31/03/2008

REFLEXÕES XXXIII

O DESTACAMENTO REGRESSA INVICTO

Na quarta-feira 26 de Março, Lisandra Guerra, com 20 anos de idade, consagrou-se em Manchester, na Grã Bretanha, campeã mundial na modalidade de 500 metros contra-relógio no Campeonato Mundial de Ciclismo de Pista, após competir renhidamente com atletas de 37 países. Que sã e legítima satisfação, porque é fruto da nossa educação, do nosso desporto, da nossa juventude e das nossas mulheres! Honra a quem honra merece!

Mas hoje não falarei do desporto. Nesse mesmo dia 26, regressou invicto o Destacamento do Contingente Henry Reeve que prestou serviços de emergência no Perú.

O terramoto teve lugar em 15 de Agosto de 2007. A sua intensidade foi de 7,9 graus na escala de Richter. O destacamento chegou a Cuzco em 18 de Agosto. Prestariam os seus serviços durante dois meses, tempo calculado como necessário e urgente.

Porém, a necessidade ultrapassou duas vezes e meia esses tempo. Realizaram 153.292 consultas, entre elas 65.299 nas próprias casas dos pacientes. Estiveram no Perú até 25 de Março de 2008, ou seja, sete meses e sete dias.

À frente do destacamento viajou o Doutor Juan Carlos Dupuy Nuñez, responsável pelo Contingente Henry Reeve quando este se criou em 19 de Setembro de 2005, chefe também da Brigada Médica no Paquistão. Vários membros do destacamento trabalharam no Paquistão e na Indonésia. Nem um só dos 77 homens e mulheres deixaram de cumprir o seu dever.

Escreveram com letras de ouro páginas indestrutíveis da história. Contra essa dignidade e consciência esbarram-se as habituais armas do imperialismo.

Dada a gratidão e reconhecimento do povo peruano, não foi moralmente possível partir desse país sem que outros membros do Contingente viajassem para prestarem os seus serviços.

Falarei nos próximos dias da China. Já está elaborado o material, faltando só pequenos retoques.

Não pensei sequer escrever sobre a comemoração do 20.º Aniversário da Batalha de Cuito Cuanavale, que foi a prova suprema da consciência internacionalista alcançada pelo nosso povo. Prefiro que quem foi testemunha pessoal dos heróicos acontecimentos que durante um período que não durou apenas um dia mas sim meses, fale na honra dos que caíram gloriosamente.

Ontem ouvi a Mesa Redonda sobre o Congresso dos Intelectuais e Artistas de Cuba que está prestes a iniciar-se. Não há dúvida de que os debates serão de grande interesse.

Estaremos atentos, observando os acontecimentos, enquanto Bush fará das suas durante os primeiros dias de Abril em Bucareste e no Mar Negro, como já denunciámos. E olhos no Vice! Assim se advertia nos tempos da república colonizada.


Fidel Castro Ruz
29 de Março de 2008

26/03/2008

PORTUGAL – UMA FÁBRICA DE POBRES

A nossa crónica de hoje teve a preciosa «ajuda» do economista Eugénio Rosa, autor de dois estudos sobre os preços dos combustíveis e da electricidade em Portugal, onde fui recolher os dados que me ajudaram a alinhavar estas linhas. A minha vénia ao autor e ao site www.resistir.info, onde os li, e que vos aconselho a visitar.

Em 2007, o preço do barril de petróleo aumentou, em euros, apenas 1,5%, mas os preços dos combustíveis, em Portugal, subiram entre 3,4% e 7,9%. Tudo aponta para que exista especulação – e da grossa – na venda de combustíveis, mas enquanto a ASAE se afinca na perseguição a feirantes e pequenos empresários, as grandes empresas petrolíferas fazem o que querem – e como querem.

A Direcção Geral de Energia e Geologia (DGEG) do Ministério da Economia (e a própria GALP) ajudam-nos a perceber o que se passa. Diz a DGEG que, em 2006, o preço médio do barril de petróleo importado por Portugal, em euros, foi de 51,90 euros e, em 2007, de 52,69 euros. Portanto, entre 2006 e 2007, o preço do barril de petróleo em euros (é esta moeda que interessa utilizar pois os combustíveis são vendidos internamente aos portugueses também em euros), aumentou apenas em 1,5%, uma subida inferior à taxa de inflação portuguesa, que foi, em 2007, de 2,5%. Mas enquanto se registou um aumento de apenas 1,5% no preço médio do barril de petróleo, entre 2006 e 2007, o preço médio da gasolina de 95 octanas, aumentou em 3,4%; o da gasolina de 98, em 4,1%; o do gasóleo rodoviário, em 3,5%; e o do gasóleo de aquecimento, em 7,9%, aumentos sempre muito superiores aos verificados no preço do barril de petróleo. Ora, dizer, como dizem as petrolíferas, que os aumentos dos preços dos combustíveis, com a dimensão que se tem verificado em Portugal, se devem à subida do preço do petróleo, é atirar areia para os olhos dos portugueses. É chamar-lhes estúpidos.

Se acrescentarmos a isto que, de acordo também com dados divulgados pelo Ministério da Economia, o preço da gasolina/95, sem impostos, era, em Portugal, superior ao preço médio da União Europeia em 1,8%, mas, em relação à Suécia, o preço já era superior em 13,6%, à França em 9,1%, e à Inglaterra em 9,2%, ficamos a pensar onde raio vão estes países importar petróleo. O mais engraçado é que, no mesmo ano, o preço da gasolina 95, com impostos, era em Portugal superior em 5% ao preço médio da União Europeia. Em relação à Espanha, era superior em +24,3%, à Grécia + 29,2%, ao Luxemburgo +17,3%... e por aí fora. E o que se passa com a gasolina, passa-se com o gasóleo.

