03/11/2006

UM BORDEL À BEIRA-MAR

ou o bacanal socialista

As nossas «provocações» de hoje não são, na sua quase totalidade, mérito meu. Devo-as ao professor Santana Castilho, a quem faço a devida vénia, e a quem tiraria o chapéu, se por acaso o usasse. Na verdade, caros ouvintes, vou ler-vos, daqui a nada, uma carta aberta que este professor do Ensino Superior enviou ao engenheiro José Sócrates, pessoa que, como dolorosamente sabemos, ocupa o cadeirão de primeiro-ministro.

Porém – e antes de mais – quero deixar aqui uma boa notícia. Uma notícia que encherá de esperança todos aqueles que defendem uma Arrábida, a nossa Serra-Mãe, livre do crime da co-incineração, essa fixação psicopática do engenheiro José Sócrates. Vamos a ela: as Câmaras de Setúbal, Sesimbra e Palmela vão recorrer aos tribunais para impugnar o despacho do ministro do Ambiente que visa avançar com a co-incineração na Arrábida sem a realização da respectiva avaliação de impacto ambiental. Ao mesmo tempo, será também instaurada uma acção cautelar para travar o início dos testes. As duas acções serão conduzidas por Castanheira Barros, advogado de Coimbra, e uma das figuras proeminentes no combate legal à co-incineração em Souselas. Ou eu me engano muito, ou ainda não será desta que o homem a quem o país vai conhecendo pelo cognome de «O Mentiroso», levará a dele avante.

Posto isto, vamos a umas notas soltas – os habituais parabéns – a propósito de desenvolvimentos recentes da nossa vida neste bordel à beira-mar situado. E vem o termo bordel a propósito da prostituição que se pratica por todo o lado, principalmente nos mais altos patamares do aparelho do Estado. Estou a falar, como compreenderão, em sentido figurado, pois não me refiro às prostitutas – nem à prostituição – propriamente ditas, coitadas delas, merecedoras muito mais de respeito e compreensão do que certas meretrizes de fatinho e gravata que por aí existem, cujo triste ofício é mercadejar corpo e alma – principalmente a alma – comprando e vendendo muito mais do que uns minutos de prazer. E se o país se assemelha a um bordel, a governação mais não é do que um enorme bacanal.

Parabéns, então – e a começar – ao pesado ministro das Obras Públicas e ao seu secretário de Estado, um tal Paulo Campos, que encomendou à empresa F9 Consulting, fundada por um seu assessor, o estudo técnico que sustentou a decisão do Governo de colocar portagens nas SCUTs do Norte Litoral. Tendo em atenção que o estudo custou 275 mil euros (mais de 55 mil contos), até se pode dizer que foi um preço de amigos. Mas é mesmo para isso que servem os amigos.

Claro que tudo não passou de uma infeliz coincidência. Nem o convite para o empresário passar a assessor, nem o convite para a sua empresa elaborar o estudo, nem as conclusões do estudo irem de encontro aos desejos do governo podem ser imaginados como manhas e artimanhas da democracia na versão PS. Ná! Isto é tudo gente séria, umas autênticas virgens, tão puras como a maior das santas. Mesmo assim, prefiro as prostitutas verdadeiras. Essas, ao menos, não enganam ninguém, não se escondem, não disfarçam e, principalmente, só vivem do dinheiro dos seus clientes. As outras, as «prostitutas sérias», essas, vivem do dinheiro de todos nós. E ainda nos tratam como se não passássemos de uma cambada de imbecis. Que, se calhar, até somos…

Parabéns, também, à patibular ministra da Educação. De cada que vez que abre a boca ou toma uma medida, sai asneira e estoira bronca. Agora, queria obrigar os professores a cumprirem horários de oito horas, nas escolas, e a ali permanecerem nas pausas do Natal e da Páscoa. Responderam-lhe os sindicatos que uma medida destas só podia sair de quem das escolas não percebe nada, ou porque nunca lá esteve, ou porque, estando, nada viu nem percebeu. Os professores preparam as matérias fora dos seus horários escolares, tal como é fora do seu actual horário corrigem pontos e realizam outras tarefas de âmbito profissional. Nas pausas do Natal e da Páscoa estão, em permanência, disponíveis para as actividades necessárias à concretização dos projectos curriculares e extracurriculares, pelo que, com frequência, agem no espaço físico da escola nesses períodos, que apenas são de pausa efectiva e real para os alunos.

