NOVO ENDEREÇO
Já lá vão quase 4 anos que iniciámos a publicação destas crónicas, a maior parte delas da autoria do João Carlos Pereira, intercaladas, não tão assiduamente como as dele, por outras de Fidel Castro Ruz e alguns modestos apontamentos de mim próprio.
Sentindo a necessidade de mudar para uma outra forma de publicação que nos possibilite utilizar novas ferramentas, estamos agora num outro endereço onde os leitores poderão, como sempre, rebater ou provocar também.
As “CRÓNICAS DO GUIA” passaram para "PROVOCAÇÕES" em: http://cronicasdoseixal.blogspot.com
FREEPORTES HÁ MUITOS, SEUS PALERMAS!
Um grupo de 23 alemães endinheirados propôs que as pessoas com um rendimento anual superior a 500 mil euros paguem, neste e no próximo ano, um imposto extra de 5%. Não é grande oferta, especialmente porque limitada no tempo, mas vai, apesar disso, em sentido contrário ao que os patos-bravos cá do sítio defendem. Realmente, por aqui é precisamente o inverso: de Vítor Constâncio a Belmiro de Azevedo, de Silva Lopes a Américo Amorim, de qualquer ex-ministro das finanças ao presidente das associações patronais, um tal Francisco van Zeller, todos defendem, com a concordância operacional do governo, a manutenção dos seus privilégios, e que paguem a crise aqueles que trabalham. Acima de tudo, defendem a contenção – ou, até, a redução – salarial para a generalidade dos trabalhadores, salvo para eles próprios e para as suas respectivas seitas. A recente tentativa, atrapalhadamente sustida, de os administradores glutões do Banco de Portugal se voltarem a aumentar, é prova dessa mentalidade imoral. Posso garantir, com a autoridade que a minha experiência de vida me dá, a par da excelente memória que tenho, que neste regime – de democrata e republicano enganosamente chamado – tal como no regime anterior, de Salazar e Marcelo, se pensa e se age, em termos de políticas económicas e sociais, exactamente da mesma maneira. Nesse aspecto, como em quase todos os outros, nada mudou. Ou melhor. Tudo está a voltar, aceleradamente, ao mesmo. E se quisesse acrescentar que hoje se fecham escolas e serviços de saúde onde antigamente se abriam, poderia fazê-lo sem correr o risco de me chamarem aldrabão ou coisa pior. Digo – repetindo o que tenho dito noutras ocasiões – que nada distingue, em termos de governação da coisa pública, estes democratas dos outros ditadores. Sempre se pediram sacrifícios ao povo, fosse por causa da crise existente, fosse para pagar os custos de uma crise passada, fosse para evitar uma crise futura. Uma receita velha e gasta, mas sempre eficazmente mantida e aplicada, seja pela força do bastão, seja pela manipulação habilidosa das consciências, seja por acéfalas submissões partidárias. Vivemos perdidos no meio de um círculo vicioso que urge romper, se queremos, como é próprio de uma verdadeira democracia e de um regime republicano, ser donos do nosso próprio destino. Devemos perceber que não é só pelo voto que lá vamos. É pela intervenção cívica e cidadã, é pela afirmação pública e permanente dos nossos direitos e garantias, é pela exigência da aplicação prática e efectiva das disposições constitucionais, é pela indignação publicamente manifestada, é pela denúncia dos desmandos praticados a todos os níveis do poder, é pela capacidade de afrontarmos, de todas as formas, um sistema onde se encavalitou uma corja de oportunistas, corruptos, parasitas e outros estafermos, todos agarrados às tetas de uma porca, que outra coisa já não é a política dos nossos tempos. O que estou a dizer é que o poder político, nos dias que correm, está tão distanciado das populações – e contra elas tão virado – como o estava antes do 25 de Abril. Do alto do seu poder, conferido pelo voto, os políticos não cuidam de servir as populações, mas de manter o cargo e, através dele, servirem-se, servirem a força política em que se estribaram (para não perderem a confiança política), cuidarem do seu futuro e, periodicamente, em épocas que antecedem os períodos eleitorais, tratarem de descer até à ralé, sem gravata e com ar desportivo, para impingirem as mesmas tretas que impingiram há quatro anos atrás. E toca a andar, que já enganámos mais estes… Na maior parte dos casos – porque há, aqui ou ali, honrosas excepções – suas excelências incharam com o poder recebido e já se imaginam seres soberanos e inquestionáveis. Porque podem decidir, utilizam os cargos para distribuir benesses nos colos convenientes, compram cumplicidades, traficam influências, subornam e corrompem. As populações e os seus interesses deixaram de ser uma preocupação, mas apenas um pretexto e um meio para se decidirem negócios e negociatas, onde os diferentes clãs se amanham e sequiosamente se abastecem. E para melhor o fazerem – e só por isso – se acotovelam e insultam. Há dias, pessoa amiga perguntava-me se eu não estranhava que num escândalo tão grande, como é o caso do Freeport, os partidos políticos se mantivessem tão discretos, tão cautelosos, tão pouco agressivos e exigentes na descoberta da verdade. Respondi-lhe que não, que não estranhava. No fundo, em maior ou menor escala, Freeportes é o que por aí mais há. Nenhum, que se saiba, com tão grandes dimensões como o de Alcochete, mas tudo é negociável e sujeito a um convite à lubrificação de uns quanto por cento. Do mero estaleiro de construção civil, permitido em terreno agrícola, ao famoso empreendimento inglês, passando por grandes urbanizações, em tudo se estabelece um toma-lá-dá-cá desavergonhado, onde, em boa verdade, se esbatem as diferenças ideológicas, os valores a ética e a honra. Como referi na crónica anterior, passam-se coisas, em Portugal (sem que ninguém se demita, seja demitido ou vá preso), que têm, em qualquer país da Europa, consequências bem diferentes. Dois exemplos: O primeiro-ministro belga, Yves Leterme, propôs, em 19 de Dezembro do ano passado, a demissão de todo o Governo, na sequência de acusações de alegadas (alegadas, note-se!) pressões sobre a justiça. Leterme negou qualquer pressão sobre o poder judiciário, mas admitiu ter feito «contactos»; Michael Martin, presidente da Câmara dos Comuns, anunciou em 19 de Maio, a demissão, após acusações de alegadamente (alegadamente, também, note-se) ter consentido alegados (só alegados) abusos nas despesas de representação de alguns deputados; e dois membros da Câmara dos Lordes foram suspensos por, alegadamente (só alegadamente, volte a notar-se), terem aceitado dinheiro para votar projectos de lei. Nenhum deles tinha sido (note-se de novo) condenado por sentença transitada em julgado, e mesmo assim (abra-se a boca de pasmo), tiraram consequências políticas de alegações fundamentadas que os visavam. Então e aquela coisa da “presunção de inocência”, que, cá no burgo, é tão útil – e utilizada? Serão as democracias belga e inglesa que têm muito a aprender com a nossa, ou falta-lhes comer, como dizia o outro, muita papa Maizena para chegarem aos calcanhares da democracia portuguesa? José Saramago escreveu, há dias, que a explicação para o facto de Berlusconi estar no poder, é porque metade de Itália é como ele, e a outra metade gostaria de ser. Pergunto eu: será que os portugueses já são todos como Sócrates? Eu não sou. E você? Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 27/05/2009. (Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).
SE…
Se o Apito Dourado fosse em Itália, Pinto da Costa estava preso e o F. C. do Porto teria baixado de divisão. Se o caso Freeport fosse em Inglaterra, Sócrates estaria a contas com a Justiça e, naturalmente, já não seria primeiro-ministro. E, antes de mais, não haveria uma dama, reconhecidamente conotada com o partido metido na embrulhada, a coordenar todo a investigação. Porque a mulher de César… etc. e tal. Se Lopes da Mota fosse francês, já não seria presidente do Eurojust e estaria entregue ao poder judicial. Aliás, depois do caso de Felgueiras, em que foi suspeito de ter avisado a dona Fátima da eminência da prisão, nem presidente do Eurojust teria sido. Se Armando Vara fosse alemão, nunca teria sido ministro e se, por estranho acaso, o tivesse sido, logo após o escabroso caso da Fundação para a Prevenção e Segurança, de inquérito judicial não se livrava. Seguramente, não voltaria à Caixa Geral de Depósitos como director, para logo passar a administrador, ele que era um simples caixa numa remota agência da instituição, quando enveredou pela carreira política, sabendo escolher os colos certos. O de Sócrates foi um deles. Por isso, o sujeito é, nos dias que correm, administrador do principal banco privado português. De onde eu retiraria logo o meu dinheiro, caso o houvesse lá depositado. Se o caso da licenciatura de Sócrates fosse em Espanha, a coisa não teria morrido à nascença e, garantidamente, a Espanha teria mudado de primeiro-ministro. E a universidade (se àquilo se podia chamar uma universidade…) teria de explicar como licenciou tanto rapaz do PS (Vara, também, por acaso), sem que eles tivessem sido vistos a frequentar normalmente as aulas. Se o caso dos paquetes alugados para servirem de hotel durante a Expo’98 fosse na Holanda, não estaria em águas de bacalhau. Se o caso das trafulhices com aterro sanitário da Cova da Beira – e onde o nome de Sócrates aparece mais uma vez mencionado – fosse na Irlanda, já estaria muita gente presa. Se o caso da Casa Pia fosse na Bélgica, quem mais estaria no banco dos réus? Se o problema dos licenciamentos fantasmas dos projectos assinados por Sócrates, enquanto técnico autárquico, fosse no Luxemburgo, não teriam sido transformado num monte de anedotas sobre a piroseira projectada, mas seria um autêntico caso de polícia. Se a farsa do computador Magalhães – e, principalmente, o modo como a sua caricata produção e posterior comercialização foram entregues à rapaziada da família (que até estava a contas com o fisco) – fosse na Áustria, já não havia Magalhães, nem empresa fornecedora, nem governo, nem, consequentemente… tantos erros de ortografia a deseducar as crianças. Se a serra da Arrábida não tivesse a infelicidade de ser em Portugal, não estaria a ser corroída pelas pedreiras nem a ser envenenada pela teimosia psicopata de um governante – Sócrates, ele mesmo – que garantiu a toda a Europa que a co-incineração nunca seria… no Parque Natural da Arrábida. E já se saberia em quanto as cimenteiras contribuíram para certas campanhas eleitorais… Se todos os presidentes de câmara fossem obrigados a explicar – e a provar – como aumentaram o seu património, desde que assumiram os destinos dos seus concelhos – e a fazer fé naquilo que tem sido divulgado e, principalmente, por aquilo que ainda falta divulgar… – mais de metade deles prestaria contas à Justiça e teria o fisco à perna. Se alguém se lembrar de comparar a carreira de dois profissionais, em iguais circunstâncias, sendo que um enveredou pela carreira política e outro se manteve na sua profissão, como explicará que, ao fim de alguns anos, o primeiro, caso tenha sido deputado, ministro ou mero presidente de câmara, apresente um património e quadro de rendimentos infinitamente superior àquele que se manteve na profissão? Se um dia, em qualquer país da Europa, um ministro da Justiça parisse leis que deixassem o país entregue à bicharada, apenas para salvar os criminosos de colarinho branco que por aí proliferam – bem lavados, de resto, nas suas cascatas de offshores – e atenuar, ao mesmo tempo, os crimes do bando de pedófilos que estão a braços com a lei, certamente que logo deixaria de ser ministro, porque, naturalmente, o governo deixaria de ser governo. Se em qualquer país da Europa se pagasse imposto sobre os rendimentos de trabalho, mais IVA sobre tudo o que se compra, mais um imposto sobre o lixo, outro sobre os esgotos, ainda outro sobre as infra-estruturas urbanísticas, um outro sobre a casa que se comprou, mais outro disfarçado de contribuição para o audiovisual, mais outro ainda vestido de taxa de exploração para a DGGE (que sabe-se lá o que será), mais taxas moderadoras quando se vai aos serviços públicos de saúde, mais propinas quando se quer estudar, mais portagens em tudo o que for parecido com uma auto-estrada, mais transportes públicos caros e maus, bem, se tudo isto acontecesse em qualquer país desta Europa connosco, já teria acontecido por lá algo semelhante a uma nova Revolução Francesa. Ou ainda melhor. Se… se… se… E se não fôssemos um triste e sebento rebanho de carneiros, o que é que gostaríamos de ser? Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 20/05/2009. (Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).