Ora, só o facto de o preço da gasolina/95 e do gasóleo sem impostos serem superiores ao preço médio da União Europeia, deu às petrolíferas portuguesas, em 2007, um lucro extraordinário de 68,7 milhões de euros. É por isso que, apesar de se verificar uma quebra nas vendas dos combustíveis em Portugal, os lucros das petrolíferas não têm diminuído. Pelo contrário, têm aumentado. Em 2006, os resultados líquidos da GALP, antes de impostos, atingiram 962 milhões de euros e, em 2007, já foram de 1.011 milhões de euros.

Quem paga isto? O Zé. O mesmo Zé que, todos os dias, mexe e remexe nos bolsos, sem saber para onde foram os cêntimos que lá tinha na véspera.

Saltemos para a EDP. A EDP, em 2007, obteve um lucro extraordinário de €250 milhões, cobrando aos portugueses preços superiores aos preços comunitários, logo em países mais desenvolvidos e onde se praticam remunerações muito mais elevadas. Perante isto, cala-se o governo e cala-se a Autoridade da Concorrência, que, finalmente, lá decidiu levantar um processo para averiguar porque razão o preço da electricidade em Portugal é muito superior ao preço espanhol. Mas logo saltou o governo socialista em defesa da EDP, impedindo que os portugueses soubessem o que na realidade se passa. É bem o estilo do senhor «engenheiro» Sócrates mais a «transparência democrática» da sua «Esquerda Moderna»…

O que se passa é que o preço da electricidade em Portugal, sem impostos, era, em 2007, em média, superior em 21,1% ao preço médio comunitário. Analisando a questão por países, a diferença, em relação a alguns deles, é ainda maior. Sentem-se, por favor. Por exemplo: em 2007, o preço da electricidade em Portugal, sem impostos, era superior em 114,8% ao da Grécia; em 41,4% ao de Espanha; em 30,5% ao da Suécia; em 61,9% ao da Dinamarca. E ficamos por aqui.

Como consequência destes preços mais elevados, cerca de 250 milhões de euros dos 1.120 milhões de euros de lucros líquidos obtidos pela EDP, em 2007, tiveram como origem precisamente a diferença entre o preço praticado em Portugal, que é mais elevado, e o preço médio comunitário. Só em 2007, os cerca 4.700.000 consumidores domésticos tiveram de pagar pela electricidade que consumiram, cada um deles, mais 53,31 euros do que pagariam se o preço da electricidade em Portugal, sem impostos, fosse igual ao preço médio comunitário.

A explicação que o governo dá, do tipo Chico Esperto, é que como os preços da electricidade com impostos não são muito superiores aos preços médios comunitários, logo os consumidores não são prejudicados. E isto porque o Estado português cobra menos imposto e taxas sobre a electricidade que o cobrado em outros países. O governo não diz, por evidente desonestidade política, que o facto de os impostos serem menores em Portugal acaba por beneficiar apenas a EDP, que vende a electricidade a um preço muito superior ao praticado na generalidade dos países da UE, mas não beneficia os consumidores portugueses, que são, exactamente os que auferem os salários mais baixos de toda a Europa. Ou, se quisermos dizer de outra maneira: os baixos impostos que a EDP paga, para ter os lucros que tem, são compensados, depois, pelos contribuintes portugueses, obrigados a suportar o aumento de impostos que permita ao Estado obter uma receita equivalente à que perde com os impostos mais baixos que cobra sobre a electricidade.

E assim se entra à ganância no bolso dos portugueses, levando-lhes as migalhas que ainda lhes sobram. Fazendo, todos os dias, mais uns milhares de pobres.

Porém, enquanto os preços da electricidade em Portugal são muito superiores aos praticados noutros países da União Europeia, e os lucros da EDP ultrapassam os 1.100 milhões de euros em 2007, a nível de remunerações continua a suceder precisamente o contrário. De acordo com o Eurostat, as remunerações médias brutas dos trabalhadores portugueses, que constituem a maioria dos consumidores, correspondiam ainda a cerca de 49,2% das remunerações médias praticadas na União Europeia. Se a análise for feita por países, em relação à Suécia as remunerações portuguesas são inferiores em -54,6%; à Inglaterra em -64,2%; em relação à Finlândia em -53,3%; Dinamarca -67%; Bélgica -57,7%. Lindo! não é?

E assim se transforma Portugal no país mais atrasado da Europa. Ou, se quisermos, numa autêntica fábrica de fazer pobres. Graças, é claro, às políticas socialistas do senhor «engenheiro» Sócrates, por cognome O Pinóquio.

Por tudo isto, não espanta que de Janeiro de 2007, a igual mês de 2008, o crédito malparado dos empréstimos concedidos às famílias tenha aumentado 10%, totalizando já 2,27 mil milhões de euros. Só no primeiro mês deste ano os calotes de particulares à Banca aumentaram 70 milhões de euros. Esta é, se mais nenhuma houvesse, uma demonstração das dificuldades financeiras sentidas pelas famílias portuguesas, cada vez mais pobres e apertadas entre a espada do gang socialista no poder, e a parede dos bancos e das grandes empresas, cujos lucros não param de aumentar.

A compor o ramalhete, a Direcção-Geral dos Impostos começou a enviar cartas a contribuintes recém-casados, pedindo-lhes que prestem informações de natureza fiscal sobre o copo-de-água, o número de convidados, a quantidade de crianças presentes, quanto custou e quem pagou o vestido de noiva ou as flores, entre outras maravilhas da técnica espoliadora do senhor «engenheiro», onde as ameaças sinistras de multas e outras penalidades também não faltavam.

