos que, apesar da idade, já conseguiu, por mérito próprio e com uma carreira construída a pulso, atingir um nível de rendimento mensal superior a 9.000 euros, isto é, mais de 1.800 contitos.

E, se as explicações de Carneiro, que também é Jacinto, não fossem suficientes, Sócrates acrescentaria que é desta forma que se cala a boca a muita gente que não acredita nas potencialidades do nosso país, aos refilões do costume, que só sabem criticar a juventude. Eles que ponham os olhos nesta miúda. E Cavaco não teria outro remédio senão calar-se…

A título de curiosidade, o salário mensal da nossa nova adida de imprensa da embaixada de Londres daria para pagar as progressões de 193 técnicos superiores de 2.ª classe, de 290 Técnicos de 2.ª classe ou de 290 Assistentes Administrativos. O mesmo salário daria para pagar os salários de, respectivamente, 7, 10 e 14 jovens como a Maria, das categorias que referi, que poderiam muito bem despedir-se, por força de imperativos orçamentais. Estes jovens sem berço, que ao contrário da Maria tiveram que submeter-se a concurso, também, ao contrário da Maria, já estão habituados a ganhar pouco e devem habituar-se a ser competitivos, não é?

Mas a menina Maria merece, certamente. Só assim se compreende que, e também a título de exemplo, para lhe pagar o salário sejam necessários os descontos de IRS de 92 portugueses com um salário de 500 Euros a descontar à taxa de 20%. Mais do que descontam os bancos de IRC, lembram-se?

Mas se Cavaco também já fosse presidente quando o primeiro-ministro se estampou durante uma férias na Suíça, certamente lhe perguntaria como raio conseguiu ele ser tratado tão bem e tão depressa ao joelhinho – e parece que de borla, sem pagar taxas moderadoras ou a parte não comparticipada, especialmente depois de ter esclarecido o país que o seu sistema de saúde era exactamente o mesmo que queria impor aos magistrados judiciais e do Ministério Público e aos oficiais de Justiça, ou seja, o tal do cartãozinho da ADSE.

É que o cidadão (porque foi nessa qualidade que foi esquiar para a Suiça) José Sócrates Carvalho Pinto Sousa, mal chegou a Lisboa, após o infeliz trambolhão, fez uma ressonância magnética e foi submetido a uma artroscopia no Hospital da Força Aérea. A operação foi executada pelo dr. Henrique Jones, militar e médico da selecção nacional de futebol.

Segundo os dados conhecidos, não consta que o cidadão Sócrates tenha apresentado o seu cartão da ADSE, tenha marcado consulta e ficado a aguardar por uma data na agenda do médico, tenha ido às seis da manhã para a fila de espera, ou que seja militar de carreira ou na reserva, aviador ou pára-quedista, para ter o privilégio de ser imediatamente consultado, operado e assistido no Hospital da Força Aérea, seguramente com a comparticipação compulsiva de todos os contribuintes portugueses.

Bom. Ou Sócrates tentou enganar a opinião pública, fazendo-nos crer que o seu sistema de saúde é igual ao de todos os funcionários públicos, ou estava a querer dizer – o que é o mais certo – que, a partir de agora, todos os magistrados judiciais e do Ministério Público, bem como os oficiais de Justiça vão passar a marcar consultas instantâneas, operações imediatas e assistências permanentes no Hospital da Força Aérea.

Mas dizia eu que, com a dupla Cavaco/Sócrates, Portugal vai entrar nos eixos. Já se viu que acabarão os tachos, a cunhas, os famosos jobs for the boys and girls. Acabará a corrupção, e o Estado poupará os milhões de euros que, até agora, encarecem as obras públicas para entrarem nos cofres dos partidos e nos bolsos dos angariadores de fundos. Teremos as contas públicas equilibradas; o desemprego na taxa zero, ou lá perto; salários dignos e actualizados, de forma a repor o poder de compra dos trabalhadores; Saúde e Segurança Social garantidas para todos os portugueses; justiça fiscal, com todos a pagar sobre tudo o que ganham, sem excepções; Ensino de qualidade e para todos, com escolas decentes e dignas de um país europeu; uma Justiça liberta das grilhetas dos partidos, onde os Bibis sejam julgados e condenados, se for caso disso, mas, a par deles, também os Bibis de colarinho branco e fala fina, sejam ministros, ex-ministros, deputados, embaixadores, artistas, apresentadores de televisão, comentadores ou futebolistas prestem as devidas contas à Justiça.

Estava eu a ler estas linhas a um amigo, quando ele me interrompe e pergunta:

- Tu estás bem da cabeça, pá? Já percebeste bem o que estás para aí a dizer?

E eu, a fazer-me de novas: - Mas a dizer o quê? Não é mais ou menos isto que eles prometeram? O senhor professor Cavaco Silva não é um homem sério, de palavra? Não vai ele exigir do governo, como a Constituição lhe impõem, respeito pelos governados e muita decência na governação?

- Achas? – retorquiu o meu amigo. – Bem, se não te saiu o euromilhões e não te juntaste ao grupo dos homens ricos deste país, então juntaste-te aos outros, aos… tontinhos, aos ingénuos. Isto vai tudo continuar na mesma, ou pior, porque eles agora têm o poder absoluto: governo, presidência da república e parlamento. Estamos lixados. Absolutamente lixados.