CRIMES E CRIMINOSOS
Costumo utilizar, com frequência, um pensamento engraçado, que adquiri já nem sei onde, nem quando: diz ele, o pensamento, que um pessimista é, apenas, um optimista bem informado. Adaptando isso à nossa realidade, conclui-se que uma pessoa lúcida e atenta aos dias que correm, não pode, de forma alguma, ser optimista. Aviso já as mentes perversas que não estou a falar em derrotismo, mas a apelar ao realismo. Ou seja: vêm aí tempos ainda piores. Olhando à minha volta – e centrando-me, apenas, na realidade que nos envolve – percebo que a crise veio para ficar. Não porque a crise seja uma coisa com vontade própria, um instrumento divino para castigar os homens, ou uma consequência de forças naturais. Claro que não. A crise explica-se pela intervenção dos homens. E, neste mundo, os homens que fazem, refazem e desfazem as crises são aqueles que têm poder para isso. O poder de fazer leis, o poder de mandar na economia, enfim, o poder de decisão sobre a vida de milhões e milhões de pessoas. Porque não vale a penas falarmos da crise global, falemos da crise que nos afecta, já que ela tem, em si própria, todos os ingredientes da crise mundial. Li, no sítio da Internet www.resistir.info, sob o título PAÍS A SAQUE E A CAMINHO DA RUÍNA, que «a depressão económica que agora se inicia no mundo capitalista, pode ser agravada ou amenizada pelas políticas dos governos nacionais. No caso português, o governo do senhor Sócrates, parece apostado em agravá-la ao máximo. Fecham empresas todas as semanas, aumenta o desemprego, os défices tornam-se assustadores, a dívida externa agrava-se a níveis monstruosos, mas ele permanece impávido nos seus projectos ruinosos – como o novo aeroporto, TGV, terceira ponte sobre o Tejo, o super-hospital de Todos os Santos, etc, etc. Enquanto isso, as universidades vivem à míngua, maternidades e centros de saúde são encerrados, as pensões de reforma são uma miséria, a repartição do rendimento é a pior de todos os países da Europa (a do Leste inclusive). O custo do novo aeroporto está agora orçamentado em 5 mil milhões de euros. E, como toda a gente sabe, os orçamentos têm o hábito de fazer derrapagens da ordem dos 40, 50 ou mais por cento. Ao mesmo tempo, este governo autista e de lesa economia nacional ignora deliberadamente a realidade do Pico Petrolífero. Como se os preços momentaneamente baixos do barril – devido, em parte, à recessão económica – pudessem perdurar para sempre (o banqueiro M. Simmons prevê uma alta significativa dentro de seis a nove meses). E mesmo com os actuais preços baixos do barril, a TAP acaba de anunciar que foi obrigada a cancelar 2400 voos no 2.º semestre de 2009. Hoje, até mesmo altos dirigentes de companhias de petróleo recomendam "poupar, poupar, poupar" . Mas os governos, ao serviço dos grandes empreiteiros, fazem orelhas moucas. Quem porá cobro a isto?», pergunta o autor do texto. A única resposta que me ocorre é esta: só nós podemos pôr cobro a isto. Nós, a maioria, os nove milhões e muitas centenas de milhares que nos deixamos governar assim. É preciso recuperar a ideia democrática de que não são as pessoas que deverão estar ao serviço dos partidos, dos políticos, dos empresários e da economia, mas precisamente o contrário. Não podemos consentir que meia dúzia de senhores, encaixados nos partidos políticos – onde fazem carreiras de luxo – ou grandes empresários, surripiadores e sanguessugas – que vivem como nababos à nossa custa – decidam do nosso destino, como se isso fosse uma telúrica e inevitável fatalidade. Esta sociedade, dita democrática, está montada ao contrário. Compete-nos, a nós, endireitá-la. Como reflexo deste estado de coisas, tudo se esboroa e estratifica. Perdem-se os valores, institui-se a lei da selva, recorre-se ao salve-se quem puder. É uma espécie de cada um por si… e tudo ao monte. Neste ambiente degradado e degradante, surgem fenómenos como aqueles de que Setúbal, nos dias que correm, é um triste exemplo. Embora eu não seja dos que alinham na tese de que tudo radica em causas sociais, desculpabilizando os criminosos e ignorando que é no temperamento de cada um que se encontram as principais explicações para se enveredar – ou não – pelos caminhos do crime, não posso deixar de reconhecer que as grandes injustiças sociais de que somos vítimas – todos, e não só os ladrões e assassinos – escancaram as portas à criminalidade e oferecem-lhe estímulos e justificações para soltarem os seus instintos e má formação. Uma sociedade justa, equilibrada, límpida e rigorosa não é terreno fértil para a bagunça que por aí alastra. Ao invés, uma sociedade onde as desigualdades sociais todos os dias se acentuam, crescendo, em pólos opostos, os condomínios de luxo e os guetos como os de Setúbal, e os senhores do mando não são pessoas imaculadas nem, sequer, respeitáveis, essa sociedade propicia toda a série de desmandos a que hoje assistimos. Mas recordo, principalmente aos peregrinos da desculpabilização, que as mesmas causas não produzem os mesmos efeitos em todas as pessoas. Se assim fosse, em vez de duzentos ou trezentos marginais, praticamente todo o bairro da Bela Vista seria um coito de criminosos, o que não é verdade. Mas já é verdade que, numa mesma família, sujeita às mesmas dificuldades, haja gente de bem e gente de mal. No fundo, o temperamento, que é inato em cada um de nós, determina o nosso comportamento. As circunstâncias, depois, fazem o resto. Aqui chegados, vão-me perguntar, afinal, como penso que a sociedade deve lidar com a chamada marginalidade. Só tenho uma resposta: sem dó nem piedade. Mas note-se uma coisa importante: eu não limito o conceito de marginalidade aos casos que conhecemos dos bairros ditos problemáticos, como os da Bela Vista ou Cova da Moura. Criminosos não são, apenas, os assaltantes de bancos, de carrinhas de valores ou de tabaco, de ourivesarias ou supermercados. Os javardos do carjacking não são mais javardos do que aqueles que assaltam os bancos a partir dos respectivos conselhos de administração, ou os políticos corruptos, que arrecadam milhões à conta das obras públicas e respectivas derrapagens, ou para facilitar este ou aquele empreendimento. Um pedófilo repugnante não é apenas o que se chama Bibi, mas também o senhor doutor que tem assento em importantes cadeirões cá da lixeira, e que recebia, num dos seus apartamentos, «sobrinhos» e «afilhados» aos magotes. Crime de peculato não o pratica só aquele que, à margem da lei, se aproveita de dinheiros públicos confiados à sua guarda, mas também – e principalmente – aqueles que, podendo produzir as leis, as fazem para, por caminhos transformados em legais, do mesmo dinheiro público se aproveitarem e dele se encherem. Por isso, aqui o digo sem medo ou hesitação: para todos os criminosos, de colarinho preto, enxovalhado ou branco, a mão pesada e severa da lei, com todo o seu rigor. E já que estamos com a mão na massa: o inquérito requerido pelo Conselho Superior do Ministério Público concluiu que o presidente do Eurojust, o socialista e amigo de Sócrates, Lopes da Mota, pressionou mesmo os procuradores que investigam o caso Freeport. E, por hoje, já chega de crimes e criminosos. E javardices semelhantes. Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 13/05/2009. (Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).