Um dia, o governo socialista ainda vai colocar uma máquina cobradora de impostos em cada sanita. E – garanto-vos eu – se ela incluir a foto de família do Governo, com o senhor «engenheiro» Sócrates e o vampírico Teixeira dos Santos em destaque, ninguém deixará de, gostosamente, contribuir com o seu mais sonoro e volumoso… imposto.


Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 26/03/2008.
(Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).

19/03/2008

A MAGNA QUESTÃO DO PIERCING…

Já percebi: o problema não é a fome que alastra por esse país fora. O problema são os piercings na língua, na glande ou nos lábios vaginais. No umbigo, também não é coisa que se aceite num país culto, desenvolvido, democrático, de esquerda moderna e, forçosamente, socialista. Nem nas sobrancelhas, narinas, beiças ou mamilos.

Piercings, apenas nas orelhas, e só se o PS der uma autorização especial, após parecer favorável do notável deputado socialista Renato Sampaio, e devidamente aprovada em conselho de ministros, presidido pelo seu presidente, o senhor «engenheiro» José Sócrates Pinto de Sousa. Aliás, se forem cadeados, ferrolhos, maçaricos (mesmo que apagados), ou rodas de tractor que os interessados pretendam colocar nas bandas orelhudas, a aprovação está excluída à partida. Por compreensíveis razões de segurança.

Também percebi: o problema não são os doentes sem médico, os idosos sem dinheiro para medicamentos, nem os que se vão desta para melhor à espera da ambulância ou à porta dos hospitais. O problema reside nas tatuagens, que também não se enquadram bem na harmoniosa paisagem do nosso tecido social. Dão um aspecto de selvajaria àquilo que é um bonançoso quadro de bem-estar e segurança. É preciso que, com os portugueses de tanga – e é até ver – a sua pele possa mostrar a nomenclatura óssea, sinal que ainda não fomos devorados pela máquina fiscal e a política de contenção salarial. E onde há osso… há tutano.

Continuo a perceber: o problema não são os assaltos e os assassinatos diários, os tiroteios, os gangs que, sob a ameaça de arma de fogo limpam quase todos os dias, a horas certas, os cafés da zona do Cacém, Rio de Mouro ou arredores, nem o carjaking rotineiro que se pratica a qualquer hora e em qualquer local deste bendito país. O nosso grande e real problema, neste terceiro ano da graça do reinado do senhor «engenheiro» José Sócrates Pinto de Sousa, por vontade do povo e bênção divina investido nas mui dignas funções de presidente do conselho de ministros do que resta de Portugal, reside na aberrante exuberância com que alguns meninos e meninas de todas as idades se enfeitam nos seus sítios mais ou menos recônditos, seja com ferragens diversas e tilintantes, seja com a gravação de desvairadas pinturas nas suas superfícies dérmicas.

Percebo, então, sem margem para quaisquer dúvidas: o problema não é o desemprego, nem as casas devolutas, nem os salários baixos, nem o endividamento excessivo, nem uma economia em desaceleração acelerada (passe o paradoxo), nem a consequente recessão que aí está a bater à porta, nem o facto de continuarmos a ser o último e fedorento pelinho da cauda da Europa. O problema, meus amigos, está na rapaziada que não sabe o que há-de fazer ao corpo e resolve decorar-se com todo o tipo de artefactos, ou pintalgar-se de alto a baixo, consoante a alucinação do momento ou a sua respeitável perspectiva de beleza e funcionalidade.

O problema não está no incompreensível aumento do preço dos combustíveis, tanto mais que, devido à valorização do euro, não nos custa mais do que custava há anos atrás, nem no facto de milhões de portugueses, ao preencherem as suas declarações de IRS, terem verificado que, afinal ganharam, em 2007, praticamente o que ganharam em 2006, apesar do aumento do custo de vida ter dado saltos que fariam chocalhar todas os piercings pendurados em línguas, escrotos, pénis, pencas, reentrâncias vaginais, redondezas umbigais, ou orelhudas badanas.

Morra, então, o piercing, causa de todos os males que Portugal suporta, o primeiro – e único – dos nossos problemas. Seja, então, a bem da nação que o nariz de alguns portugueses não pareça o focinho dos porcos quando se usava colocar-se-lhes um arganel. Deixemos que os alunos passem sem saber, para que as estatísticas dêem de Portugal a imagem de um país de sucesso. Mas não deixemos que se furem ou se pintem, em nome dos nossos bons e brandos costumes e, principalmente, da estética oficial.

Percebo, finalmente, que Portugal está a entrar no bom caminho. Até a droga já pode circular livremente nas prisões, para o que o Estado, magnânimo, oferece o material necessário a tão saudável prática. Droguem-se, pois, mas sem piercings, sem tatuagens, sem marcas. Marcas, apenas as da seringa. Aliás, o senhor deputado socialista não se lembrou – mas lembro-lhe eu – que seria enquadrável nas suas iluminadas perspectivas reduzir a pena dos reclusos (ou aumentar-lhes a dose de droga diária) que aceitassem livrar-se dos malditos e funestos piercings ou lixar as respectivas tatuagens.

Pronto! Rendo-me! O PS, finalmente, convenceu-me!

Quero lá saber dos problemas da Justiça, se é uma para os pobres, e outra para os abusadores de crianças, sejam elas da Casa Pia, da Madeira ou do Parque Eduardo VII.