Dei uma gargalhada. Ou a minha ironia falhara, ou era o meu amigo que ficara apanhado pelos resultados das presidenciais. Bloqueado.

Mas decidi não reformular a crónica. Sempre quero ver o que pensam os meus amigos ouvintes, aqui, na nossa Rádio Baía.


Crónica de João Carlos Pereira - Lida aos microfones da Rádio Baía em 25/01/2006

21/01/2006

ESTA SEMANA

* Há oito dias tínhamos sugerido que o venerando Chefe de Estado condecorasse mais algumas personalidades antes de abandonar o cargo, mas ainda não foi desta que chamou o impoluto Pina Moura; ficou-se apenas por um Pinto, um Nabo e um Nabeiro, que, relembramos, devem merecer esta distinção por “terem prestado serviços relevantes a Portugal, no País e no Estrangeiro”.
Quando chegará a vez de, por exemplo, Fátima Felgueiras, Isaltino Morais, Valentim Loureiro e Avelino Ferreira Torres ? Porque nisto ou há moralidade...

* Ficámos a saber que, só este ano, o Ministério da Educação deverá encerrar mais de 900 escolas do 1.º Ciclo do Ensino Básico na área de intervenção da Direcção Regional de Educação do Norte e que até ao final da sua legislatura, o Governo socialista pretende fechar, em todo o país, mais de quatro mil escolas
No distrito de Viseu, por exemplo, serão fechados 279 estabelecimentos, entre os 769 actualmente em funcionamento e no Alentejo o mesmo acontecerá com 60 escolas.
Não se entende é como vão as crianças aprender o inglês prometido pelo engenheiro socialista se nem escolas têm. Noutros tempos ainda existia a telescola que ia, mal ou bem, resolvendo alguns casos de isolamento, proporcionando às crianças um mínimo de escolaridade. Hoje, com os choques tecnológicos socialistas é o que se vê.

Quando os jornalistas e os órgãos de comunicação social mentem devem ser severamente punidos. Mas quando um Procurador Geral da República acusa um Jornal de publicar notícias falsas e depois vem dizer que o material citado pelo Jornal existe mas que as informações contidas nas disquetes não foram vistas nem manipuladas pelos investigadores, está a fazer de todos nós parvos.
Noutros tempos, quando ainda não existiam telemóveis e os telefones eram em muito menor número, os métodos utilizados para investigar e controlar os cidadãos era através dos chamados “bufos” recrutados pela PIDE para nos escutarem à porta, nos cafés, nos locais de trabalho, etc. Depois, como a era informática ainda vinha longe, eram preenchidas fichas com os nossos dados pessoais onde essas informações iam sendo colocadas, para na devida altura nos poderem acusar de conspirar contra o Estado, mesmo que isso fosse mentira. Provavelmente, se perguntassem ao Director Geral da Polícia Política, ele diria que tinha essas informações arquivadas, mas que não as utilizava; tinham servido apenas para investigar…
Qualquer semelhança com a actualidade deve ser pura ficção.

* As eleições presidenciais que se realizam amanhã, vão custar aos contribuintes, ou seja, a todos nós, cerca 12 milhões de euros (2 milhões e 400 mil contos) e mesmo assim não estão contabilizados outros custos indirectos. É o resultado do sistema eleitoral que temos e desta democracia partido-dependente que a isso nos obriga.
Muitas promessas foram feitas durante a campanha por todos os candidatos, sem excepção, levando-nos a crer que qualquer um deles pode resolver os problemas do País, puxando mais para a esquerda ou mais para a direita, quando o que nós precisamos é de um que puxe para cima e que seja verdadeiramente independente de partidos e de grupos económicos.
Como isso por agora não é possível, façam o favor de ir votar e sejam muito felizes na escolha que fizerem.

18/01/2006

A fome e a vontade de comer

As más notícias continuam. Anteontem, a SIC, a abrir o seu noticiário das 13, informou os telespectadores nestes termos:

«Portugal é o país mais pobre e desigual da União Europeia

Aumenta o fosso entre os mais ricos e os mais pobres

O fosso entre ricos e pobres aumentou significativamente, havendo uma maior desigualdade entre os dois grupos de pessoas situados nos extremos da pirâmide social. Há cerca de dois milhões de pessoas a viver com menos de 350 euros por mês». (E aqui meto um parênteses para dizer que se a maioria desses 2 milhões de pessoas vivesse com 349 euros, até foguetes deitava! Enfim…).

Voltemos à SIC: «A comparação entre os rendimentos acumulados pelos 20% mais ricos e os 20% mais pobres, provam que os mais ricos detêm mais de sete vezes o rendimento dos mais necessitados». (outro parênteses para lembrar que 20% dos mais ricos são meia dúzia de famílias, e 20% dos mais pobres são centenas de milhares de seres pessoas).

Continuemos: «A tendência para a desigualdade não é só nacional, mas também mundial», esclareceu ainda a SIC, acrescentando que «o último relatório da ONU refere que nos últimos 20 anos, num grupo de 73 países, a desigualdade aumentou em mais de 50. Neste quadro, Portugal desceu de 26.º lugar para 27.º na lista do Desenvolvimento Humano das Nações Unidas».