OS MILAGRES DO SANTO CONTESTÁVEL
Nos últimos dias, dois factos mereceram particular destaque nos órgãos de comunicação social. O primeiro facto, foi a promoção, de beato a santo, de D. Nuno Álvares Pereira, já há muito chamado de Santo Condestável. Não sei se D. Nuno foi santo – ou se apenas agora o é. Confesso que não me interessa. Não são contas do meu rosário – que, por acaso, nem tenho. Que se divirtam muito todos os santos, mais suas santidades, no seu etéreo e improvável reino dos céus. E passem muito bem. Descendo à terra, onde a fome e a guerra dão cartas (até parecendo que, lá nas alturas, andam deuses e santos muito distraídos), lembrei-me que, por cá, nos dias que correm, voltámos a ter um santo em actividade: D. Sócrates, também designado, pelo povo mendicante, como o Santo Contestável. Como o povo, apesar da míngua, é sempre um grande poeta, já há por aí quem rime contestável com detestável, irritável, comprável, execrável e, finalmente, descartável. E está tudo a ser muito amável… Este santo, de cujas virtudes nenhum capitalista descrê, tem produzido por aí milagres de pasmar. Um deles, foi fazer desaparecer mais de 250 mil postos de trabalho. Cem mil que desapareceram desde que subiu ao altar, e mais 150 mil que prometeu criar e ninguém sabe onde estão. Outro milagre digno de registo, foi licenciar-se em engenharia sem que ninguém soubesse como nem porquê, mas o mais provável é ter sido fecundado pelo Espírito Santo com todo o saber necessário, razão pela qual até o diploma foi passado ao domingo, dia santo por natureza. Tão santo é, que transforma os nossos impostos em dádivas aos bancos falidos e fez de um ignorante campónio, ex-caixa bancário, administrador do maior banco privado português. Mas os milagres não se ficam por aqui. Há tempos, conseguiu salvar da ruína uma empresa falida e a contas com o fisco, bastando, para tal que, por inspiração divina – por si, naturalmente, canalizada – os seus confrades vestissem de azul celeste um pequeno computador da Intel, e lhe chamassem Magalhães. Aparvalhado – ou seja: maravilhado – Portugal abriu os olhos de espanto e engoliu a caixa azul sem pestanejar. E ninguém foi preso. Por milagre também, certamente. Famosos são, também, os milagres da Cova da Beira, onde o negócio do ambiente floresce, enquanto o ambiente, propriamente dito, falece. Ligado a estes milagres está um outro, que impede os tribunais de decidirem sobre as multiplicações das contas bancárias que (tal como Cristo fez com os pães) surgem gordas e repolhudas, não se sabe de onde. Mas talvez o milagre maior seja o já famoso milagre de Alcochete, que transformou uma zona natural protegida num brilhante espaço comercial, e tudo enquanto o Diabo (salvo seja, cruzes, te arrenego, que estamos a falar de obra do Senhor e dos seus santos!) esfregava um olho. A par deste milagre, anda por aí um outro, ainda a ser investigado pelas autoridades, que se prende com o desaparecimento de 4 milhões de euros, que levaram sumiço mal caíram na caixa das esmolas. E aqui estamos nós, como outrora, nas mãos de um santo, como o foram o Condestável e os dois Antónios, o que dava cabo das bilhas das moças, ali para os lados da Sé, e o outro, o santo António da Calçada, que dava cabo do coiro a quem não lesse pela sua cartilha. Segundo facto: Veio agora São Sócrates, o Contestável – ou, se preferirem, o Detestável – insurgir-se contra o facto de a GCTP e o PCP não pedirem desculpas pelo facto de uns quantos infiéis terem insultado um seu beato, de nome Vital, que apareceu no Martim Moniz para ali abençoar os que, no dia 1.º de Maio, se manifestavam contra o governo. Parece não saber o Contestável e Detestável homem, que Vital desertou, um dia, do lado daqueles a quem queria agora abençoar, traindo e renegando os valores e ideais que jurava, então, a pés juntos serem os seus. Há quem diga que, em boa verdade, não era uma questão de ideais, mas de lugar no varandim, supondo-se, já então, com direito a sentar-se à direita daquele a quem ambicionava, em breve, substituir. Seja como for, Vital pôs-se a jeito para o martírio, com aquela malícia beata que tem pouco de santo e muito de perverso. Afinal, um lugarzinho no altar europeu, com esmolas fartas e sinecuras convenientes, sempre valia o risco. Ao fim e ao cabo, o beato Vital prestou-se, para agradar ao Santo Contestável, a fazer o mesmo que um membro da Juve Leo faria se fosse, equipado a rigor, meter-se no meio da rapaziada dos No Name Boys, ou vice-versa. Por isso, de desculpas não precisa, mas, apenas, que lhe reconheçam o frete, ali na Santa Sé do Largo do Rato. Há que beijar os pés a quem nos dá a mão. Sobre desculpas, andam por aí umas vozes, nada santas, a resmungar blasfémias contra o Detestável e, cada vez mais, Contestável santo, porque ele não só não cumpriu um sem fim de promessas, como ainda lhes retirou aquilo que tinham nos seus parcos baús. Muitos oraram, há quase quatro anos, no altar de São Sócrates, e hoje estão desempregados, ou em vias disso. Outros, perderam a casa, porque deixaram de a poder pagar. Outros, não conseguem, sequer, arranjar um emprego. Outros, querem ter filhos, mas têm medo da vida, do amanhã. Outros, eram remediados e, hoje em dia, são pobres. As grávidas começaram a parir nas bermas das estradas, nas macas das ambulâncias ou no chão da garagem; outras, vão parir a Espanha. Os doentes morrem às portas de urgências encerradas. Há crianças que palmilham quilómetros até à escola, onde as esperam horas de frio ou calor abrasador, conforme o tempo que faz. Há quem não avie o medicamento necessário, porque a pensão não chega para esses luxos. Entretanto, a Ordem do Santo Execrável nada em abastança e nada falta aos seus acólitos. Por isso, o rebanho começa a balir protestos ou, no caso dos mais beatos, a engolir em seco. Falta a erva no pasto, mas os membros da Ordem enfardam como gente grande. Quem nos pede desculpas pelo desemprego e pela penúria? E pelos despejos? E por todas as aflições que antes não havia e agora há? E por muitos terem acreditado no santo e, com as suas orações, o terem colocado no pedestal? Quem nos pede desculpas por todos os embustes dos últimos quatro anos? E por tantos sermões enganosos? Não sou homem de religiões. Por isso, não sou homem de orações. Mas sou um homem de fé. Acredito que as pessoas, as sociedades, têm a capacidade de construir um mundo à medida das suas aspirações e desejos. Basta, para tanto, que se libertem dos que os condicionam e instituem paradigmas que aprisionam mais do que prisões. Que não dêem o poder a quem não está do seu lado. Esta é, como todas as outras, uma crónica de esperança num futuro sem crápulas, sem corruptos, sem oportunistas. Sem intrujões. É dizer, à minha maneira, que «O que faz falta é avisar a malta!». Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 06/05/2009. (Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).
FASCISMO COM ADOÇANTE
Na semana passada, discutimos aqui o 25 de Abril. Gosto do confronto de ideias, das opiniões diferentes, da defesa de pontos de vista antagónicos. Costuma dizer-se que da discussão nasce a luz, e é bem verdade. O que é preciso é que, nessas discussões, apenas participem pessoas sérias e bem intencionadas, como foi, aliás, o caso. Quando assim é, bendita discussão. Como se lembram, o que estava em causa não era o 25 de Abril e a sua essência, mas o facto de eu dizer que, embora compreendendo as razões das comemorações e dos festejos, não participava neles por considerar que o que resta do 25 de Abril é o direito de votar e alguma liberdade de expressão. E disse que o direito ao voto e a liberdade de expressão ainda existentes, só existem porque não é conveniente, para o poder económico e para o poder político, mancomunados, acabarem com isso. Mas que bem gostariam de o fazer. E disse mais: disse que não hesitarão em limitar ou anular esses direitos quando sentirem que eles poderão pôr em causa o actual estado de coisas, isto é: colocar a economia ao serviço das pessoas. Disse-o há uma semana, como já o tinha dito há cinco anos. Assim sendo – e no que a mim respeita – não alinho nos foguetórios, pois o meu espírito – o espírito de quem viveu de corpo inteiro o dia 25 de Abril de 1974 e os tempo de esperança que se lhe seguiram – apenas sente o luto pelo que se perdeu e a necessidade de luta contra este fascismo com adoçante que nos governa. E, meus amigos, porque também me recuso a viver de saudades, daqui não saio. Não saio, também, por um outro motivo. Já pensaram que os portugueses com menos de 45 anos nada sabem do que representou o 25 de Abril, nem o que foi o regime anterior? Que pensarão eles – que vivem numa democracia falsificada, com contratos a prazo, com desemprego, com salários insuficientes, com a corrupção e a fraude a olear as altas esferas do poder económico e do poder político, com uma Justiça que protege os grandes e é implacável para os pequenos, com mais de dois milhões de portugueses a viver em níveis insustentáveis de pobreza, com fábricas a fechar todos os dias, pondo sem trabalho famílias inteiras – sim, o que pensarão eles que festejamos? Isto, ou o que foi, e eles nunca viveram? Ou o que, em boa verdade, nunca chegou a ser, por nunca ter passado de uma bela promessa, apenas em parte – e porque curto tempo – concretizada? Como posso eu festejar o 25 de Abril, quando os senhores da governação e do poder económico, tão ou mais descarados do que eram os seus equivalentes de antes do 25 de Abril, se enchem à conta do Estado, reservando para si grandes proveitos imediatos e futuros, mas retirando-os, em nome da crise, a mais de nove milhões de portugueses? Sabiam que o Instituto de Emprego e Formação Profissional divulgou os números do desemprego, e que, de acordo esses dados, o número de desempregados inscritos atingia, em Março de 2009, 484.131, tendo aumentado, entre Dezembro de 2008 e Março de 2009, 68.131, o que significa um aumento médio mensal de 22.709 desempregados? E que, se este ritmo de aumento mensal se mantiver, no fim de 2009, existirão inscritos nos Centros de Emprego mais 272.504 que, somados aos 416.005 que existiam em 1 de Janeiro de 2009, totalizarão 688.509? E que, mesmo aquele número – 484.131 – não corresponde à totalidade dos desempregados existentes no País? Faço minhas as palavras do economista Eugénio Rosa, que divulgou estes dados, e que afirmou que «o 25 de Abril não se coaduna com tanto desemprego e com a miséria e o medo que gera. Não foi para isso que se fez o 25 de Abril». A nossa sociedade actual, embora num patamar superior, está tão desigual e injusta como o era antes do 25 de Abril. O povo limita-se a votar – e cada vez menos, porque, com razão, não acredita nos políticos nem no sistema – e os que votam vão lá, na sua maioria, atrás de equívocas simpatias, por fidelidades absurdas, assim como quem apoio o seu clube de futebol. Os ministros falam de nada – ou só de coisas boas que mais ninguém vê – mas nenhum disse, nem o senhor ministro das Finanças, que no 1.º trimestre de 2009, só as receitas do IRS (e do Imposto Único de Circulação) é que cresceram. Isto significa que só a maioria dos portugueses é que continua a ser sangrada, porque os impostos sobre o trabalho por conta de outrem sobem sempre, enquanto os outros descem. Tal como acontecia nos tempos da ditadura, enquanto a fome alastra, as grandes empresas vêm os lucros subir em flecha. Veja-se o caso da Galp, que já foi entregue aos privados. Agitam-se bandeiras para dizer que os preços do gás pagos pelas famílias em Portugal vão descer, em média, 4,1% a partir de Junho de 2009, como isso representasse uma grande medida e também um grande benefício para os portugueses. Mas o que não se explica é a situação escandalosa que se verifica no mercado de gás em Portugal, pois as famílias portuguesas continuam a pagar preços muito superiores aos preços da União Europeia. Não há censura, diz-se por aí, mas (e volto a socorrer-me de Eugénio Rosa) «esconde-se dos portugueses que os preços do gás natural em Portugal, sem impostos, ou seja, aqueles preços que revertem na sua totalidade para as empresas, e que constituem a fonte dos seus lucros, que são pagos também pelas famílias portuguesas, eram muito superiores aos preços médios da União Europeia. E a diferença para mais oscila entre 49,2% e 53,5. Entretanto, o preço do gás natural no mercado internacional, entre 1 de Janeiro de 2008 e 15 de Abril de 2009, passou de 22,96 euros por megawatt-hora para apenas 11,24 euros por megawatt-hora, ou seja, para cerca de metade». Isto é: ao anunciar, com pompa e circunstância, uma redução média de apenas 4,1% nos preços do gás pagos pelas famílias portuguesas, quando os preços do gás, em Portugal, sem impostos – ou seja, à saída das empresas – são cerca de 49% superiores aos preços médios praticados na União Europeia, e quando, entre Janeiro de 2008 e Abril de 2009, o preço do gás no mercado internacional desceu 51%, o que se está a fazer, objectivamente, é satisfazer os interesses da GALP, dominada agora por grandes grupos estrangeiros (ENI, Sonangol) e portugueses (Amorim), que tem 90% do mercado de gás em Portugal, defendendo a manutenção dos seus elevados lucros. E isto torna-se mais escandaloso num altura de grave crise económica e quando as famílias portuguesas enfrentam dificuldades crescentes. Então, que democracia é esta, que assim espreme o pobre para encher o rico e, como faria qualquer regime fascista, esconde da população os dados que provam a sangria? Repito, então, a minha afirmação da semana passada: «convictamente vos digo que já nada distingue estes “democratas” dos outros ditadores.» Ou distingue. Um governante como Sócrates, com o seu passado e as suas trapalhadas, nunca seria ministro de Salazar. Nem, sequer, porteiro. E está tudo dito. Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 29/04/2009. (Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).