Quero lá saber da corrupção, seja ela a do futebol e do seu Apito Dourado, seja a das grandes obras públicas ou particulares, meta ou não abate de sobreiros e violação grosseira de áreas protegidas.

Quero lá saber se a Operação Furacão acaba com um ar que lhe der, e se quanto às habilidades no BCP se provar que não foram praticadas por ninguém.

Quero lá saber, então, se nenhuma figura importante é condenada, e que a justiça seja algo que funciona apenas contra o Zé-Ninguém.

Quero lá saber se a Universidade Independente vendia diplomas a pronto e a prestações, e se o homem é «engenheiro», «doutor» ou «arquitecto», e se o outro também se formou à pressão, para ficar mais bonito no retrato de administrador da CGD.

Quero lá saber se compram aviões, submarinos, helicópteros e carros de combate para combater mosquitos ou, na melhor das hipóteses, para fazer o frete aos norte-americanos, e quem ganha com isso – e quanto.

Quero lá saber se as obras derrapam sempre e não servem para nada.

Quero lá saber dos desempregados, da sopa dos pobres, dos casais que ficaram sem casa, dos pobres que se mostram e dos pobres que se escondem.

Quero lá saber do polícia que foi baleado por um assaltante, se o que é importante é o assaltante que foi baleado pelo polícia.

Quero lá saber se o país é um ninho de corruptos e se fazem leis à medida, para que ninguém se chamusque.

Quero lá saber se os políticos fazem leis que lhes permitem ganhar muito e reformarem-se cedo, enquanto fazem outras que nos obrigam a ganharmos pouco e a reformar-nos tarde e com pensões sempre mais baixas.

Quero lá saber se a Educação e a Saúde são, cada vez mais, grandes negócios para o sector privado, à medida em que o governo vai destruindo a escola pública e arrasando o Serviço Nacional de Saúde.

Quero lá saber se os portugueses nascem e morrem em ambulâncias, na berma da estrada, ou no diabo que os carregue, pois não passam de meros números, peças, utensílios, ferramentas, que só devem funcionar para encher os cofres do Estado e das grandes empresas privadas.

O que eu quero saber, de facto, é que existem deputados socialistas que se preocupam com o grande, trágico e transcendente problema dos piercings e das tatuagens, facto que a história da democracia registará como a mais brilhante e decisiva iniciativa política que, de uma vez por todas – e de um dia para o outro – levará Portugal do último e sebento pelo da cauda da Europa, até à pontinha do focinho da dita cuja.

Abaixo o piercing!

Viva o PS e o higiénico «socialista» Renato Sampaio!

Esquerda Moderna, sim! Piercings nas coisas (ou nos coisos)… nunca mais!


Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 19/03/2008.
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12/03/2008

OS MISERÁVEIS

Vítor Hugo não levará a mal se o título da sua mais célebre obra encimar a crónica de hoje, tanto mais que, de uma maneira ou de outra, os ideais que o levaram a escrever o seu livro são, no essencial, muito parecidos com aqueles que me orientam.

Os miseráveis, no texto imortal de Vítor Hugo, são a gente sem poder nem direitos, as vítimas de uma sociedade profundamente desigual, cuja única razão de existir é contribuir para encher os cofres dos poderosos, sujeitando-se, para tal, a todo o tipo de sofrimentos e humilhações, sem que isso possa parecer injusto ou imoral. Pior: reagir contra esta violência legal é que seria crime, pois «a ordem natural das coisas», com ou sem toque divino, não pode ser questionada.

Mas os miseráveis são também, de forma implícita, os que sustentam essa sociedade opressiva e bestial, impondo a sua força estribada em leis feitas de acordo com os seus interesses e tendo, como seus agentes executores – os seus esbirros – aqueles que, dos oprimidos vindo, se vendem (ou se rendem) e se transformam na mão visível da violência legal.

Significa isto que temos dois tipos de miseráveis. Os miseráveis em termos materiais, porque na miséria vivem e, em consequência, não passam de párias sujeitos a todo o tipo de abusos e excessos. E os miseráveis morais, que criam, mantêm e fomentam este tipo de sociedade, obscenamente desigual, dela beneficiando escandalosamente, como se tal esbulho, e as suas consequências, devessem ser acatadas sem recalcitrar.

Era assim no tempo de Vítor Hugo (a sua obra foi escrita em 1862), é assim no tempo de hoje. Como então, aí temos, de um lado, os senhores do dinheiro e a classe política profundamente unidas, como átomos da mesma molécula, fabricando leis à medida dos seus interesses, que querem consolidar e perpetuar. E, do outro lado, a massa imensa dos que labutam, sujeitos sempre ao arbítrio dessa elite instalada, como se, de entre os seres humanos, uns o fossem mais do que outros.

Pelo meio, uma inconfundível turba de esbirros, sempre prontos a fazer cumprir as leis, muitos deles apenas pelo puro gozo de terem um chicote nas mãos. E poderem utilizá-lo.

E assim se vive em Portugal, onde as parecenças com a época de Vítor Hugo se acentuam todos os dias. Exemplos não faltam. Vamos a alguns.

Quem assiste ao programa Fátima, nas manhãs de segunda a sexta-feira, na SIC, depara-se com casos interessantes e significativos. Um deles, conta a saga de um garoto que, padecendo de grave doença, encetou, em Cuba, o processo da sua recuperação motora, já que, em Portugal, os miseráveis que governam, não só não lhe oferecem a qualidade de tratamento que em Cuba lhe disponibilizam, como lhe negam apoio para as suas deslocações à pátria de Fidel e de Che Guevara.