Tão disparatada era a medida, que, mais tarde, lá veio emendar a mão e dar o dito por não dito. Entretanto, alastra a contestação nas escolas face à inutilidade das chamadas aulas de substituição.

Parabéns, também, ao senhor ministro da Defesa, pelo calote de centenas de milhares de euros a fornecedores de géneros alimentares à Manutenção Militar, entidade que abastece os quartéis do Exército português. Isto é: a tropa anda a comer fiado, porque o governo diz que não tem verba para a alimentar. Mas tem para mandar militares para a Bósnia, para o Kosovo, para o Afeganistão, para o Líbano e para qualquer outro sítio onde seja necessária carne para canhão.

A verdade é que há 28 meses que o governo não paga a quem, a tempo e horas, lhe fornece a paparoca para a tropa. Um desses fornecedores, já atolado em dívidas a familiares e a bancos, recebeu pela última vez em 2004. Mas tem de continuar a pagar IVA e demais impostos, se não vai para a lista de caloteiros que o Ministério das Finanças tem na Internet e, muito pior, deixa de poder continuar a ser fornecedor do Estado. Estado que é mau pagador, mas que está isento de fazer parte da lista de caloteiros.

E é assim. Esgotado, ao governo, já sem coelhos na cartola para iludir os portugueses, apenas resta a política do atarraxa. Corta nos pagamentos, corta nos salários, corta nas pensões, corta nos direitos sociais, ataca, como pittbull enraivecido a função pública, enfim, morde a torto e a direito em tudo o que lhe cheire a Zé Povinho. Por isso, vou ler-vos a tal carta aberta a José Sócrates, escrita há já uns tempos pelo professor universitário Santana Castilho, que demonstra e prova como este governo e o seu primeiro-ministro não passam de um grupo de inquietantes mentirosos e inaptos.

«Esta é a terceira carta que lhe dirijo. As duas primeiras motivadas por um convite que formulou mas não honrou, ficaram descortesmente sem resposta. A forma escolhida para a presente é obviamente retórica e assenta num direito que o senhor ainda não eliminou: o de manifestar publicamente indignação perante a mentira e as opções injustas e erradas da governação.

Por acção e omissão, o Senhor deu uma boa achega à ideia, que ultimamente ganhou forma na sociedade portuguesa, segundo a qual os funcionários públicos seriam os responsáveis primeiros pelo descalabro das contas do Estado e pelos malefícios da nossa economia. Sendo a administração pública a própria imagem do Estado junto do cidadão comum, é quase masoquista o seu comportamento.

Desminta, se puder, o que passo a afirmar:

1.º Do Statics in Focus n.º 41/2004, produzido pelo departamento oficial de estatísticas da União Europeia, retira-se que a despesa portuguesa com os salários e benefícios sociais dos funcionários públicos é inferior à mesma despesa média dos restantes países da Zona Euro.

2.º Outra publicação da Comissão Europeia, L´Emploi en Europe 2003, permite comparar a percentagem dos empregados do Estado em relação à totalidade dos empregados de cada país da Europa dos 12. E o que vemos? Que em média nessa Europa 25,6 por cento dos empregados são empregados do Estado, enquanto em Portugal essa percentagem é de apenas 18 por cento. Ou seja, a mais baixa dos 12 países, com excepção da Espanha.

As ricas Dinamarca e Suécia têm quase o dobro, respectivamente 32 e 32,6 por cento. Se fosse directa a relação entre o peso da administração pública e o défice, como estaria o défice destes dois países?

3º. Um dos slogans mais usados é do peso das despesas da saúde. A insuspeita OCDE diz que na Europa dos 15 o gasto médio por habitante é de 1.458. Em Portugal esse gasto é 758. Todos os restantes países, com excepção da Grécia, gastam mais que nós. A França 2.730, a Áustria 2.139, a Irlanda 1.688, a Finlândia 1.539, a Dinamarca 1.799, etc.