ABRIL DAS MÁGOAS MIL
Há cinco anos, precisamente no dia 22 de Abril de 2004, no editorial do jornal Outra Banda, que então dirigia, escrevi o seguinte texto: «Sou dos que não alinham no foguetório que saúda cada aniversário do 25 de Abril, embora compreenda, apesar de tudo, as boas intenções de quem o lança. Não consigo festejar Abril, quando o que dele resta é o voto e uma ilusória sensação de liberdade de expressão, no fundo pouco mais do que a estafada e quase inútil conversa de café. Não consigo festejar memórias ou vestígios. Do voto, não duvido que é, cada vez mais, a certidão de óbito da nossa cidadania, e que não serve para outra coisa que não seja a de legitimar as práticas políticas daqueles que, encaixados nos partidos do sistema, vão encontrando sucessivas maneiras – e desculpas – para extorquirem a mais de nove milhões de portugueses o necessário para que as grandes fortunas, filhas dos grandes negócios, continuem no mar de abastança em que já nadavam antes do 25 de Abril. E o resto é paisagem. Da liberdade de expressão, cada vez mais condicionada pela ressuscitada noção de que não é saudável afrontar os poderosos, restam desabafos limitados pelo sentido das conveniências, pois manter um emprego – ou consegui-lo – pode depender de sermos, ou não, pessoas dispostas a nos sujeitarmos à velha ordem natural das coisas. Em lugar da Censura, aí está, pujante, a auto-censura. Domesticados éramos, domesticados somos. Do voto, suspeite-se somente que vai pender para quem defende uma sociedade justa, onde todos tenham o direito – e a obrigação – de trabalhar e, pelo seu trabalho, receber a justa paga; e que ligado a isso, todos – todas as pessoas e todas as empresas – tenham perante o Estado as mesmas responsabilidades, direitos e deveres (incluindo os fiscais), de modo a que a todos seja garantido uma existência segura, digna e feliz, e logo veremos como o sacrossanto voto deixa de valer, e como a democracia logo se desmascara e se vê a ditadura que lhe está nas veias. Democracia, democracia, poder económico à parte. Da liberdade de expressão, imagine-se apenas que alguém conseguia ser um novo Messias e levar a esperança aos que a não têm, e, mais do que a esperança, a certeza de que, todos juntos, poderíamos construir um país novo, justo e solidário, e logo se veria como uma nova PIDE aí estaria para pregar na cruz o atrevido. No 25 de Abril que eu vivi, não cabiam a fome, nem o desemprego, nem as listas de espera, nem a opulência feita à custa da miséria alheia. No meu 25 de Abril, não há lugar para os políticos de carreira, com ordenados chorudos e reformas obscenas, profissionais do embuste e do oportunismo, parasitas de um povo que continua tão vampirizado como o era até há trinta anos. E quando o meu país se torna cúmplice activo de uma guerra colonial – de descarada pilhagem e sangrenta ocupação – convictamente vos digo que já nada distingue estes “democratas” dos outros ditadores.» Estas palavras, escrevi-as eu há cinco anos atrás, na edição número 333 do extinto Outra Banda. Hoje, nem uma palavra retiraria ao que então escrevi. Pelo contrário: várias outras, e bem piores, lhes poderei acrescentar. Com o «socialismo» de Sócrates e do PS, aumentou o desemprego, a precariedade de emprego é a regra, os salários em atraso são o pão nosso de cada dia, diminuíram as reformas, os salários perderam ainda mais poder de compra, aumentou a criminalidade, a corrupção é uma forma de vida e de governo, o Ensino conhece os seus piores dias após o 25 de Abril, a Saúde deixou de ser um direito (porque se transformou num negócio), as desigualdades sociais acentuaram-se, o número de pobres ultrapassa os dois milhões de há três anos, e a Justiça passou a ser uma anedota, onde o poder político mete o bedelho para o pressionar e controlar a seu bel-prazer. Fecham-se escolas às centenas, tal como maternidades e urgências hospitalares. Aumentam-se as taxas moderadoras e os medicamentos, mas reduz-se a lista dos que são comparticipados. O acesso fácil à Justiça é só para os ricos. A classe dominante, uma mistura promíscua de políticos e altos empresários, troca favores e interesses por cima e por debaixo da mesa, e a Justiça, forte e exigente para com a arraia-miúda, é completamente cega, surda, muda e paraplégica quando confrontada com a alta corrupção reinante. Obriga-se o povo a pagar os desfalques no sistema financeiro, onde se injectam milhões saídos dos nossos impostos, milhões que depois nos emprestam com juros de verdadeiros agiotas. A economia está entregue à lógica do regateio e da especulação, e a estes interesses se curvam os legisladores e o aparelho do Estado. A administração pública está enxameada pelos amigos, familiares e esbirros da facção de momento no poder, e aí se conseguem, sem custo, vantagens e mordomias para o resto da vida. E enquanto se obriga os portugueses a apertarem o cinto, continua a apoiar-se o esforço de guerra do imperialismo, enviando tropas para qualquer parte do mundo que nos seja apontado. O Iraque de hoje é uma ruína, comparado com o Iraque próspero de Saddam, e o seu petróleo é sugado directamente para as grandes petrolíferas ocidentais, com as vénias dos governantes fantoches que os invasores lá colocaram. Nisto fomos – e continuamos a ser – cúmplices activos, servis e obrigados. Fechada no castelo do poder, a casta dominante – constituída pelo poder económico e a classe política, confundidos num só trono – governa o feudo como sempre fez: impondo à maioria restrições e sacrifícios dos quais a si própria se isenta. Se contra tudo isto se fez, com lágrimas de alegria e cravos de festa e esperança, o 25 de Abril, quem pode, em seu perfeito juízo, agora festejá-lo? Não! Este Abril que vivemos já não é de festa. É um Abril de mágoas mil. E, por isso mesmo, de luta e indignação. E de revolta. Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 22/04/2009. (Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).