Então, é através do programa da Fátima Lopes que se tenta mobilizar a sociedade civil para conseguir reunir o dinheiro necessário às viagens e tratamentos – ou seja: é ali que a família do garoto vai estender a mão à caridade – porque o governo tem mais em que pensar, e a saúde dos filhos da plebe, dos miseráveis, não consta do rol das suas preocupações.

Aliás, no programa de que vos falo, é comum surgirem situações desta natureza, pois as famílias, aflitas com problemas financeiros ou de saúde, a ele recorrem com frequência, na esperança de que os donativos de particulares surjam e aliviem os seus dramas.

Outro caso ali apresentado, conta-nos a história de um pequeno que sofreu queimaduras terríveis, ficando completamente desfigurado. Está vivo graças à coragem de um irmão, que o arrancou, já feito tocha, das labaredas que o consumiam. Ora, o garoto precisa agora de várias operações plásticas que lhe reconstruam minimamente a face, para que possa, enquanto criança e, depois, como adulto, ter uma vida normal, sem traumas psicológicos – ou com o mínimo deles.

Acontece, porém, que o governo não comparticipa este tipo de intervenções, pois considera-as, cegamente, intervenções estéticas, logo supérfluas e, portanto, desnecessárias. Resultado: lá vai a família, em desespero de causa, expor o caso na praça pública, para que, sensibilizando os espectadores, beneficie dos donativos (das esmolas) que substituam as leis miseráveis que os miseráveis que governam vão produzindo.

Seguindo esta linha de raciocínio salto para outro caso ilustrativo da situação miserável a que chegámos.

Sabemos que os políticos aprovaram leis que lhes garantem suculentos ordenados e nutritivas reformas. Os mesmos – os mesmíssimos – políticos que aprovam, para os milhões de cidadãos que dizem servir, governando-os, baixos salários e reformas cada vez mais magras e difíceis. Todos sabemos, também, que aumentaram a idade da reforma e introduziram formas de cálculo que diminuem a reforma dos miseráveis que trabalham para sobreviver, quando chegar a hora de descansar um pouco. Se ainda forem vivos…

O exemplo que vos dou não passa disso mesmo: um exemplo. E se Marques Mendes é a figura citada, não significa que contra ele tenha um acinte especial, bem pelo contrário, até lhe acho alguma piada.

Ora, Marques Mendes acabou a alcançar a sua reforma. Não aos sessenta e cinco anos de idade, não ao fim de trinta e tal anos de esforçado trabalho, não uns miseráveis duzentos e poucos euros de pensão. Nada disso. Marques Mendes, que não é mais nem menos que toda a cambada de políticos que já se reformou à custa da política (e das tetas desta espécie de democracia), leva uma boa maquia para casa. De facto, aos 50 anos e com 20 anos de descontos como deputado, o novo pensionista vai receber aquilo a que tem direito, ou seja, 2.905 euros mensais para o resto da sua vidinha.

Mas o que Marques Mendes – e a restante corja de miseráveis que fazem leis – aprovaram para aqueles que deveriam defender (e que lhes pagam os ordenados e estas belas reformas) é bem diferente. Para esses miseráveis – os trabalhadores comuns – suas excelências ditam que devem trabalhar até aos 65 anos e ter descontado sem falhas toda a vida, se quiserem obter uma reforma de… 80% da remuneração média da sua carreira contributiva.

Ou seja: uma miséria para os miseráveis do costume. Um fartote para os miseráveis que vivem da miséria que espalham pelo país.

Não posso acabar sem me referir à grandiosa manifestação do dia 8, quando mais de cem mil professores abriram brechas nas muralhas da prepotência, arrogância e desconchavo de Sócrates e da sua sinistra ministra da Educação.

Por muito que isso doa aos miseráveis que julgam que as coisas nunca mudam, este mundo, como já Luís de Camões sabia, é mesmo «composto de mudança».

Vai devagar. Mas vai.


Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 12/03/2008.
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05/03/2008

A BANDALHEIRA SOCIALISTA

- ou o país sem rei nem roque

Como já aqui dissemos – ou melhor, como já aqui denunciámos – o número de portugueses a residir em Espanha cresceu mais de 40% no último ano. Ao todo, no país vizinho residem perto de 102 mil compatriotas nossos, que constituem já a quarta maior comunidade proveniente da União Europeia. Desses, perto de 83 mil estão inscritos na Segurança Social.

Os portugueses emigram principalmente para a Galiza, Andaluzia e Madrid, mas há ainda um número incalculável que todos as manhãs atravessa a fronteira para trabalhar em Espanha, voltando ao fim do dia. E há aqueles que vão segunda-feira, regressando na sexta, para passar o fim-de-semana com a família. Alguns, como sabemos, fazem uma viagem sem regresso, pois os acidentes de viação já ceifaram várias vidas nesse vaivém a que a miséria reinante na sua pátria os obriga.

Ora, por muito que o PS o queira esconder, o senhor presidente do conselho de ministros fuja do tema como o diabo da cruz e os bem instalados (com vários empregos e suculentos ordenados e reformas) digam que não, a verdade é que a situação financeira das famílias portuguesas é a pior de sempre. Não conseguem poupar dinheiro, a tal ponto que as intenções para a compra de carro ou de simples electrodomésticos estão adiadas sine die.

«Mentira!», mugirão os socretinos, essa espécie de humanóides que começaram por constituir um bando de boys e girls, evoluíram depois para bufos ao serviço do chefe máximo, e são agora algo indecifrável, mas verdadeiramente repugnante, de aspecto vagamente humano, mas onde predomina um ar de ratazana de esgoto com genes de vampiro.