Ficámos ainda a saber que «Portugal possui a pior taxa de abandono escolar da União Europeia, o maior índice de pobreza relativa e uma das maiores percentagens de crianças pobres».
Também o jornal Público tocou no assunto, noticiando que «o fosso entre ricos e pobres em Portugal tem vindo a aumentar», para afirmar que «Portugal é, de acordo com os últimos dados estatísticos do Eurostat, o país da União Europeia onde é maior a desigualdade entre ricos e pobres».

Confirma-se, mais uma vez, o que em vários momentos temos dito a estes microfones: «Portugal detém a condição de país mais desigual da UE e de portador de maior índice de pobreza relativa, com um valor que há anos estabilizou nos 20/21 por cento, o que se traduz por dois milhões de portugueses a rendimentos inferiores a metade do rendimento médio nacional. Ou seja, mais de dois milhões de portugueses vivem com menos de 350 euros por mês», sendo que a maior parte deles nem metade disso aufere.

Quando fui à Internet confirmar estas notícias, foi-me pedido um comentário a propósito desta notícia. E eu escrevi apenas isto: «Obrigado, dr. Mário Soares; obrigado, dr. Cavaco Silva; obrigado, eng. Guterres; obrigado, dr. Durão Barroso; obrigado, eng. Sócrates; obrigado, dr. Jorge Sampaio; obrigado, enfim, PS, PSD e CDS, por tão bem, ao longo dos últimos 30 anos, terem estado à frente dos destinos nacionais». Se calhar, esqueci-me de um ou dois mafarricos de segunda categoria, mas deixem lá: apesar de diferentes, eles são todos iguais…

Pela mesma altura, o senhor Presidente da República recordou, sensibilizado, os seus 10 anos passados em Belém. Os factos e as imagens da sua presidência trouxeram à sua alma sensível uma tal emoção, que não conseguiu disfarçar uma lagrimazita ao canto do olho. Foi a segunda vez que o vi ceder à emoção e às lágrimas, e sempre por razões poderosíssimas. A primeira, foi a propósito do Euro 2004, e metia o Hino Nacional e a emoção dos jogadores e do público ao entoá-lo. A segunda, foi esta, ao recordar dez anos de boa vida e melhor ordenado.

Ora, se o ilustre Chefe de Estado chora que nem uma Madalena Arrependida por coisas assim, por tretas destas, faço ideia do pranto que brotará dos seus olhos ao lembrar-se que existem tantos portugueses a passar tão mal, tanta criança mal alimentada e com frio, tanto velhote ao desamparo, tantos homens e mulheres a experimentarem o drama do desemprego, tantos jovens à espera que se abram, neste país injusto e desigual, as portas do futuro e da esperança.

Muito chorará Sampaio todos os dias, se todos os dias se lembrar da miséria que por aí vai. Uma empresa fecha as portas, vai de armas e bagagens para a Roménia ou para a Eslováquia, deixa a ver navios 300 famílias, e Jorge Sampaio, informado da situação pelos seus assessores, fecha-se no gabinete e chora, pelo menos, 10 horas a fio. Por isso, quando, daqui a uns anitos, a História se referir a Jorge Sampaio, há-de ser pelo mais do que merecido cognome de O Lacrimoso.

Mas estamos em vésperas das eleições para o sampaio que se segue. Ainda bem que a coisa está a dar as últimas, porque já não aguento mais tanta conversa fiada, tanta propaganda à banha da cobra, tanta esguichadela de sapiência bacoca, tanta vaidade, tanta ambição e tanta mentira.

Há dias, em Setúbal, Mário Soares, descontrolou-se e deixou sair pela boca fora o que lhe vai na alma. Furioso pelos apoios que Cavaco está a receber dos banqueiros e outros grandes capitalistas, disse mais ou menos o seguinte: «Essa gente não aprendeu nada com o 25 de Abril: agora apoiam Cavaco Silva, sem perceberem que, se Cavaco ganhar, virá aí a instabilidade, a conflituosidade social, o que não aconteceria comigo. Há 20 anos apoiaram-me, e voltarão a apoiar-me, se eu ganhar as eleições».

Não poderia ser mais claro: Cavaco, fará o frete aos banqueiros, sem dó nem piedade, à chanfalhada, se for preciso, como, aliás, aconteceu quando foi 1.º ministro, porque ele não parava para pensar, pois nunca se enganava e raramente tinha dúvidas; Soares saberá fazer o frete aos mesmos banqueiros, mas adormecendo primeiro a rapaziada, dando um ar de esquerda – e democrático, salvo seja… – à mesma política de extorsão e saque das classes trabalhadoras. A confissão só lhe saiu porque, por um lado, a idade já lhe vai pesando dentro da caixa craniana; e, por outro, porque a raiva de se ver traído pelos seus amigos capitalistas, lhe ofuscou a pouca lucidez que ainda tem. Enfim, confessou-se…

Apesar de estar farto da campanha – como, com certeza, quase todos os portugueses – espero que haja uma segunda volta, porque enquanto há vida, há esperança. E a esperança é que a decisão a tomar não seja entre o candidato da direita e um candidato de direita. Porque se for, meus amigos, no dia 12 de Fevereiro ninguém me vai apanhar na mesa de voto.

Pela primeira vez depois de 1969, quando votei na Oposição Democrática (então unida na chamada CDE), contra o Acção Nacional Popular, de Marcelo Caetano, e a CEUD, de Mário Soares, que traiçoeiramente negociou com o governo fascista a sua vinda a Portugal para dividir as forças que se opunham ao regime (mas que grande banhada que Soares, então, levou!), pela primeira vez desde 1969, dizia-vos eu, nunca deixei de votar na esquerda – e não é agora que vou mudar.