PROFISSÃO: DEMOCRATA
O rapaz era um galdério, um piolhoso, uma coisa asquerosa, o desgosto permanente da família, uma das mais benquistas do Estado Novo. O Senhor Doutor bem gastava fortunas para meter o fedelho na ordem ou, pelo menos, dentro das aparências, mas o maldito não tinha amanho. Uma vez, veio o terrível recado, pior do que se da morte do fedelho se tratasse: O senhor inspector Barbieri telefonou e diz que tem muita urgência em dar-lhe uma palavrinha. Suando frio, o Senhor Doutor disse à secretária que adiasse a reunião do conselho de administração do banco, mandou vir o carro e ordenou ao motorista que seguisse para a António Maria Cardoso, que era mesmo ali, ao virar de duas esquinas. A notícia caiu, brutal, da boca fria e severa do pide: O seu rapaz, caro doutor, anda por maus caminhos. Péssimos, se mo permite. Sabemos que tem contactos, lá na universidade, com organizações subversivas, e só ao facto de ser filho de quem é se deve agradecer a circunstância de ainda não ter sido detido. Como é que vamos lidar com isto, meu amigo? O Senhor Doutor suou mais um bocadinho, enquanto mudava de cores. Primeiro, o pálido; depois, o vermelho, finalmente, o roxo. Não duvidava da eficácia da PIDE (na altura já alcunhada de DGS), é claro, mas não haveria ali qualquer confusão? Nenhuma, garantiu o outro, gélido. Olhe, senhor inspector, eu vou tomar medidas, eu vou fazer, por minhas mãos, aquilo que nem os senhores seriam capazes de fazer. O Senhor Doutor, na ocasião, não foi capaz de perceber o meio sorriso irónico do interlocutor, e lá continuou: Vou trazer-lho aqui e, com ele, tudo o que for necessário saber. Não é um favor que lhe faço. É o meu dever de português e patriota. É, também, a paga pela sua generosa amizade. E foi mais ou menos assim. O Zézito aguentou-se a um valente par de estaladas que, de surpresa, o progenitor lhe aplicou no focinho sebento, enquanto relinchava um catálogo inteiro de impropérios. E naquela mesma noite lá foi, pela paternal arreata, até à António Maria Cardoso, onde passou dois dias e duas noites numa das suas «salas de estar», naquilo que ele supôs ser uma terrível provação, mas que se resumiu a uma tosca encenação de um interrogatório e tortura, previamente combinada entre o progenitor e o inspector Barbieri. Quando se borrou todo, já no fim do segundo dia, estavam salvas a honra da família e a segurança do estado. Seguiu-se o desterro nos Estados Unidos, o aclarar das ideias, o perceber das vantagens de se pertencer a uma família que vivia numa casa-forte e paredes meias com o poder e, principalmente, a oportunidade de olhar a guerra colonial em curso como uma coisa distante, só para os outros, para os totós, para a escumalha. Depois, as americanas eram loucas por latinos, e abriam-lhe as pernas mais depressa do que abriam garrafas de coca-cola ou devoravam cachorros quentes… Já curado da sua doença esquerdista, o Zézito regressa a Portugal e vai para o banco do papá, o ainda Senhor Doutor, claro, onde tinha à sua espera, para começar, um cargo na direcção. É aí que acontece o 25 de Abril, coisa que o nosso rapaz encara com alguma tranquilidade, convencido de que não vai ser nada de grave, mas apenas o fim da época da «brigada do caruncho», que iria ceder o espaço aos jovens generais da finança. Bem lhe resmungava o pai que não, que a coisa fiava mais fino do que isso, mas foi algo de que só se convenceu em 14 de Março de 1975, após o golpe falhado de Spínola e a consequente nacionalização da banca. Aí, pregou o segundo susto (e desgosto) ao Senhor Doutor, filiando-se no PPD. O velho banqueiro considerava que todos os partidos eram à esquerda, uns mais, outros menos. E o Zézito lá foi andando, maria-vai-com-as-outras, mas sempre tendo o cuidado de espetar os dedinhos em «V» e gritar PPD! PPD! PPD! sempre que era preciso fazê-lo. Fosse por intuição, fosse porque pela primeira vez na vida teve um ataque de inteligência, um dia decidiu que não tinha futuro no partido de Sá Carneiro e, olhando em volta, percebeu que o Partido Socialista era mesmo o que lhe convinha. Perguntou ao pai o que pensava da sua ideia, esperando uma explosão do velho, sabida que era a sua aversão por tudo o que estivesse ligado ao regime saído do 25 de Abril e, principalmente, se fosse coisa chamada comunista, socialista, democrática ou popular. Curiosamente, o Senhor Doutor, em vez de explodir, sorriu e disse: Parece que começas a ter juízo, finalmente. Fazes bem, rapaz. Junta-te a esses, que vão ser mesmo esses a devolver-nos os bancos e o poder que tivemos. E lá foi o Zézito inscrever-se no PS. Ali, aprendeu o bê-á-bá da política, como utilizar os rins e os punhais, os venenos e os sorrisos, os meandros da linguagem que diz o que não diz, os reposteiros das intrigas, os corredores, os armários e as gavetas das traições mais rasteiras. Aprendeu a juntar-se à facção certa e, como prémio, foi colocado no conselho de gestão do banco que fora do papá, entretanto privatizado e entregue pelo PS a outro grupo económico. Mas não gostou do ambiente. Não havia o charme de outros tempos. Esgravatou e, passados uns meses, quando houve eleições para a Assembleia da República, arranjaram-lhe um lugar na lista do partido, uma coisinha cá para baixo. Devido às várias renúncias, ainda assentou o traseiro, cada vez mais arredondado, na bancada socialista, onde teve tempo e méritos para fazer ouvir os seus «bravos» a «apoiados» aos correligionários oradores. Daí para cá, meus amigos, o Zézito não parou. Foi director-geral, secretário de Estado, assessor, outra vez deputado, administrador em três ou quatro empresas (entre públicas e privadas), autarca, comentador e analista em estações de televisão, rádio e jornais. E por aí fora. Enfim, o costume. E foi um dia destes que o reencontrei, à saída da SIC. Fazendo-me de parvo, exclamei: Olha o Zé! Tás bom, pá? E dei-lhe um abraço, de surpresa. E ele, meio aparvalhado: Conheço-o? Sou o Pereira, pá, da faculdade, não te lembras? Pois és, disse ele, reconhecendo-me. O que é que fazes?, perguntou-me. Escrevo, puxo pela cabeça, remo contra a maré. E tu?, perguntei-lhe, como se dele nada soubesse. O tipo embatucou, sorriu, tentou perceber se eu estava a sério ou no gozo, mas eu mantive a pose. Sim, o que é que fazes? Ou não tens profissão?, insisti, rindo-me. A minha profissão? Olha, sou democrata, disse-me ele, com o ar mais sincero deste mundo. PS – Agora, façam-me o favor de não matar a cabeça a tentar ligar o nome – Zézito – a qualquer figura real. Estivemos no campo da ficção e, meus amigos, o Zézito é como os chapéus: há muitos! Francamente, nem sei como a nossa democracia consegue sustentar tantos Zézitos… Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 15/04/2009. (Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).
(SÓ)CRETINICES
José Sócrates, o político português no activo que mais trapalhadas carrega nas mochilas da sua vida pública e privada, apresentou uma queixa-crime contra João Miguel Tavares, do Diário de Notícias, porque o jornalista escreveu o seguinte: «Ver José Sócrates apelar à moral na política é tão convincente quanto a defesa da monogamia por parte da Cicciolina.» O ministro da Justiça, por seu lado, vai apresentar outra queixa-crime contra o semanário Sol, porque este periódico noticiou que ele, ministro, servira de intermediário entre Sócrates e Lopes da Mota, para que este avisasse os procuradores Vítor Magalhães e Pães de Faria dos riscos de não acabar rapidamente com o processo Freeport, deixando Sócrates em paz. Lopes da Mota, recorde-se, preside à entidade da UE que trata de assuntos judiciários. Mas recorde-se, principalmente, que foi colega de Sócrates nos tempos de Guterres e que foi suspeito – o caso acabou arquivado – de ter avisado Fátima Felgueiras da eminência da sua detenção, o que permitiu à senhora escapulir-se para o Brasil. Então, por estas duas amostras, já sabemos o que nos espera. Ou se deixa de lado a liberdade de imprensa, o direito de opinião mais o direito de informar, ou vai bater tudo com os ossos no banco dos réus. E se isso não der resultado, institui-se, a bem da nação, a censura e, se tal for necessário, a polícia política, que tratará de cortar o mal pela raiz. Aí estão, visíveis à vista desarmada, as tentações totalitárias do PS. E, diga-se a verdade, recursos humanos para constituir os novos quadros censórios e repressivos, não faltam aos socialistas. Que conviveu – e convive – com eles nos locais de trabalho, no movimento sindical, nas autarquias, seja onde for, logo percebe o que ali está em termos de estrutura mental e arcaboiço moral. Um manancial de bufos, uma mãe-d’água de sabujos, um viveiro de lambe-botas, um alfobre de gentalha capaz de vender a mãe a patacos, só para agradar ao chefe. De facto, a frase do jornalista que tanto incomodou José Sócrates é, em qualquer democracia, a coisa mais banal do mundo. Recordo, a propósito, o que disse um antigo presidente dos Estados Unidos, Harry Trumann: «Quem se dá mal com o calor, não trabalha na cozinha.» Ora Sócrates, um pimpão desenrascado, um finório de alto calibre, convenceu-se que o facto de ser primeiro-ministro e governar com maioria absoluta lhe confere o direito a ser intocável. Pelo contrário: quanto mais alto for o cargo, maior a exposição à crítica e ao referendar dos actos. Sócrates quer ter o privilégio de ser cozinheiro, mas não quer suportar o calor que está inerente ao cargo. Se assim é, só tem um caminho: desaparecer da cozinha. No entanto, é mais provável que se julgue Luís XIV, o Rei-Sol. Mas Luís XIV – e isto li eu em qualquer lado – apesar de ser, ou de se julgar, o Rei-Sol, tinha uma cadeira-retrete, da qual gostava muito. Uma manhã, já no fim do seu reinado, levantou-se da cama, sentou-se na cadeira-retrete… e desapareceu. Quero eu dizer com isto que Sócrates pode escolher: ou percebe que está a mais num regime democrático, e sai pelo seu pé; ou, um dia destes, desaparece sem querer, desfeito nas suas próprias fezes. (Esclareço, para o caso de ir malhar com os ossos no banco dos réus, que a linguagem metafórica aqui utilizada também desagradava aos coronéis da censura). Mas já que falei do ministro da Justiça, deixem-me contar-vos o seguinte: Alberto Costa fez parte do Governo de Macau, embora se tenha esquecido de mencionar isso no seu currículo. Talvez porque acabou demitido por José António Barreiros, por, precisamente, ter tentado influenciar um juiz. O despacho de demissão, da autoria de José António Barreiros, invocava isso mesmo, como fundamento para o demitir. O despacho, contudo, foi alterado por influência do então Governador Carlos Melancia (lembram-se da criatura?...), de modo a não beliscar a honorabilidade de Alberto Costa. Resultado: o senhor recorreu à Justiça, alegando que tinha sido demitido injustamente e sem fundamento. Ganhou e recebeu uma indemnização! Esta história foi toda contada por José António Barreiros em entrevista que deu, quando Alberto Costa foi nomeado ministro da Justiça, na qual ainda afirmou: «Escolheram para ministro quem eu não quis para Secretário». Neste quadro deprimente, as atenções voltam-se para Belém. Cavaco não pode ficar impávido e sereno a ver desaguar este esgoto sobre o regime, mesmo que o regime já esteja numa fossa há muito tempo. A tese da cabala já deu o que tinha a dar – e nunca deu muito, aliás – e todos os dias dados novos se acrescentam aos já sabidos. As pressões denunciadas por dois respeitados magistrados significam que chegámos ao vale-tudo. Por esse mundo fora, não é Sócrates que está em causa, mas o próprio país. Cavaco, ao não agir, está a deixar que se denigra o que resta da nossa imagem. Se é que resta ainda alguma coisa boa. Para azedar as coisas ainda mais para o lado de Sócrates, soube-se agora que a empresa da mãe do primeiro-ministro, que está a ser investigada no âmbito do Freeport, aparece também envolvida num processo de corrupção na Câmara da Amadora, com outras figuras de peso do PS. Os investigadores suspeitam que José Paulo Bernardo Pinto de Sousa, primo do primeiro-ministro, seja o parente que o arguido Charles Smith acusa de ter sido o receptor das «luvas» alegadamente entregues a Sócrates para conseguir o licenciamento do projecto de Alcochete. Ora, este José Paulo Bernardo está também referenciado no processo que corre no Departamento Central de Investigação e Acção Penal, onde se investigam indícios de tráfico de influências, corrupção, financiamento a partidos e branqueamento de capitais, e que tem como figura principal o actual presidente da Câmara da Amadora, Joaquim Raposo. Raposo é um dos vários suspeitos deste vasto processo, cuja investigação se tem arrastado, apesar de já terem sido constituídos oito arguidos. Em causa, soube o semanário SOL, estão os actos ilícitos praticados por uma rede de pessoas ligadas à Câmara da Amadora e a empresas de construção civil, e que envolve também elementos da Direcção Regional de Ambiente e Ordenamento do Território, a que presidiu Fernanda Vara. Curiosamente, esta arquitecta – uma das arguidas no processo da Amadora – integrou a comissão que deu parecer favorável ao Estudo de Impacto Ambiental que permitiu o licenciamento do projecto Freeport, em Alcochete. Nas buscas desencadeadas pela Polícia Judiciária, em 2004, às empresas suspeitas neste processo e a vários serviços da Câmara da Amadora, o computador do presidente, Joaquim Raposo, foi um dos que mais provas deu aos investigadores. Foi aqui, soube o SOL, que surgiu a referência à Mecaso – uma das empresas de Maria Adelaide Carvalho Monteiro, mãe de José Sócrates, e José Paulo Bernardo, o primo de quem agora se suspeita. Outra cabala? Outra campanha negra? Boquiaberto, o país assiste a isto tudo e considera que há mesmo duas justiças. Se só houvesse uma, Sócrates já teria sido constituído arguido, porque tudo isto é substancial e concreto demais para poder ser considerado uma invenção de inimigos políticos. Que a política está a meter a foice na seara da justiça, disso eu já não tenho a mínima dúvida. E veremos agora quem é que vai ser desencantado para investigar as pressões sobre os magistrados. Outro camarada de Sócrates? Também, era só o que faltava… No entanto, depois das absolvições de Pinto da Costa e de Avelino Ferreira Torres, tudo pode acontecer, não é verdade? Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 08/04/2009. (Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).