Não, não é mentira, garanto-vos. Nem mais uma atoarda de uma oposição subversiva. Nem uma aldrabice minha, coisa que muitos se pelam para que acontecesse, mas, quanto a isso, bem podem tirar o cavalinho da chuva. O que acabei de dizer foi extraído dos números publicados há dias pelo insuspeito Instituto Nacional de Estatística. Receosos de um agravamento do desemprego e com o endividamento a crescer, não espanta que a confiança dos portugueses que ainda não fugiram para Espanha, para Inglaterra, Brasil, Dinamarca, Holanda, Finlândia ou qualquer outra ignota paragem, esteja também ao nível mais baixo desde 2003.

Já em Janeiro, o INE tinha confessado que as famílias estavam a cortar nas compras de bens alimentares. Agora, o inquérito refere que a intenção de compras de bens duradouros – como electrodomésticos ou equipamentos de lazer – está a aproximar-se do mínimo histórico, o que será mais um recorde que atesta a excelente governação do senhor Pinto de Sousa, mais conhecido por «engenheiro» Sócrates, aliás – e nunca é demais referi-lo – excelentíssimo senhor presidente do conselho de ministros.

Com o desemprego ao seu nível mais elevado desde 1986 (e esta é a verdade, diga o «engenheiro» o que disser e reclamem os socretinos, vomitando as loas que quiserem) as famílias não acreditam que haja mais emprego nos próximos meses. Depois, porque os bancos precisam de aumentar os seus lucros – tão fabulosos como imorais – acresce que o nível de endividamento e a subida das taxas de juro se aliam à inflação e aos baixos aumentos salariais para destruir o poder de compra das famílias.

Assim, não é difícil compreender o estado de desmoralização e desânimo dos portugueses. Com as dívidas à banca a ultrapassar em 20% o rendimento disponível anual, resta dizer que as taxas de juro à habitação subiram 25% em 2007. Com o Zé Povinho a apertar o cinto – ou os cordões à bolsa – os comerciantes vêem a sua vida a andar para trás, já que não conseguem ver entrar dinheiro em caixa. Nunca se viu uma época de saldos tão tísica, com as lojas às moscas e os apelativos descontos de até 50 e 70% a caírem em saco roto.

No topo superior da cadeia comercial, também a confiança dos grossistas na actividade económica atingiu o nível mais baixo desde 2006. Diz o INE, que as «apreciações sobre o volume de vendas» dos comerciantes «também se agravaram» em Fevereiro, em comparação com Janeiro.

Mas, para o senhor presidente do conselho de ministros, correspondente alcateia, porta-vozes e demais apaniguados (senhores deputados cor-de-rosa incluídos), tudo é um mar… de rosas. Naturalmente.

No entanto uma sondagem recente falou de uma quebra acentuada nas intenções de voto nos ditos «socialistas», com o chefão a perder, também, popularidade. Dias depois, lá surge outra mais generosa para a horda do Largo do Rato. Não sei se alguém encomendou a primeira sondagem. Mas a segunda, a gente percebe logo quem foi.

Entretanto, anda tudo para aí aos tiros. Mata-se por tudo e por nada, por dá cá aquela palha – ou por dá cá o teu carro, telemóvel, carteira com cartões, os trocos que tens no bolso. Um informador da PJ, ligado ao processo dos gangs do Porto, foi pelos ares ao volante do seu Ferrari. Que lindo! Já a fechar a crónica mais um morto à facada, em pleno C.C. Colombo. É obra!

Assalta-se a torto e a direito, seja com gazua, seja com grua, seja por esticão, seja com caçadeira de canos serrados, à metralhadora, seja com as ferramentas infernais dos offshores. Roubar é o que está a dar. A chatice é que o ofício de roubar é como a droga. Há muitos anos, era apenas um vício da alta sociedade. Depois, proletarizou-se, e hoje droga-se a gente fina (como já se drogava) e drogam-se os palermas cá de baixo.

Passa-se o mesmo com o gamanço. Toda a gente – salvo seja, é claro, trata-se de uma força de expressão – acha que tem o direito de se apropriar do que não é seu, porque, meus amigos, ou há moralidade, ou roubam todos. Ou vocês pensavam que só se podia roubar legalmente, aumentando, por exemplo, o IMI e outros impostos? Ou por malabarismos contabilísticos? Ou por engenharias financeiras? Ou pela arte sublime da falência?

Então, face à voragem – e ao exemplo – socialista, que rouba por decreto ou portaria, vá de roubar de qualquer jeito: apontando a seringa, a fusca, a bazuca, a catana, à cachaporra ou à martelada. Parece que a roubar é que a gente se entende.

Face a este panorama, as polícias não sabem para que lado se hão-de virar. Se começam a meter dentro tudo o que é ladrão, lá ficamos sem sistema financeiro, sem estrutura política, sem obras públicas, sem aparelho produtivo, eu sei lá…

Pelo sim, pelo não, alguém deitou a luva à PJ. Nunca – nem nos tempos da outra senhora – esta prestigiada polícia sofreu o que hoje sofre às mãos do PS. Os resultados estão á vista. É a barafunda total. O descalabro, a bagunça, a pouca-vergonha. As demissões. Os atropelos. O assalto aos postos de comando. Salvam-se os profissionais dos diversos níveis, mas esses nada podem perante a manápula cor-de-rosa, que precisa de se salvaguardar de surpresas desagradáveis.

Que se lixe e relixe! Roubai-vos – e matai-vos – uns aos outros. Cá por mim, já estou por tudo. É assim que o PS quer? Pois que se faça a sua vontade! Quando bater no fundo, talvez acordem os que não se espatifarem todos.