Mas, caros amigos, se não houver um candidato de esquerda a disputar a 2.ª volta, nem ao trabalho de votar nulo ou em branco me vou dar. Cavaco, Soares ou Alegre, cada um no seu estilo (ou falta dele), e cada um em graus diferentes, são solidariamente responsáveis pelas políticas que, ao longo de três décadas, castigaram os portugueses. Na governação, ou na Assembleia da República, estiveram sempre de acordo com as medidas que atiraram Portugal e os portugueses para pântano em que nos encontramos. Nenhum deles vai, agora, renegar a sua vida inteira, o seu edifício ideológico, nenhum deles vai passar a ser o que nunca foi.

Mas enquanto há vida, há esperança. E a esperança, no dia 22, é, para além de forçar a 2.ª volta, impedir que ela se dispute entre a fome e a vontade de comer. Ou entre o roto e o nu. Ou entre o mais do mesmo… e o mesmo do costume.


Crónica de João Carlos Pereira - Lida aos microfones da Rádio Baía em 18/01/2006

14/01/2006

ESTA SEMANA

* O venerando Chefe de Estado que temos chamou a Belém o cidadão Belmiro de Azevedo para o condecorar com a Grã-Cruz da Ordem do Infante Dom Henrique, a qual, visa “distinguir os que houveram prestado serviços relevantes a Portugal, no País e no Estrangeiro”.
Para o Dr. Jorge Sampaio, o agora condecorado Belmiro “demonstrou frontalidade e desassombro nos seus pontos de vista e luta pelos seus objectivos, num pais que, tantas vezes, a acomodação, a busca de protecção e favores e, nalguns casos até, a subserviência perante os vários poderes, constituem ainda, infelizmente, formas de actuação que, não raro, substituem a competência e o mérito”.
Não se sabe a que subservientes e incompetentes se referia o venerando Chefe do Estado, nem tão pouco queremos saber quais os critérios que o levaram a condecorar o patrão da Sonae, mas seria de toda a justiça que antes da saída do cargo que ocupa condecorasse outras personalidades, começando por exemplo, pelo ex-ministro Pina Moura, que muito se tem esforçado para merecer uma distinção, já que, para além de ser Deputado da Nação eleito pelo Partido Socialista, ainda lhe sobra tempo para presidir à Iberdrola, assim como para prestar serviços de consultoria na área da energia ao Grupo BCP, de onde recebeu em 2004 a módica quantia de 120 mil euros (24 mil contitos).

* Sugeriu o comentarista oficial do Partido Socialista, o iluminado Jorge Coelho, que os candidatos à Presidência da República deveriam tornar pública a lista dos financiadores das campanhas, já que, segundo ele, o grande capital estava ao lado de um dos candidatos e que por isso, a ser eleito, esse candidato ficaria refém desses mesmos capitalistas.
Mas, para quem se der ao trabalho de dar uma vista de olhos pela página da Fundação Mário Soares (www.fmsoares.pt) poderá verificar o nome dos Conselheiros da Fundação a que preside o octogenário candidato, destacando-se, entre muitos outros, os nomes de:
Américo Amorim, Belmiro de Azevedo, Fernanda Pires da Silva, Fernando Martins, Francisco Pinto Balsemão, Horácio Roque, Ilídio Pinho, Jorge de Brito, Jorge Jardim Gonçalves, Salvador Caetano e Stanley Ho.
Será que todos eles lhe viraram as costas neste momento e não estão a financiar directamente a sua campanha ou ele achou pouco o contributo de cada um ?

* Os registos de chamadas telefónicas estiveram na ordem do dia e nem o Presidente da República escapou ao “voyerismo” do Ministério Público, que quis saber se ele nas suas deslocações para o Palácio de Belém não iria parar nos jardins frente aos Jerónimos para meter uma “criancinha” dentro do carro.
Ninguém está acima da Lei e todos os cidadãos devem ser tratados de igual modo, mas parece um pouco exagerada esta caça às “bruxas” que ultimamente se tem gerado no seio das instituições de investigação, para, no final, não haver provas minimamente palpáveis que justifiquem tais processos.
Gostemos ou não do Dr. Jorge Sampaio, concordemos ou não com as suas atitudes e decisões, ele deve ser respeitado pelo alto cargo que ocupa, não se admitindo tais procedimentos de dúbia utilidade.
Até quando vai continuar a prepotência de alguns Juízes e de alguns Delegados do Ministério Público ?

11/01/2006

Os palavrões e o senhor Ambrósio

A nossa conversa da semana passada, como se devem recordar, aproveitou as milionárias férias de Verão e de Inverno de Sua Excelência socialista, o engenheiro José Sócrates, gozadas em plenos períodos de calamidade pública (os fogos, no primeiro caso, e a desgraçada política do aumenta os preços e aperta os salários, no segundo caso), para comparar a situação que se vive em Portugal, nos dias que correm, com a situação que se vivia em França, antes da Revolução Francesa. Então, como agora, enquanto o poder político e poder económico viviam num regabofe constante, as classes trabalhadoras, o povo em geral, definhava e finava-se entre a fome e a peste.