OS TESTÍCULOS DO DOUTOR MARINHO E OUTRAS MIUDEZAS
O doutor Marinho Pinto, bastonário da Ordem dos Advogados, habituou o país à sua frontalidade. Andam por aí as suas frases mais célebres, onde põe em causa a Justiça e podres diversos desta democracia pindérica e alvar. Não me custa dizer que subscreveria a maioria dessas tiradas, embora outras delas, pelo seu conteúdo, me cheirassem a qualquer coisa que não batia certo. Ou seja: parecia-me haver por ali um excesso de deslumbramento consigo próprio, que o levava a ser mais papista que o Papa. Um certo contestar gratuito, cheio de ideias peregrinas, um afinar extremista por causas duvidosas. Mas, enfim, de um modo geral, agradava-me aquilo que o senhor dizia, por ser uma pedrada no charco. Até se comentava, por aí, que o homem os tinha no sítio. Claro que esse arrojo haveria de lhe arranjar alguns problemas. E foi o que aconteceu. Guerra no galinheiro – isto é: na Ordem – ameaças de processos judiciais, contestação generalizada ao nível dos poderes, e por aí fora. Talvez por isso, durante algum tempo arrecadou a voz. Estranhei, mas pensei que tivesse esgotado os temas. Acontece, algumas vezes, a quem tem muita pressa em dizer tudo e uma ainda maior dificuldade em estar calado. Agora, reapareceu o doutor Marinho Pinto com uma assombrosa afirmação: a carta anónima que envolveu Sócrates no escabroso processo Freeport, não era, afinal, anónima, mas resultado de um conluio entre o denunciante a alguém dentro da Polícia Judiciária. Ou seja: foi combinada a maneira de fazer a denúncia. E embora isto não tenha sido dito, resultaria daqui que, assim sendo, tudo não passava realmente de uma cabala e, portanto, os milhões do Freeport nunca existiram. Nem o tio de Sócrates; nem o primo de Sócrates; nem a Smith & Pedro; nem os escritórios de advogados; nem a polícia inglesa e todos os dados de que dispõe. E nem outras coisas que adiante veremos. Ao ouvir isto, lembrei-me de Valentim Loureiro e de Pinto da Costa, que nunca contestaram o teor das escutas telefónicas, mas sim a maneira como teriam sido feitas. Queriam eles dizer, lá na deles, que, tendo dito o que disseram, afinal nada tinham dito, porque não foram escutados conforme a lei exigiria. E digo isto com o devido respeito, porque comparar o doutor Marinho Pinto às duas figuras que citei, pode parecer desprestigiante para o senhor bastonário. E é também com o devido respeito que confesso ter sentido uma pancada no estômago quando soube das suas declarações, tendo sido logo assaltado por uma ideia – certamente malévola – que traduzo assim: Pronto! Lá apertaram os testículos ao homem! Realmente, ninguém ignora as inúmeras pressões que Sócrates e o PS estão a exercer sobre tudo e todos para que o Freeport e demais trapalhadas em que o «engenheiro» que a UNI licenciou a um domingo está metido, sejam rapidamente abafados. Não me custa crer que Marinho Pinto, notoriamente egocêntrico e – ainda mais notoriamente – ambicioso, tenha sido informado, por qualquer Augusto Santos Silva, sobre a necessidade de sair em defesa de quem o pode livrar de aborrecimentos e, principalmente, lhe pode abrir as portas de uma actividade política almejada. Daí – digo eu – o incompreensível artigo sobre a forma da denúncia, como se isso fosse o cerne de toda a questão e não, como até o mais lerdo dos indivíduos deduz, o dinheirinho que escorreu de Inglaterra para Portugal e ao bolso de quem foi parar. Pareceu-me, por isso, que houve ali frete encomendado. Ou que, se o não foi, aconteceu coisa ainda pior, do tipo uma lambidela sabuja ao poder reinante. Tudo isto, é claro, me vem à cabeça, pois não tem ela – a minha cabeça – outra explicação para que um reputado causídico, de repente, pareça ter perdido o siso e, olhando para a floresta, se ponha a falar de palitos. Se não entonteceu, então anda ali mãozinha cor-de-rosa. Mas desculpem-me todos – e, principalmente, o doutor Marinho – se estou enganado. Limitei-me a dizer o que penso. Estávamos nós – que é como quem diz: eu – nesta meditação deprimente, quando salta de lá a Manuela Moura Guedes mais o vídeo onde Sócrates é rotulado de corrupto. Com todas as letras. Aí, meus amigos, só não saltei como salto quando o meu clube marca um golo, porque já sabia – e já aqui o afirmei sem rodeios – que Sócrates está a ser cozinhado em fogo lento. Como, aliás, merece. De resto, parece claro que já ninguém duvida que Sócrates está a dar as últimas. Segundo gente ligada ao próprio PS, há algum tempo que a sua sucessão está a ser preparada. O que está em causa, neste momento, já não é a permanência do «engenheiro» à frente do PS e do governo, mas a sua saída airosa e com poucos custos políticos. Coisa difícil de conseguir, não só pela natureza dos vários escândalos que têm Sócrates como actor principal, mas porque a luta pela sucessão está acesa entre as várias facções no partido. Porque nem só de Socretinos vive o PS. E convém aqui recordar o que já aqui disse há umas semanas atrás, quando referi que grande parte do que vem a público tem origem dentro do próprio Partido Socialista. Pois… é isso mesmo, a luta surda pelo poder, onde António Costa (excelentemente retratado no papel de Judas, numa paródia à Última Ceia, que por aí anda a circular, e onde Sócrates faz de Cristo) está a ter um papel relevante. É claro que a última palavra competirá à Justiça. E essa, a Justiça, vive dias difíceis, especialmente desde que o PS chegou ao poder. A D. Cândida Almeida, senhora socialista de fortes laços e abraços a Mário Soares e a Almeida Santos, e que lidera a investigação do caso Freeport, declarou, entre outras coisas surpreendentes, que não sabe do famoso vídeo, onde Sócrates é claramente incriminado, nem quer saber. Quase que me apetece dizer: pudera! Ao mesmo tempo, notícias inquietantes dizem-nos que os magistrados ligados ao caso Freeport estão a ser pressionados e coagidos a não fazer o que lhes compete fazer, sofrendo, até, ameaças às suas carreiras. É-lhes claramente sugerido que arquivem o processo. Pergunta que logo se impõe: será o arquivamento a única maneira de salvar Sócrates desta gigantesca enrascada? Pelos vistos… No fim desta história, veremos, então, quem tem testículos e não os deixa apertar, ou quem, em seu lugar, apenas tem miudezas facilmente (de)capáveis. Estranha – ou talvez não – é a posição dos partidos da oposição, muito cautelosos e cheios de palavras pias e outras delicadezas politicamente correctas. E, das duas, uma: ou já estão fartos de saber que, daqui para diante, a Sócrates só resta escorregar para o abismo; ou preferem não deitar mais achas para a fogueira, não vá ainda alguém mais sair chamuscado. Ou – quem sabe? – as duas coisas ao mesmo tempo. Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 01/04/2009. (Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).