Cá por mim, vou seguir os concelhos de uma certa Margarida, de Lisboa, que nos contou esta maravilha:

«Um caso particular, mas decerto familiar a muitos de vós. Somos uma família normal de quatro pessoas. Somos aquilo a que em tempos se chamou "classe média". Como acontece com muitos, bem mais de 50% do nosso rendimento é chupado pelo banco para a prestação da casa. Há cerca de dois anos, sentindo-nos desanimados com a política e impotentes para vencer as injustiças sociais, estabelecemos regras individuais importantes, de sobrevivência e luta: por norma, deixámos de consumir o que quer que seja em pastelarias. O pão faz-se em casa, com uma máquina (dura muito se for integral); as sandes, obviamente, também; café e sumos idem; iogurtes, só compramos naturais e os mais baratos (a imaginação é à borla e acrescentamos o que houver); ao jantar não é preciso carne (ao almoço, confiamos que as crianças comam na escola) e para proteínas temos o leite e seus derivados, e outras alternativas mais baratas, como feijão com arroz (ou seja, raramente compramos carne); no frigorífico temos agora leite, manteiga, iogurtes naturais, sopa e legumes frescos; no congelador, legumes e peixe. Na despensa, há variedade de massas, arrozes, e afins. Mas sim. Gostaríamos de não viver assim, a fazer esta ginástica diária. Como muitos de vocês, certamente. Por isso deixo a sugestão: se formos muitos a boicotar a sociedade de consumo (vocês pagam mesmo 500 paus por um sumo de laranja natural num café?!), pode ser que mudemos alguma coisa. Não vejam isso como uma privação, mas como uma forma de luta. Vão para os jardins públicos, para espaços gratuitos. Levem os amigos, os filhos, os sacos com fruta nacional e pão feito em casa. Convivam. Discutam. Divirtam-se. Organizem-se. Voltem a falar de ideias. Deitem fora os cartões de crédito. Acordem. Saiam dos centros comerciais. Avisem o Sr. António do café que não voltam a entrar lá enquanto a bica custar mais de 80 paus (e já é um exagero). Obriguem-no, também ele, a "fazer ginástica" e a protestar. Inventem novas maneiras de rir na cara das grandes bestas que vivem luxuosamente às nossas custas. Quem ri por último, ri melhor, acreditem».

A Margarida tem razão. Se não podemos consumir o que queremos, então deixemos de consumir também o que eles querem.

Na verdade, meus amigos, nós podemos ser a areia que lhes lixa a engrenagem.

Basta querermos. Vamos a isso?


Crónica de: João Carlos Pereira
Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 05/03/2008.
(Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).

02/03/2008

REFLEXÕES XXXII

ESPERO NÃO TER QUE FICAR ENVERGONHADO

Durante estes dias de voluntário repouso li um grande número de telexes transmitidos por agências tradicionais de imprensa escrita ou através da Internet. De entre eles, destaca-se uma informação sobre Cuba no site digital da BBC Mundo que repugna pelo seu insultuoso ataque pessoal. Publicado em 25 de Fevereiro, um dia após a eleição do Presidente do Conselho de Estado, sob o subtítulo de “O peso das reflexões”, afirma o seguinte:

“Fidel Castro parece querer tranquilizar o novo governo e promete ‘ser cuidadoso’ com as opiniões que expressa nos seus editoriais, os quais são publicados em todos os meios de difusão do país, incluindo rádio e televisão.

“Nas suas reflexões faz um novo exercício de modéstia, não só pede para ser chamado de ‘companheiro Fidel’, mas também que os seus escritos não apareçam nas portadas do jornal oficial, e insiste em que os outros meios apenas emitam uma síntese.”

“…Trata-se só de uma questão formal; embora as suas reflexões apareçam na página de desportos, o seu peso não será por isso menor. Tanto nacional quanto internacionalmente, qualquer comentário do ‘companheiro Fidel’ repercutirá profundamente.

“Em certa forma, é uma Espada de Dâmocles pendente sobre a cabeça dos dirigentes. Todos eles sabem que seria extremamente difícil levar adiante qualquer política que seja publicamente condenada por Castro…”

“As relações entre os irmãos Castro são em Cuba um mistério condimentado pelos mais diversos boatos…”

“Contam que ficaram encerrados sozinhos e discutiram várias horas, que desde fora do gabinete de Fidel se podiam escutar os berros de ambos.”

“Nada disto pode ser confirmado, não há provas, apenas supostas testemunhas; mas em Cuba, como em nenhum outro país, quando o rio soa é porque vêem pedras a rolar, e ‘Rádio Mexerico’, a transmissão oral da informação, quase sempre dá certo.”

Outros importantes órgãos da grande imprensa norte-americana, The New York Times, The Washington Post e The Wall Street Journal, expressaram frustração, mas sem recorrer a grosseiros insultos.

Para muitos, o nosso país era como uma caldeira cheia de vapor a ponto de estourar. Choca-lhes o meio século de resistência heróica.

As inteligentes e serenas palavras de Raúl depois que os 609 membros da Assembleia Nacional presentes o elegeram por unanimidade Presidente do Conselho de Estado, as suas sinceras arguições, desenredaram a maranha de ilusões criadas em torno a Cuba. Quem conhece bem tanto o Raúl quanto a mim, sabem que por elementar sentido de dignidade e respeito tal tipo de reunião jamais poderia ter acontecido. Não são poucos os que ficaram com a vontade de ver um súbito derrubamento da Revolução heróica que resistiu e resiste meio século de agressão imperialista.