Mas eu comecei a crónica com um desafio aos ouvintes, a propósito de uma resposta de Buda a quem lhe perguntou o que mais o surpreendia na humanidade. Ele respondeu: «Os homens. Porque perdem a saúde para juntar dinheiro, depois perdem dinheiro para recuperarem a saúde. E por pensarem ansiosamente no futuro, esquecem o presente, de tal forma que acabam por não viver nem o presente, nem o futuro, e vivem como se nunca fossem morrer, e morrem como se nunca tivessem vivido!»

E o desafio que eu propus foi que os ouvintes dissessem o que é que esta resposta tinha a ver com o tema da crónica. Ninguém falou disso mas, tal como também prometi, aqui vai a minha opinião. Os seres humanos vivem como se nunca fossem morrer, e morrem como se nunca tivessem vivido, porque a isso são induzidos (talvez o termo «obrigados» fosse mais adequado) por aqueles que lhes controlam a vida, por aquela minoria que detém o poder económico – e, por consequência, o poder político – e controla com mão de ferro cada segundo da nossa vida, embora digam que mais não fazem do que cumprir a vontade do povo. A nossa vontade.

O que é verdade, é que pela força bruta – nas chamadas ditaduras – ou pela subtil manipulação ideológica – nas chamadas democracias – as classes dominantes determinam e condicionam a nossa existência. Vivemos e agimos, não de acordo com as nossas necessidades reais, sonhos e ambições mais legítimas, mas de acordo com os interesses daqueles que, dominando os meios de produção, o sistema financeiro e os circuitos comerciais, nos levam a consumir o que lhes convém e a viver de acordo com padrões que, em última análise, nos descaracterizam enquanto seres racionais e livres, com vontade própria e revestidos da dignidade maior de impormos, enquanto maioria, a nossa vontade suprema. Os nossos interesses, em suma.

Não comemos o que devíamos, mas o que convém aos que nos vendem a ração da moda. Não consumimos os produtos culturais que o génio humano produziu e produz, mas os excrementos pimbas que os ricos nos reservam para que deixemos de pensar e nos apodreça o cérebro.

Levam-nos a consumir o supérfluo em vez do essencial, porque nos criam falsas necessidades, e é a satisfazê-las que aumentam as suas fortunas. Por isso, os nomes de Óscar Lopes ou Franz Kafka nada dizem à maioria dos portugueses, muito menos o que escreveram. Tal como Rubinstein, Rodin, Bernard Shaw ou Carlos Seixas são ilustres desconhecidos para quase todos nós, embora saibamos muito bem quem é Stalone, ou um tal Schwarzenegger, dois montes de músculos, dois acefalóides absolutos, que explicam como tudo se consegue à lei da bomba, da bala, do sopapo e do pontapé. É a «cultura» dominante (que por acaso é norte-americana) a impor-se e a impor-nos os seus padrões: músculo para agredir e destruir, em vez de músculo para produzir e cérebro para inventar, respeitar e amar. Morte, em vez de vida.

Toma lá um telemóvel, um carrito a prestações, um cartão de crédito para te endividares à vontade, papa as telenovelas todas, não deixes escapar um único jogo de futebol na Sport TV, de caminho, vê o Big Brother, ou a Quinta das Celebridades, ou a Primeira Companhia, vai ao hiper passar os tempos livres, come um duplo mac e compra comprimidos para as dores de cabeça que esta trampa toda te provoca, mas não te esqueças de apostar no Euromilhões até sexta-feira, antes das 7 da tarde. Depois, até podes rir-te com a conversa dos políticos a fingir que uns são melhores que os outros, e chamar-lhes palhaços, desde que votes num daqueles que as sondagens dizem que podem ganhar.

Para os ricos e para os seus cães de fila – isto é: os políticos de formação burguesa – a melhor carne, as melhores clínicas de saúde – logo: a melhor saúde – as melhores escolas, os melhores empregos, os melhores ordenados, as melhores reformas (e quantas mais, melhor…), os melhores produtos culturais, as melhores férias, os melhores automóveis, as melhores mansões ou condomínios privados, tudo o que há de melhor. E tudo isto conseguido com o nosso dinheiro, ganho através daquilo que nos vendem, dos impostos que pagamos e, sobretudo, das mais-valias que aforram ao pagarem o nosso trabalho por muito menos do que ele vale.

Perante isto, como é que um Zé-Ninguém não há-de morrer sem nunca ter vivido?, diz-me lá, ó Buda, do alto da tua sabedoria.

Mas, para além disto, outras coisas ficaram por responder ou abordar na conversa de há oito dias.

Uma dessas coisas, refere-se à linguagem utilizada por uma ouvinte que, num vernáculo puro, se socorreu de alguns palavrões para expressar a sua revolta face ao governo que temos e às políticas que sofremos. É sempre discutível se a linguagem que utilizamos é – ou não – apropriada às situações em discussão. Sou da opinião que a ofensa gratuita e injustificada, o palavrão pelo palavrão, a linguagem «suja» e violenta como forma de expressão habitual, não deve ser aplaudida. Mas tudo é relativo. O que estava em causa – e está em causa – é sabermos o que é mais grave: se chamar filhos-da-mãe aos políticos que tantas violências cometem contra milhões de portugueses, se essas mesmas violências. É claro que não são a senhoras mães dos senhores ministros que se pretende atingir, ou as mulheres, caso do outro palavrão utilizado, que tinha implícita uma cabeça ornamentada, ou uma testa enfeitada com armações, a que também se chamam chavelhos, ou chifres, pois é metafórica a expressão. Deixem-me concluir como se deve concluir, pois essas palavrões significam, tão só, gente má, gente de mau íntimo, gente que prejudica o próximo, gente sem princípios nem moral, gente que semeia o mal, gente que, conscientemente, e a coberto do poder que detém, sacrifica outra gente.