CHINA, A FUTURA GRANDE POTÊNCIA ECONÓMICA
Nestes dias muitos telexes falam do potencial económico da China. Ontem 28 de Março foi a principal agência de notícias norte-americana a que reconhece que a "China é a única economia importante que continua crescendo com força no mundo...” "No seu segundo reproche à liderança estadunidense em uma semana ─ continua o telex, não muito amável no fim do parágrafo ─ o governador do banco central chinês, Zhou Xiaochuan, assegurou que a rápida resposta da China à fase de contracção económica internacional incluindo um pacote de estímulo equivalente a 586 bilhões de dólares ─ tem demonstrado a superioridade do seu sistema político, autoritário e uni-partidarista." A agência AP divulga logo as palavras textuais do governador do banco central chinês: "Os factos são evidentes e demonstram que comparativamente com outras economias importantes, o governo chinês tem adoptado medidas políticas pontuais, firmes e eficazes, demonstrando a vantagem do seu sistema…", tomadas de umas declarações de Zhou que segundo afirma a agência foram difundidas no sítio da internet do Banco Popular da China. "Quando faltavam duas semanas para a cúpula do Grupo dos 20 países de economias mais importantes (G20), ─ acrescenta o telex ─ a 2 de Abril em Londres, Zhou fez um apelo aos demais governos que participarão para que outorguem aos seus ministros das finanças e aos bancos centrais toda a autoridade para que possam ‘agir audaz e eficazmente, sem ter que passar através de um processo de aprovação longo ou inclusive doloroso’. "A China deixou bem clara sua aspiração: quer um dólar estadunidense estável e inclusive tem defendido a criação de outra moeda mundial paralela. Beijing opõe-se ao proteccionismo ─ continua essa agência ─ e está exigindo que lhe emprestem mais ouvidos sobre como se regulam os sistemas financeiros e como são resgatados, enquanto se abstém de fazer qualquer promessa de novos planos de resgate ou estímulo no seu próprio solo. Na parte final do seu telex, expressa: "… o Primeiro-ministro chinês Wen Jiabao instou Washington para que a união norte-americana continue sendo ‘uma nação acreditável’. "Noutras palavras, Beijing deseja que Washington evite estimular a inflação com uma despesa excessiva do governo em pacotes de salvamento e estímulo." Pelo que se pode constatar, a influência da República Popular da China na reunião de Londres será enorme do ponto de vista económico face à crise mundial. Isso não tinha acontecido nunca antes quando o poder dos Estados Unidos reinava totalmente nesse âmbito. Por outro lado, no nosso hemisfério resulta divertido ver como se agitam as entranhas do império, pleno de problemas e contradições insuperáveis com os povos da América Latina, aos quais pretende dominar eternamente. Aqueles que lerem as declarações do piedoso católico Joe Biden em Viña del Mar, que descarta levantar o bloqueio económico a Cuba, suspirando por uma transição interna que no nosso país seria francamente contra-revolucionária, ficarão surpreendidos. Os seus lamentos plangentes dão lástima, especialmente quando não existe um só governo latino-americano e caribenho que não veja nessa medida antediluviana um lastre do passado. Que ética subsiste na política dos Estados Unidos? Quanto resta de cristão no pensamento político do Vice-presidente Biden? Fidel Castro Ruz 29 de Março de 2009
O FEITIÇO E O FEITICEIRO
Os feiticeiros deste país – e deste mundo – querem ter tudo. Querem ter sol na eira e chuva no nabal. Mas tal como é impossível que dois corpos ocupem, ao mesmo tempo, o mesmo espaço, também esta pretensão dos senhores da política e dos seus donos, os distintos senhores capitalistas, não é concretizável. Ou raramente o é. A eira e o nabal estão sempre perto demais, e só por um milagre da Natureza as coisas se conjugam favoravelmente. Durante algum tempo, foi possível pagar baixos salários e baixas pensões e, ao mesmo tempo, conseguir-se ir enchendo os cofres das empresas, dos bancos e do Estado. Depois, quando os baixos salários e pensões se transformaram em salários e pensões de penúria, por via de não serem actualizados de acordo, no mínimo, com a inflação real, os governos e os senhores capitalista, para continuarem a espremer a maralha, inventaram o crédito fácil. A qualquer hora, de qualquer maneira. Agora, esgotado o recurso, com o carapau mais seco que uma palha ao sol de Verão, aí estão eles de mãos na cabeça e crise na boca. A rapaziada, esmifrada até ao tutano, só compra o essencial – às vezes, nem isso – e vê-se grega para pagar o dinheiro que a levaram a pedir emprestado. Quando paga. Assim, não se vende tudo o que se fabrica, não se paga tudo o que se deve, não se gasta um cêntimo mal gasto. A economia definha, a produção estagna ou reduz-se, os stocks amontoam-se, as fábricas e as lojas fecham, o desemprego sobe em flecha e, em consequência, os cofres do Estado, não se enchem como eles esperavam. Qualquer dia, nem dinheiro há para continuar a encher os alforges dos banqueiros. Aqui d’el Rei!, que vem aí o fim do mundo, gritam. A provar o que digo, aí estão notícias recentes, dizendo que as receitas fiscais do Estado estão a afundar, tendo caído 9,4 milhões de euros por dia, um total de 558,4 milhões de euros em Janeiro e Fevereiro últimos, face ao período homólogo. Só a quebra no IVA traduziu-se numa perda de 4,9 milhões por dia, o que faz sobressair as dificuldades da economia nacional. Realmente, a receita de IVA caiu um total de 289 milhões de euros, o que demonstra que as empresas estão a vender menos do que no início de 2008. Outro indício das dificuldades das empresas, foi a quebra de 138,8 milhões de euros no Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC). Curiosamente, só o IRS subiu, em relação a 2008. Contas feitas, como as despesas do Estado mantêm o ritmo de crescimento, o saldo final está em 907 milhões de euros negativos, o que significa que o défice aumentou mais de 12 vezes face aos dois primeiros meses do ano passado, o que está a deixar o ministro das Finanças preocupado. Não sei porquê. Eu, que não sou economista – nem sequer licenciado pela Universidade Independente – há muito que aqui disse que isto ia acontecer. Aliás, até Karl Marx, esse maldito bruxo de ideias verdadeiramente socialista, falecido em 1883, adivinhou – e escreveu – o que hoje se está a passar. Se Teixeira dos Santos alguma vez pensou que as políticas económicas que tem apadrinhado e defendido com unhas e dentes iam ter outro resultado, desculpem-me a linguagem pouco ortodoxa, é um parvo chapado. Claro que ele não é parvo. Pode ser o ministro das finanças mais incompetente da Europa, mas parvo, o que se diz mesmo parvo, ele não é. Faz-se de parvo, o que é diferente. Ele pouco se rala com o agravamento do défice, pois ele já sabe como resolver o problema. Quando a crise se atenuar, aí estará ele – ou outro igual a ele, pois lêem todos pela mesma cartilha, que não é a de Karl Marx, como se percebe à vista desarmada – a dizer que é preciso recompor o défice, entretanto agravado. E vá de manter a crise para a rapaziada, agora, e de novo, em nome do equilíbrio das contas públicas. Estão a perceber, ou querem que faça um desenho? Por isso, alguns papagaios do capitalismo reinante já aí estão a dizer que é preciso sanear as contas públicas após a recessão, como afirmou o economista Vítor Gonçalves. Mas a mais escandalosa afirmação, nos últimos dias, veio de um certo senhor, que já foi ministro das finanças e governador do Banco de Portugal, um certo Silva Lopes, que defendeu, tal o actual governador, o senhor Vítor Constâncio, ser necessário, para enfrentar a crise actual, congelar os salários da generalidade dos trabalhadores portugueses. Eu não quero ofender ninguém, mas vou explicar quem é o senhor doutor Silva Lopes, como se quem me lê ou ouve fosse mesmo muito burro. O senhor doutor Silva Lopes foi presidente do Conselho de Administração do Montepio até a Abril de 2008, portanto durante apenas quatro meses desse ano. Lê-se, no entanto, no Relatório e Contas de 2008, do Montepio que o presidente (o tal senhor doutor Silva Lopes) recebeu, por quatro meses de gestão, 410.249,21 €, o que dá 102.562,30 € por mês, ou seja, mais de 20.500 contos mensais. Saliento, agora, que a remuneração base média mensal dos trabalhadores portugueses era, em 2008, de apenas de 891,40€. Ora, para amanhar o que amanhou, mais o que adiante vou dizer, é preciso ser-se um grande desavergonhado, para afirmar que os que ganham uma miséria por mês devam ver os seus ordenados congelados. Mas vergonha, ao contrário das mordomias, é coisa que não abunda para os lados destes autênticos vampiros. E o que eu vou dizer a respeito do senhor doutor Silva Lopes, para além do que já atrás disse, é que ele, tendo exercido as funções de presidente do Montepio durante quatro aninhos, vai receber, por esse lapso de tempo, uma reforma de 4.000 € por mês, a juntar às que tem do Banco de Portugal e da Caixa Geral de Depósitos, onde também exerceu o seu mister. Isto, sem contarmos com o que escorrerá de ter trabalhado para o FMI, Banco Mundial e ter sido deputado à Assembleia da República e governante. Mas o mais giro disto tudo, é que o senhor doutor Silva Lopes se reformou do Montepio alegando que já tinha 74 anos e precisava de descansar. Coisa merecida para quem tanto labutou e tantas dificuldades deve ter passado ao longo da vida. Mas, se assim foi, porque carga de água aceitou o cargo de administrador da EDP Renováveis, onde recebe um ordenado que, por enquanto, ainda é segredo dos deuses? É este, então, o homem que propõe o congelamento das remunerações da maioria dos trabalhadores portugueses. Claro que nunca lhe passa pela cabeça incluir-se nessa maioria, nem – muito menos – acabar com o regabofe do qual é um enormíssimo beneficiário! Ao alto da minha ignorância, recordo ao excelso doutor Silva Lopes, que o congelamento dos salários só poderia trazer ainda um maior agravamento das desigualdades. Primeiro, porque seria uma medida socialmente injusta (agravaria a situação daqueles que já vivem com grandes dificuldades, e beneficiaria os grandes accionistas das empresas, que ficariam com mais lucros para receber), para além de ser, tecnicamente, um erro crasso, pois reduziria ainda mais a procura interna, provocando mais falências e mais desemprego. Pois foi: deixámos os feiticeiros à solta, e é o que se vê. É verdade que o feitiço se volta, de quando em vez, contra os feiticeiros, mas devemos dar uma ajuda, não é? É que se não dermos, eles até pensam que têm mesmo poderes sobrenaturais. Na verdade, só têm o poder que nós lhes dermos. Ou deixarmos ter. Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 25/03/2009. (Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).