Agora ouvem-se as uivadas dos lobos apanhados pela cauda. Que raiva lhes provoca em especial a eleição de Machadito, como Primeiro Vice-presidente, Secretário de Organização do Partido Comunista de Cuba, ao qual a Constituição outorga a tarefa principal na condução do povo rumo ao socialismo.

Como no mundo das nebulosas e dos protocolos o que conta é a chefia do Estado e se considera à organização partidária como um intruso indesejável, e portanto um princípio interno, no caso específico de Cuba deveria bastar-lhes saber que Raúl conta com todas as faculdades e prerrogativas legais e constitucionais para dirigir o nosso país. Como ele próprio explicou, o cargo de Primeiro Vice-presidente que ostentava ― e do qual ninguém foi demitido ― foi consultado comigo no processo de integração da candidatura unitária. Não foi devido a que eu exigisse a consulta; foi uma decisão de Raúl e dos dirigentes principais do país o facto de me consultarem. Foi igualmente uma decisão minha solicitar à Comissão de Candidatura que na lista de candidatos para o Conselho de Estado fossem incluídos Leopoldo Cintra Frías e Álvaro López Miera, os quais se juntaram aos combatentes do Exército Rebelde quando apenas tinham 15 anos de idade. Ambos são muito mais jovens que McCain e têm mais experiência como chefes militares, demonstrada em vitoriosas façanhas internacionalistas.

Polito dirigiu a batalha de Cuito Cuanavale, a sudeste, e a contra-ofensiva a sudoeste, com mais de 40 mil combatentes voluntários cubanos e mais de 30 mil soldados angolanos, que expulsaram de Angola os últimos invasores do exército do apartheid.

O governo dos Estados Unidos criou condições para que a África do Sul racista, em determinadas condições, usasse a arma nuclear contra aquelas tropas.

López Miera, numa ocasião se auto bombardeou quando, nas proximidades de Luanda, ordenou à artilharia de reacção múltipla, disparar sobre suas próprias posições, assaltadas e quase ocupadas por forças sul-africanas que invadiram pela primeira vez a Angola em 1975.

O tabuleiro de xadrez indicava essas variantes. Não eram fruto de supostas tendências militaristas de Raúl, nem se tratava de gerações ou partidos a se disputarem às dentadas o mundano poder. Pela minha parte, reafirmo ficar alheio a todo cargo, como expressei na mensagem ao povo a 18 de Fevereiro de 2008.

Um dos que ficou sem fôlego é o pai teórico da “independência” do Cossovo. Numa das Reflexões, publicada a 22 de Fevereiro, descrevi-o como “um ilustríssimo personagem espanhol, outrora Ministro da Cultura, impecável socialista hoje, e desde há muito porta-voz das armas e da guerra”. (Foi além disso, em diversos momentos, Ministro porta-voz do governo, Ministro de Educação e Ciência e Ministro de Assuntos Exteriores).

O que disse? “As notícias de ontem poderiam ter sido mais abertas, melhores. Do que não tenho a certeza é de que se tenha iniciado a transição do ponto de vista político…Tudo o que possa ir na direção de uma transição política rumo à democracia é bem-vinda.”

Falou como se vivêssemos na Espanha de Francisco Franco, íntimo aliado dos Estados Unidos, e não em Cuba, onde têm investido mais de cem bilhões de dólares ― de muito mais valor que os actuais ― para bloqueá-la e destruí-la.

Que homem! Não há forma de o calar! Como se chama? Já a Mesa Redonda há dois ou três dias mencionou o pecado e o pecador: Javier Solana.

Onde milita? No Partido Socialista Operário da Espanha. Não viajaria ao nosso país porque Cuba, por ocasião da guerra contra a República Sérvia, fez um apelo ao mundo para julgá-lo como criminoso de guerra num tribunal internacional. Como Ministro de Assuntos Exteriores de Espanha, recebeu-me no aeroporto de Madrid quando foi celebrada a II Reunião de Cúpula Ibero-americana, realizada na capital de Espanha. Parecia um anjo!

Até Aznar, que aconselhou Clinton para bombardear a emissora de televisão da Sérvia, o que ocasionou a morte a dezenas de pessoas, compreende que neste momento, nas vésperas de eleições, não se pode brincar com o assunto das nacionalidades, visto que qualquer um repara que com esses antecedentes o País Basco e a Catalunha se poderiam acolher a tal princípio dentro da Comunidade Europeia, e são duas nações das mais industrializadas da Espanha. Também podem fazer a mesma coisa os escoceses e os irlandeses.

Com os destinos da espécie humana em tais mãos, é como se a gente dançasse alegremente na beira de um abismo onde reina a vaidade de não poucos hierarcas do mundo capitalista globalizado, que põem em perigo todos os países. Os valores humanitários, educacionais e artísticos, alcançados com os seus próprios recursos pela Revolução em Cuba que querem destruir, não significam nada para eles, se não se submete à tirania do livre mercado; este e as suas leis cegas estão afundando a espécie humana numa crise económica insustentável e uma mudança nas condições naturais de vida que pode tornar-se irreversível.

É para lutar contra isso que escrevo Reflexões. Talvez, se o tempo fosse abundante, estaria disposto a escrever umas memórias para refrescar lembranças que hoje estão espalhadas em discursos, entrevistas, diálogos, declarações, reuniões, reflexões e coisas dessa natureza. Gastei toneladas de papel e toneladas de sons ― valha a expressão simbólica ― mas não tenho motivos para ficar envergonhado.


Fidel Castro Ruz
28 de Fevereiro de 2008

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