Com o anterior não pretendo dizer que a administração pública é um poço de virtudes. Não é. Presta serviços que não justificam o dinheiro que consome. Particularmente na saúde, na educação e na justiça. É um santuário de burocracia, de ineficiência e de ineficácia. Mas infelizmente os mesmos paradigmas são transferíveis para o sector privado. Donde a questão não reside no maniqueísmo em que o Senhor e o seu ministro das Finanças caíram, lançando um perigoso anátema sobre o funcionalismo público. A questão reside em corrigir o que está mal, seja público, seja privado. A questão reside em fazer escolhas acertadas. O Senhor optou pelas piores. De entre muitas razões que o espaço não permite, deixe-me que lhe aponte duas:

1.º Sobre o sistema de reformas dos funcionários públicos têm-se dito barbaridades. Como é sabido, a taxa social sobre os salários cifra-se em 34,75 por cento (11 por cento pagos pelo trabalhador, 23,75 por cento pagos pelo patrão).

Os funcionários públicos pagam os seus 11 por cento!

Mas o seu patrão Estado não entrega mensalmente à Caixa Geral de Aposentações, como lhe competia (e exige aos demais empregadores), os seus 23,75 por cento. E é assim que as "transferências" orçamentais assumem perante a opinião pública não esclarecida o odioso de serem formas de sugar os dinheiros públicos.

Por outro lado, todos os funcionários públicos que entraram ao serviço em Setembro de 1993 já verão a sua reforma ser calculada segundo os critérios aplicados aos restantes portugueses. Estamos a falar de quase metade dos activos. E o sistema estabilizará nessa base em pouco mais de uma década.

Mas o seu pior erro, Senhor Engenheiro, foi ter escolhido para artífice das iniquidades que subjazem à sua política o ministro Campos e Cunha, que não teve pruridos políticos, morais ou éticos por acumular aos seus 7.000 Euros de salário, os 8.000 de uma reforma conseguida aos 49 anos de idade e com 6 anos de serviço. E com a agravante de a obscena decisão legal que a suporta ter origem numa proposta de um colégio de que o próprio fazia parte.

2.º Quando escolheu aumentar os impostos, viu o défice e ignorou a economia. Foi ao arrepio do que se passa na Europa. A Finlândia dos seus encantos, baixou-os em 4 pontos percentuais, a Suécia em 3,3 e a Alemanha em 3,2.

3.º Por outro lado, fala em austeridade de cátedra, e é apologista juntamente com o presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo, da implosão de uma torre (Prédio Coutinho) onde vivem mais de 300 pessoas. Quanto vão custar essas indemnizações, mais a indemnização milionária que pede o arquitecto que a construiu, além do derrube em si?

4.º Por que não defende V. Exa. a mesma implosão de uma outra torre, na Covilhã (ver ' Correio da Manhã ' de 17/10/2005), em tempos defendida pela Câmara, e que agora já não vai abaixo? Será porque o autor do projecto é o Arquitecto Fernando Pinto de Sousa, por acaso pai do Senhor Engenheiro, primeiro-ministro deste país?

• Por que não optou por cobrar os 3,2 mil milhões de Euros que as empresas privadas devem à Segurança Social?

• Por que não pôs em prática um plano para fazer a execução das dívidas fiscais pendentes nos tribunais Tributários e que somam 20 mil milhões de Euros?

• Por que não actuou do lado dos benefícios fiscais que em 2004 significaram 1.000 milhões de Euros?

• Por que não modificou o quadro legal que permite aos bancos, que duplicaram lucros em época recessiva, pagar apenas 13 por cento de impostos?

• Por que não renovou a famigerada Reserva Fiscal de Investimento que permitiu à PT não pagar impostos pelos prejuízos que teve no Brasil, o que, por junto, representará cerca de 6.500 milhões de Euros de receita perdida?

A Verdade e a Coragem foram atributos que Vossa Excelência invocou para se diferenciar dos seus opositores.

Quando subiu os impostos, que perante milhões de portugueses garantiu que não subiria, ficámos todos esclarecidos sobre a sua verdade.

Quando elegeu os desempregados, os reformados e os funcionários públicos como principais instrumentos do combate ao défice, percebemos de que teor é a sua coragem».

Subscreve esta carta aberta, como disse, o professor universitário Santana Castilho.

E depois destas sábias palavras, tudo o que eu acrescentar não faz sentido.


Crónica de: João Carlos Pereira
Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 01/11/2006.
(Não deixe de ouvir e participar todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00, em 98.7 Mhz)

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