ANEDOTAS
Primeira anedota Dia 13 de Março não houve uma gigantesca manifestação de protesto, em Lisboa, contra as políticas do «engenheiro» José Sócrates. Não desfilaram cerca de 200 mil manifestantes. Segundo a opinião, bastante irritada, do visado, tratou-se apenas de um grupo de arruaceiros, manipulados por dois partidos minúsculos, destinada a insultá-lo e ao seu honrado e eficiente governo. Ah! Já me esquecia: governo socialista e de esquerda. E também me esquecia de outra coisa: Salazar dizia exactamente o que Sócrates agora disse. Salvo quanto ao Bloco de Esquerda, que ainda não existia. Segunda anedota Os projectos assinados por José Sócrates, no concelho da Guarda, nos anos oitenta, eram aprovados num vê se te avias. Mesmo nos casos em que os processos tinham pareceres desfavoráveis de várias entidades regionais – ou até embargos da autarquia – bastava que o engenheiro-técnico responsável fosse José Sócrates, então a trabalhar na Câmara da Covilhã, para os projectos serem aprovados em tempo recorde. Entre a entrada do procedimento, até à decisão camarária, os prazos variavam entre os oito e os quinze dias e, nos casos mais espantosos, eram aprovados em apenas um dia. Quinze dos 23 projectos de Sócrates aprovados em tempo recorde, são na região de onde são naturais Joaquim Valente, actual presidente da Câmara da Guarda, e Fernando Caldeira, técnico da autarquia. Os três foram colegas em Coimbra. Terceira anedota A Câmara Municipal de Vale de Cambra faz parecer o Ferrari do Cristiano Ronaldo uma pechincha. Sim, se pensam que o Ferrari do Cristiano Ronaldo foi caro, fiquem a saber que um autocarro de 16 lugares para as crianças, custou 2.922.000,00 euros. É isso mesmo: quase 3 milhões de euros. Seiscentos mil contos! Quarta anedota A Operação Furacão envolve nomes graúdos da alta finança e investiga uma gigantesca teia de fuga ao fisco e outros crimes de colarinho branco. Muitos dos implicados correram já a liquidar os impostos de que haviam, consciente e criminosamente, fugido. Tal como fizeram os marajás das facturas falsas, de há uns anos atrás. Ninguém foi preso, então. E agora? Quinta anedota A casa de Sócrates, no registo predial, não passa de um simples apartamento. Na verdade, trata-se de uma casa senhorial, no coração de Lisboa. São cinco assoalhadas dum 3.º andar no edifício Heron Castilho. Tem 150 metros quadrados, avaliados em 800.000 euros, que custaram, em Fevereiro de 1996, 240.000 euros. Antes, vivia num modesto apartamento T2 na calçada Eng. Miguel Pais, em São Bento. Na garagem, tem um Mercedes C230. Longe vão os tempos em que conduzia um vulgar Rover. Frequenta restaurantes caros e usa fatos de marca. Sócrates vive como um homem rico, com 82 mil euros brutos (57 mil líquidos) que foi o que declarou ao Tribunal Constitucional ganhar por ano. Garante não ter rendimentos de quaisquer empresas, acções ou planos de poupança. O único património que diz ter é o carro, a casa e ordenado. Sexta anedota Mesquita Machado, presidente da Câmara Municipal de Braga, enriqueceu subitamente – e de forma inexplicável. Melhor dizendo: de forma explicável, a fazer fé no que foi publicamente denunciado e apresentado às instâncias judiciárias. Tudo foi arquivado, por falta de provas. Reavivado o caso, parece que a Justiça se dispõe a voltar a verificar os factos. Pois… Sétima anedota Pinto da Costa jurou, em nome de Deus e pela saúde da filha, que está inocente no caso do envelope. Com esta prova de fé no Todo-Poderoso e na robustez da sua petiza, fica definitivamente provada a sua imaculada inocência. Oitava anedota O Freeport nunca existiu. Nem existe. Nona anedota Há uns tempos atrás, uma idosa de poucos recursos levava de um supermercado, sem pagar, um produto de alguns (poucos) euros. Foi imediatamente detida e presente a tribunal. Décima anedota Um homem roubou duas galinhas, avaliadas em 50 euros. Vai ser julgado no dia 20 de Abril, no Tribunal da Maia. Décima primeira anedota Foi preso um jovem que fez um download de música na Internet – ou seja, pirateou umas musiquinhas. Tornou-se, assim, o primeiro português condenado a prisão por pirataria musical na Internet. O jovem poderá passar entre 60 a 90 dias atrás das grades por ter feito o download e partilhado música ilegalmente com outros utilizadores. Finalmente, a Justiça, em Portugal, dá um ar da sua graça. Livra! Já não era sem tempo… Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 18/03/2009. (Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).
O SENHOR SOUSA – O PRINCÍPIO DO FIM?
Em 7 (sete!) dos últimos 10 (dez!) anos, o país esteve entregue aos senhores doutores e engenheiros do PS. Nesse período, as desigualdades sociais agravaram-se de forma abismal, não havendo maneira de atirar as culpas para cima da recém-nascida crise internacional. Só em 2008 – antes, portanto, dessa crise – saíram de Portugal, como emigrantes, rumo a vários países da Europa, para Angola e para outros destinos, cerca de 150 mil portugueses. Tantos quantos os empregos que o senhor Sousa (Sócrates, para os mais distraídos) prometeu criar. Dados recentes dizem-nos que mais de 30 mil desempregados já estão em risco de pobreza absoluta. Os dramas de famílias inteiras entregues à miséria dos frágeis e perecíveis subsídios de desemprego e, a par disso, a angústia de centenas de milhares de outras que dependem de um emprego precário e sem direitos, retratam um país cada vez mais injusto e mais desigual. Nenhum português comum sabe como vai ser o dia de amanhã. Ou melhor: os portugueses sabem que o dia de amanhã vai ser pior do que o dia de hoje. Há pouco mais de oito dias, em Espinho, no congresso do PS, para além das palmas ao engenheiro Pinto de Sousa (é, outra vez, a Sócrates que me refiro) nem uma palavra para o desemprego, para os baixos salários, para os salários em atraso, para os mais de 2 milhões de portugueses que vivem no limiar da miséria. Ou na mais absoluta miséria. Só palmas, bandeiras, aparato, alegria e festa. Tudo iluminado e cor-de-rosa, como convém. Ideias para a negridão em que o país está mergulhado, zero. Nada se passa de preocupante neste quintal que não se resolva com o Simplex ou o Magalhães. A propósito do Magalhães, cá está mais uma digna do senhor Carvalho Pinto de Sousa (Sócrates, se preferirem). Então, não é que uma preciosidade destinada, principalmente, aos nossos alunos mais jovens, tem textos com mais erros ortográficos, gramaticais e de sintaxe, que milímetros mede o nariz do Pinóquio? Já não bastava o Magalhães ser um negócio à PS, feito com e para «camaradas socialistas» com problemas fiscais, sem concurso e contrabandeando um produto original da Intel, ainda precisava de mais esta trapalhada pedagógica? Então, onde estão a qualidade e a excelência, já que a transparência, essa, há muito que parece uma mina de carvão em noite de lua nova? Quem é responsável por esta bronca terceiro-mundista que, aqui para nós, me deu um gozo dos diabos. Parece que ainda estou a ver o senhor engenheiro Sousa, com um batalhão de câmaras e microfones atrás, a fingir que distribuía Magalhães a alunos/figurantes, e lá dentro, da caixinha azul, um rol de asneiras e calinadas maior que a viagem de circum-navegação do próprio Fernão de Magalhães. Por estas e por outras, é que já se diz que Sócrates «está mais sozinho do que parece» (disse-o Manuel Alegre), ou que ele «é um homem muito cansado, obcecado com o BE e o PCP» (disse-o Soares dos Santos, presidente do grupo Jerónimo Martins). Mas nem seriam precisas estas dicas, porque é visível no seu comportamento, nas suas atitudes, no vazio dos seus repetitivos discursos e intervenções, no descontrolo que evidencia nos debates, enfim, nos tiques que os sorrisos forçados já não mascaram, que José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa, engenheiro-técnico, bacharel e, finalmente, engenheiro, já percebeu que dias negros (para ele) se aproximam. E bem os merece. A ambição levou-o a ser o que não podia ser. No meio disto tudo, um homem (entre outros) vai-se agitando no seio do PS. Não, não me refiro a Alegre, nem a Seguro. Muito menos a Santos Silva ou Silva Pereira, já que estes não passam de dois caniches do senhor Sousa e, em termos mediáticos, só existem porque o senhor Sousa existe. Refiro-me a António Costa. Ora, aí está a sombra negra do senhor Pinto de Sousa (não, não se trata de uma baixa metáfora inspirada na cor da pele). António Costa tem sabido, pela calada dos reposteiros do aparelho socialista – e parecendo estar sempre ao lado do chefe – fazer a caminhada da sucessão. O seu gabinete na Praça do Município é um gabinete-sombra de São Bento, onde se vão tecendo tácticas e estratégias para o PS que aí vem. Um PS que já percebeu que não pode governar sozinho e que, com o senhor José Sousa (Sócrates, como gosta de ser tratado) e as suas inenarráveis figuras (Linos, Lurdinhas, Pinhos, Anas Jorges, Jaimes Silvas ou Albertos Costas) corre o risco de nem sequer governar. Há muito que é sabido que muitos dos dados referentes às aventuras de Sócrates só vieram a público porque alguém, dentro do próprio PS, as pôs cá fora, dando pistas a jornalistas e a elementos da oposição para que as broncas estoirassem ou renascessem. António Costa, porém, em termos ideológicos, não é melhor do que o tal senhor Sousa – ou o Zézito, para os familiares. É um neo-liberal, tal e qual o outro, o senhor engenheiro. Sorri mais, tem voz de homem, de barítono, figura bonacheirona, formou-se mesmo a sério, sem trapalhadas, enfim, não tem – que se saiba – rabos-de-palha (mas isso também se julgava que o senhor Sousa não tinha). Porém, se Costa chegar, como deseja, ao topo do PS e da nossa governação, não será mais do que uma nova roupa e uma nova máscara para a mesma política. Não acredito, por isso, que haja quem pense que a câmara municipal de Lisboa possa ser palco de alianças e experiências unitárias, à esquerda, pois isso seria tão irrealista e tão espúrio que deverá estar fora de qualquer cogitação. E se Costa já excluiu o Bloco de Esquerda dos seus planos, todo eu tremo só de pensar com quem andará agora a conversar. A propósito de autarquias, julgo que prestamos pouca atenção ao que se passa nesse patamar do poder político. Abílio Curto, Fátima Felgueiras, Isaltino, Valentim, Ferreira Torres e mais alguns menos mediáticos, são meros exemplos do relaxamento que por aí vai. Mesquita Machado, cuja súbita fortuna ninguém quer explicar – e que a justiça, talvez por estar vendada, se recusou a investigar – é, seguramente, o caso mais exemplar da impunidade reinante. Todos os dias ouvimos coisas estranhas e nos deparamos com estilos de vida e patrimónios que não podem ser explicados. Eis um bom tema para, um dia destes, aqui trazermos. Afinal, Mesquitas Machados, de vários tamanhos, cores e paladares, parece ser coisa que por aí não falta. De tal modo que o povo já diz, matreiro: Queres encher a arca? Então, faz-te autarca. Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 11/03/2009. (Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).
VISITA A CABO VERDE
Acompanhado por nove ministros e sete secretários de Estado, José Sócrates irá a Cabo Verde esta semana. Da comitiva farão parte também alguns empresários e gestores públicos, para além do indispensável Basílio Horta. As crianças esperam ansiosamente que o presidente do conselho leve alguns “magalhães” mesmo com os erros de português, pois assim será mais fácil de adptar ao crioulo. Não desejando mal nenhum ao povo caboverdiano, antes pelo contrário, seria uma felicidade para os portugueses se todos por lá ficassem. Cabo Verde tem um óptimo clima e grandes extensões de terrenos para o desenvolvimento da arquitectura socratina e a instalação de vários “freeportes”.
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