Embora compreendendo os pruridos de alguns ouvintes, convido-os, no entanto, a fazerem o seguinte raciocínio: o que é pior? O palavrão indignado, como forma de exprimir essa mesma indignação, ou a prática política que leva a miséria e o desespero a milhares de lares? É mais bonito, ou menos grave, governar-se como se governa, daí resultando menos medicamentos para os idosos e doentes, menos roupa e leite (ou leite nenhum) para as crianças? Despedir às centenas e aos milhares? Iludir, ano após ano, década após década, sempre com os mesmos argumentos e sempre com as mesmas promessas vãs, milhões de pessoas, para se chegar sempre – mas sempre! – aos mesmos resultados, a esta conclusão: NÃO HÁ NADA PARA NINGUÉM (excepto para os do costume)? Mas haverá insulto maior do que este?

Haverá?

Não! Antes de nos indignarmos com os tais palavrões, devemos indignarmos com os políticos e as políticas que tanta miséria provocam, que tanta angústia espalham em milhões de famílias, e que, directa ou indirectamente, levam ao desespero e à morte um número incalculável de nossos compatriotas.
Insultar – mesmo que de insulto se tratasse – é bem menos grave que despedir um homem ou uma mulher que são o sustento da casa. Insultar – mesmo que de insulto se tratasse – é bem menos grave que retirar poder de compra a milhões de famílias, em nome da salvação das contas públicas, enquanto meia dúzia de outras famílias e a distinta classe política se enchem à custa da fome e das carências que, fria e metodicamente, provocam. Insultar – mesmo que de insulto se tratasse – é bem menos grave que aumentar o preço dos medicamentos, retirar outros das listas das comparticipações, pagar reformas cruéis e desumanas, enquanto alguns figurões se banqueteiam com várias e opulentas pensões, conseguidas ao fim de poucos anos ou, mesmo meses.

Há, em Portugal, mais de 2 milhões de pobres. Se calhar – e naturalmente – muitos deles chamarão a Sócrates, como antes a Durão, e a Guterres, e a Cavaco, e a Soares muitos e bem merecidos nomes feios. Alguém os pode criticar por isso? Pelos vistos, há por aí umas consciências muito sensíveis que se arrepiam com essa possibilidade.

Cá por mim – e sem querer ofender ninguém – sempre digo que o maior cego é aquele que não quer ver. E que enfie o barrete quem vir que lhe serve. E só esses.

Depois, todos sabemos que há por aí muito Ambrósio, sempre pronto a adivinhar os desejos da sua dourada senhora, e a ter o bar do Rolls Royce permanentemente bem fornecido com os inevitáveis Ferrero Rocher.

E os Ambrósios são – como convém – serviçais altamente educados.


Crónica de João Carlos Pereira - Lida aos microfones da Rádio Baía em 11/01/2006

08/01/2006

ESTA SEMANA

* Ouvimos na sua alocução ao País o Dr. Jorge Sampaio, ilustríssimo Presidente da República que temos, dizer que está muito preocupado com a Justiça, com os muitos portugueses que enfrentam grandes dificuldades no seu emprego e na sua vida, frisando até, a urgência que Portugal tem de realizar reformas políticas, económicas e orçamentais.
Passados quase dez anos no cargo em que pouco ou nada fez para alterar este estado de coisas, não se entende que esteja agora preocupado, a não ser consigo próprio e com o peso da sua consciência.

* Embora já estejamos habituados à dança que se opera entre os ex-ministros que passam a administradores de empresas públicas e estes a ministros ou a outra coisa qualquer em cargos pagos principescamente pelo Estado, temos também – e não é só de agora – os ex-ministros eleitos Deputados da Nação que acumulam com a Presidência de Conselhos de Administração de Empresas estrangeiras com interesses em Portugal.
Resta saber o que é mais vergonhoso; se o ex-ministro Pina Moura enquanto desempenhava o cargo no Governo ter sido o responsável pela entrada da Iberdrola no capital da EDP e depois vir a ser nomeado seu Presidente, se, como Deputado, eleito para defender os interesses portugueses, desempenha um alto cargo numa empresa estrangeira.
Para que serve a Comissão de Ética da Assembleia da República ?
Haja decoro !

* O senhor Governador do Banco de Portugal, Dr. Vitor Constâncio, apresentou o Boletim Económico de Inverno e veio dizer-nos que está de acordo com a política de rigor do actual governo liderado pelo seu camarada José Sócrates, aliás, ele tem sempre estado de acordo com todas as políticas dos Governos anteriores, recomendando, entre outras banalidades, que este deve assegurar a sustentabilidade da segurança social.
Esta recomendação deve ter a ver com o futuro dele e dos seus 5 colegas na Administração do nosso (deles) Banco Central, pois só de ordenados levam em conjunto anualmente 1.531.916 euros, ou seja, qualquer coisa como mais de 300.000 contos para os 6 senhores.
Não contabilizando as outras benesses que estão inerentes aos respectivos cargos, entre os quais a compra recente de 6 automóveis topo de gama para o transporte de suas excelências, aqui ficam os proventos anuais que nós lhes pagamos:
Vitor Constâncio (272.628 euros); António Pereira Marta (244.174 euros); José Martins de Matos (237.198 euros); José Silveira Godinho (273.700 euros + Pensão de Reforma do Banco de Portugal de 139.550 euros); Vitor Rodrigues Pessoa (276.983 euros + Pensão de Reforma de 39.101 euros); Manuel Ramos Sebastião (227.233 euros).
Com salários destes há que assegurar a sustentabilidade da Segurança Social, não vá dar-se o caso de quando chegar a reformazinha deles, não haver dinheiro para lhes pagar.

