02/07/2008

O PAÍS – E O MUNDO – EM REVISTA

A descida da taxa do IVA em 1% (depois de o Governo o ter subido em 2%) não se vai fazer sentir no dia-a-dia do português comum. Dizem todos os analistas que o que vai acontecer é os preços subirem também 1%, de modo a que tudo fique na mesma. Mas dizem mais: se essa manobra pode ser facilmente aplicável nos bens de menor valor, mas de consumo corrente, já o mesmo não acontecerá nos artigos mais caros, especialmente nos artigos de luxo, onde a descida, de facto, terá efeitos bem palpáveis. Um carro topo de gama, por exemplo, passará a custar menos um milhar de euros. E assim as «grandes medidas» do governo, como não podia deixar de ser, lá vão favorecer os do costume.

Ao mesmo tempo que isto se discutia e a barulheira do Euro à volta da selecção não deixava ouvir mais nada, o Governo aprovou um decreto-lei que define, como elemento mais relevante para uma indemnização por acidente de viação, o rendimento declarado, para efeitos fiscais, por parte do lesado. Conclusão: um pobretana qualquer sofre um acidente de viação, no qual não tem qualquer culpa, e recebe uma bagatela. Um acidente igual, com as mesmas consequências, sofrido por alguém de altos e repolhudos rendimentos, já lhe dá direito a uma indemnização muitas vezes superior à do pobre coitado. Se isto não é governar para os ricos – ou melhor: se isto não é governar contra os pobres – então vou ali e já venho. Na verdade, até nos mais ínfimos pormenores José Sócrates e a sua camarilha socialista mostram a sua verdadeira natureza de classe.

Percebendo isso – e sempre que pode – o «engenheiro» desdobra-se em inflamados discursos, garantindo que é ele, o seu partido e o seu governo que representam a verdadeira esquerda, aquela que se preocupa com as questões sociais e os mais desfavorecidos. Sem dúvida. A prová-lo nada melhor que os relatórios do Eurostat e do próprio Banco de Portugal, que provam, sem margem para quaisquer dúvidas, que os anos da governação socialista, com especial destaque para os negros anos socretianos, são aqueles onde aumenta o número de pobres, alastra a miséria e se alargam as desigualdades.

Outra frente de batalha, onde a manipulação atinge as raias da pouca-vergonha, é a da Educação. Sócrates enche a boca com palavrões como «modernidade», «competitividade», «excelência», e «rigor», mas os recentes exames nacionais provam que as provas foram elaboradas para permitir a passagem de todos – ou quase todos – com a única finalidade de dourar as estatísticas que serão apresentadas aos parceiros europeus, pondo de lado a necessidade de formar pessoas com méritos e conhecimentos, capazes de contribuírem para a construção de um país realmente moderno e competitivo. É a política do facilitismo e do faz-de-conta a imperar sobre os reais interesses nacionais.

Ao mesmo tempo, as universidades públicas estão sem dinheiro para pagar os salários de professores e funcionários, a tal ponto que a Universidade de Aveiro revelou que foi obrigada a desviar fundos destinados à investigação – cerca de três milhões de euros – para garantir o pagamento de salários ao seu pessoal. Mas compreende-se. Que se lixe o ensino público, se o ensino privado é que é bom, pois aí formam-se engenheiros em três tempos, que até podem fazer as provas de Inglês Técnico em casa, e enviá-las por fax ao cuidado do amigo reitor.

Na agricultura, as coisas não vão melhor. Toda ela agoniza. O país desertifica-se e, cada vez mais, se faz uma agricultura de mera subsistência. Lembro-me que, há dias, o incrível ministro da Agricultura garantia que uma doença que afecta o pinheiro, provocada por um organismo chamado nemátodo, estava perfeitamente controlada. A verdade é que, dois meses depois, poderá ser todo o pinhal português que está em risco, a tal ponto que todo o país foi agora declarado área de risco.

Em termos de segurança, nada melhorou. A Ordem dos Médicos manifestou-se contra a insegurança que afecta centros de saúde e hospitais, onde as empresas de privadas substituem a PSP que, especialmente nas urgências, garantia alguma ordem e respeito. É a política dos cortes orçamentais a impor as suas regras, sem querer saber dos custos sociais e, consequentemente, dos custos económicos que essa ilusão de poupança depois acarreta. Mas que fazer, se até nos tribunais já um qualquer traficante de droga pode agredir à lambada e ao pontapé o juiz que o condenou? A Casa da Justiça está transformada num circo, numa paródia, numa coisa sem crédito, onde nem sequer o medo existe, depois do respeito ter ido à viola.

No meio desta lixeira verdadeiramente digna do chamado Terceiro Mundo, continua a insistir-se no novo aeroporto e no TGV, obras necessárias, principalmente, para encher os bolsos de alguns com luvas, comissões e outras suculentas gratificações. Na verdade, o TGV apenas reduzirá em 30 minutos a viagem entre Lisboa e o Porto, pelo que num pequeno país, como o nosso, a obra se torna verdadeiramente supérflua, para não dizer: ridícula.

Quem viajar, por exemplo, pelos países nórdicos, bem pode procurar um TGV, que não o encontrará, pois aí governa-se tendo em vista apenas os interesses nacionais. Por isso, eles são países desenvolvidos e nós, caros amigos, não passamos de uns saloios a quem um engenheiro de trazer por casa mete no bolso, como se fôssemos um diploma passado ao domingo.

Três notas sobre a situação internacional.

Os EUA e Israel voltam a ameaçar o Irão. O cheiro do petróleo continua a excitar a pituitária dos senhores da guerra, insaciáveis na sua desvairada caminhada de controlo planetário. Não sei se o Irão quer ter armas nucleares ou se, apenas, pretende usar a energia nuclear para fins energéticos. Sei – isso sim – que o Irão, tal como Israel, China, França, Índia, Paquistão ou os EUA, também pode dispor de armamento nuclear. Embora eu ache que ninguém, em boa verdade, o deveria ter.

Mugabe. Parece que o homem não é um democrata. Pelo menos, é o que toda a gente diz. Também não sei se o líder da oposição seja flor que se cheire. Na verdade – e isso é o que me importa – há ditadores maus e ditadores bons. Já alguém ouviu falar, por exemplo, de eleições na Arábia Saudita? Que direitos têm lá as mulheres? Quanto partidos existem? Há liberdade de expressão? O que se faz a quem afrontar o poder?

Então, qual a diferencia entre Mugabe e os xeques das Arábias. A cor? O dinheiro? O petróleo? As amizades? A subserviência aos brancos? Ou a promiscuidade com a rapinagem internacional, com sede em Washington e sucursal em Bruxelas? Responda quem souber.

Tratado de Lisboa. Depois da Irlanda, foi a Polónia a deitar uma pazada de terra sobre o Tratado de Lisboa. Paz à sua alma.

Porreiro, pá!
Porreiríssimo!


Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 02/07/2008.
(Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).

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