* Após as suas férias de Inverno passadas na Suiça, vimos o nosso primeiro Sócrates de muletas por ter dado uma quedazinha na neve – ainda não foi da cadeira – e soubemos das dificuldades que tem tido nas suas deslocações, para poder cumprir os muitos afazeres que tem diariamente. No Palácio de Belém, onde foi apresentar cumprimentos ao preocupado Presidente, enquanto os Ministros saíam pela porta principal, ele teve de sair pelas traseiras onde existe um elevador.
Pode ser que agora sinta as dificuldades que têm os milhares de cidadãos com deficiências e faça alguma coisa para obrigar a que se cumpra a legislação sobre barreiras arquitectónicas, começando por dar o exemplo nos edifícios pertencentes ao Estado.
Há males que podem vir por bem.

04/01/2006

José Sócrates e Maria Antonieta

Perguntaram a Buda: «O que mais te surpreende na humanidade». E ele respondeu: «Os homens. Porque perdem a saúde para juntar dinheiro, depois perdem dinheiro para recuperarem a saúde. E por pensarem ansiosamente no futuro, esquecem o presente, de tal forma que acabam por não viver nem o presente, nem o futuro, e vivem como se nunca fossem morrer, e morrem como se nunca tivessem vivido!»

Se me perguntarem, agora, se isto tem alguma coisa a ver com a crónica desta semana, eu respondo que não sei. Acho que tem… e acho que não tem. Mas fica um desafio: se os ouvintes encontrarem alguma relação implícita com o tema desta semana, arrisquem uma resposta. A minha – essa – fica para daqui a oito dias. Valeu?

Então, vamos à conversa de hoje.

Quando, no Verão do ano passado, a país ardia de lés-a-lés, Sua Excelência, o primeiro-ministro socialista, José Sócrates, abalou para um requintado safari no Quénia. Em Portugal, milhares de hectares eram dizimados pelos incêndios. Morriam bombeiros e populares, as chamas devoravam florestas, pomares, gado, casas, consumindo, em muitos casos, as economias arrecadadas ao longo de toda uma vida, ou os únicos meios de subsistência de milhares de compatriotas nossos. Em Maio desse mesmo ano, do alto da sua empáfia e irresponsabilidade, garantira ao país, no tom deslumbrado e arrogante do costume, que o governo havia tomado medidas para evitar a tragédia que, afinal, veio a acontecer.

Durante o inferno, Sua Excelência optou por continuar a gozar as suas belas férias, e encarregou o sempre sorridente ministro Costa para o representar e tomar as medidas necessárias. Viu-se o resultado.

Chegou o Natal, chegou o novo ano, e o mesmo governo, chefiado pelo mesmo primeiro-ministro, do mesmo partido socialista, com a mesma arrogância e insensibilidade, atira-se como lobo esfaimado aos magros ordenados dos portugueses e, ao mesmo tempo, abre a porta aos mais violentos aumentos de preços de que há memória.

Uma das maiores subidas é a dos combustíveis, que sobem quatro cêntimos por litro. As novas tarifas atingem também outros bens e serviços, como a electricidade, os transportes, as portagens e o tabaco. E, logo a seguir, aumentarão as rendas, já para não falar no Imposto Automóvel e no imposto sobre o tabaco, que aí só não se defende quem não quer. Mas a maior subida é a do pão, com um aumento de dez por cento!

Se alguém o questionasse dizendo que, como as coisas estão, milhões de portugueses nem pão poderão comer, Sócrates, este facínora político que governa o país, responderia, certamente, como respondeu Maria Antonieta, quando lhe disseram que o povo nem pão tinha para comer: «Não têm pão? Comam brioches!»

Mas os aumentos dos transportes, dos combustíveis e da electricidade, para além dos agravamentos que sofrem, vão provocar um efeito de reacção em cadeia em quase tudo o que se consome. A electricidade, por exemplo, aumentou, desde as zero horas do dia 1 de Janeiro, 2,3 % para os clientes domésticos, e mais 8,9 % para as empresas industriais. Como a coisa é dita, até parece que este aumento para as empresas não vai tocar no cidadão comum, como se a primeira coisa que as empresas vão fazer não seja aumentar o preço daquilo que produzem, para fazer repercutir nos consumidores – e não nos seus lucros – o aumento da electricidade. E o mesmo se passará com os transportes, os combustíveis ou as portagens. Paga o Zé, que é para isso que ele existe, porque sempre foi assim – e assim há-de ser enquanto quem mandar o fizer por conta e risco do sistema económico em vigor, mais conhecido por capitalismo, agora disfarçado de sociedade global.

A terra é uma aldeia global, proclamam eles, sorridentes e afáveis, querendo dar a entender que somos todos iguais e tudo está, da mesma maneira, ao alcance de todos. Li não sei onde – e só por isso não posso dizer-vos o nome do autor – que essa ideia da aldeia global tem uma pequena coisa que importa salientar. É que há a Aldeia de Baixo e a Aldeia de Cima». Pois há…

Mas, ao mesmo tempo que estes aumentos brutais, cruéis, verdadeiramente assassinos eram anunciados, o governo socialista apenas quer aumentar os trabalhadores em 1,5%. Só podendo impor esses aumentos aos funcionários públicos, eles são, no entanto, uma balda preciosa para as empresas privadas, que se agarram a esse tecto salarial com unhas e dentes.

Mas onde parava Sua Excelência, o socialista José Sócrates, que ainda é primeiro-ministro, quando estas triste notícias da sua governação se abatiam sobre os portugueses, cada vez mais entalados entre a espada do PS e a miséria da parede? Estava na Suíça, meus amigos, a gozar a crise – ou a gozar com a crise – esquiando nas alvas encostas de uma estância de turismo para ricaços. E não fosse um providencial trambolhão – certamente menor do que aquele que, mais dia, menos dia, Sua Excelência socialista dará do cadeirão do poder – ninguém saberia da sua escapadinha. Mas o destino tem destas coisas, o fulano estampou-se, fez um dói-dói no joelhinho, e a notícia chegou aos meios de comunicação social. Grande azar!

O povo a apertar o cinto, o poder de comprar a escoar-se-lhe por entre os dedos como areia seca, a vida a ficar insuportável para um número cada vez maior de portugueses, o desemprego a aumentar, os sacrifícios a serem exigidos com a mesma promessa – nunca cumprida – de sempre, que é essa de darmos hoje para recebermos amanhã, um amanhã que nunca chega – e nunca chegará, pelo menos enquanto esta gente estiver na mó de cima – bem, dizia eu que estava o povo a ser vampirizado, e o Drácula Sócrates a esquiar na Suiça, porque aos Dráculas deste mundo a crise nunca chega.

É aqui que me permito comparar – salvaguardadas todas as distâncias – a situação existente hoje em Portugal e aquela que se vivia, em França, nas vésperas da Revolução Francesa.

Lá, uma monarquia absoluta; aqui, uma maioria absoluta, também ela arrogante, insensível e acreditando que é omnipotente e intocável.

Lá, o problema do défice; cá… o problema do défice.

Lá, o povo a pagar o rombo das finanças públicas; cá, o povo a pagar o rombo das finanças públicas.

Lá, a nobreza e o clero, bem como as varejeiras que esvoaçavam em seu redor, viam a crise passar-lhes ao lado, e continuavam a sua vida de faustoso espavento: cá, os grandes grupos económicos, as grandes famílias, os governantes de plantão à caserna e as varejeiras que saltitam dos ministérios para as administrações, institutos e fundações – e vice-versa – também estão imunes à crise, e até engordam com ela.

Lá, o tesouro esgotava-se nos palácios, na ostentação da corte, nas caçadas reais, e, por exemplo, a primeira filha de Maria Antonieta, para que não crescesse, no dizer de sua mãe, «entre uma multidão inútil de pessoas de serviço», só teve direito a 80 criados; cá, o tesouro esgota-se em expôs, em euros, em otas, em tgv, em Lisboas/Dakar, em campeonatos de vela, em ordenados e reformas milionárias para a nobreza reinante (isto é: governante) e em cortes de boys e girls partidárias.

Lá, o poder estava entregue à nobreza, e, depois, tentando evitar males maiores, a uma Assembleia de Notáveis, que era escolhida pela camarilha real, normalmente príncipes de linhagem, prelados, nobres, magistrados, presidentes de municípios, tudo gente das classes privilegiadas, excepto seis representantes do sector popular. Por cá, o poder está entregue à camarilha dos partidos dos privilegiados de hoje e, tal como lá, também se delibera sem decidir nada de prático, salvo que tudo deve continuar na mesma, com uns a pagar e com os outros a gozar dos rendimentos.

Finalmente: lá, enquanto o povo morria de fome e de peste, Sua Majestade, Maria Antonieta dançava na Ópera, ceava no Bagatelle, apostava fortunas ao jogo, e gastava outras em luxos e desvarios, como foi mandar construir e mobilar o pequeno Trianon, ali dando festas em que fazia o papel de deusa e onde, indiferente à sorte dos franceses, se divertia o mais possível, especialmente à noite: cá, enquanto o povo sofre a política do atarraxa, Sua Excelência, José Sócrates, o primeiro-ministro socialista que a isso o obriga, diverte-se com as feras no Quénia, se é Verão, ou vai esquiar para a Suíça, se é Inverno.

Os dois absolutos, os dois indiferentes e insensíveis, os dois fora do mundo das pessoas comuns. Os dois vivendo das mesmas artes, os dois causando os mesmos males, os dois olhando-nos como seres inferiores.

Há quem diga – a História e todos os historiadores dizem-no – que depois da Revolução Francesa o mundo não voltou a ser o mesmo. É possível. Mas, pelo menos em Portugal, a coisa está a pôr-se muito igual ao que acontecia em França até a guilhotina entrar ao serviço…


Crónica de João Carlos Pereira - Lida aos microfones da Rádio Baía em 04/01/2006

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