22/10/2008

NOTAS SOLTAS E UMA CONSTANTE

Com o petróleo a cerca de 70 dólares, quando há três meses rondava os 140, não se vê que os preços dos combustíveis tenham descido na mesma proporção. Sempre rápidas a aumentar os preços à mais ligeira subida do crude, as petrolíferas arranjam sempre desculpas para não os baixar quando o inverso se verifica. Pelo contrário: se ignoram, com o descaramento de quem pode, quer e manda, as constantes descidas, logo se aprestam a aumentar os preços mal se verifique algum aumento.

Mas que se há-de fazer? Estamos nas mãos deles.

O Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, que funciona como “almofada” para o pagamento das pensões em caso de dificuldades extraordinárias no sistema, perdeu 3,14% nos primeiros nove meses deste ano, disse o ministro do Trabalho. E perdeu porquê? Porque esse Fundo é constituído, em grande parte, por acções, logo, depende das variações da especulação bolsista.

Como sabemos – e como alguns não sabem – as bolsas de valores nada têm a ver com a economia real, com o verdadeiro valor das coisas, sendo antes locais, como alguém disse, onde os capitalistas tentam devorar-se uns aos outros. Com a crise bolsista que se vive, lá foram à viola 250 milhões de euros, preciosos para garantir as reformas de quem trabalhou toda a vida.

Mas que se há-de fazer? Estamos nas mãos deles.

A Organização Internacional do Trabalho espera uma subida de 20 milhões de desempregados. A crise financeira poderá fazer subir de 190 milhões para 210 milhões o número de desempregados no mundo inteiro, até o final de 2009, advertiu o director daquela organização, Juan Somavia.

Também a população de trabalhadores pobres, vivendo com menos de um dólar por dia, pode aumentar em 40 milhões, e a dos que vivem com dois dólares por dia, em mais de 100 milhões, acrescenta a OIT.

Juan Somavia salientou que estas projecções «podem revelar-se por baixo se os efeitos do actual abrandamento do crescimento económico e da ameaça de recessão não forem rapidamente combatidos».

Milhares de postos de trabalho já foram suprimidos em Wall Street e noutros centros financeiros, com a falência de bancos ou fusões na sequência da crise financeira. Mas a OIT adverte que os cortes vão também atingir trabalhadores dos mais variados sectores, como a construção civil, a indústria automóvel, o turismo, os serviços e o imobiliário.

«Não é uma simples crise de Wall Street, é uma crise em todas as streets (ruas). Precisamos de um plano de salvamento da economia para as famílias de trabalhadores e a economia real, com regras e políticas que assegurem empregos decentes», disse.

Em Portugal, a coisa está cada vez mais negra. Até Sócrates já desistiu dos tais 150 mil novos postos de trabalho. O mais provável é termos, até finais de 2009, menos 150 mil postos de trabalho do que tínhamos quando o PS entrou para o governo.

E eu pergunto: mas que se há-de fazer, se estamos nas mãos deles?

Os gestores portugueses determinam para si próprios ordenados e reformas fabulosos, permitindo-se, até, acumular vários ordenados e várias reformas.

Entre eles, está a nata da classe política, já que saltitam dos governos e da Assembleia da República para os cadeirões das administrações das empresas públicas ou privadas, ou vice-versa. No fundo, tratam de tratar das suas vidinhas, não se esquecendo, pelo meio, de fazer a nossa vida negra. Enfim, ganham mais num mês do que um trabalhador com ordenado médio ganha em vários anos.

Mas que se há-de fazer? Estamos nas mãos deles.

Em Portugal há, pelo menos, dois milhões de pobres declarados. Há milhares de pequenas e médias empresas, que são as responsáveis pela maioria dos postos de trabalho neste país, com a corda na garganta. Produzem grande parte da riqueza que se produz em Portugal, e não se entretêm a especular na bolsa nem a fazer fortunas nos off-shores. Mas o governo decide apoiar com 20 mil milhões de euros os bancos, para irem pedir dinheiro ao estrangeiro, aumentando ainda mais a nossa dívida externa, que já está em números nunca vistos.

Mas que se há-de fazer? Estamos nas mãos deles.

No seu programa Prós e Contras, (pago por todos nós), Fátima Campos Ferreira, convidou Faria de Oliveira, Ricardo Salgado, Carlos Santos Ferreira e Fernando Ulrich, presidentes, respectivamente, da CGD, do BES, do BCP e do BPI.

O assunto era a decisão do Governo de avalizar os tais 20 mil milhões de euros à banca portuguesa, para fazer face à crise. Entre a assistência, viam-se altos quadros da banca nacional, entre os quais se destacavam ex-ministros do PS e do PSD. Todos dos Prós e nenhum do Contra. Foi um programa dos Prós e Prós, e por isso a D. Fátima estava feliz da vida.

Às tantas, lembrei-me do que por aí se disse a respeito dos lucros da banca nacional, prova indesmentível de que se encontra – ou devia encontar – florescente. Então, porque havia de necessitar deste aval do Estado? É que, se bem me lembro, só nos últimos quatro anos, estes quatro maiores bancos portugueses arrecadaram qualquer coisa como mais de 8 mil milhões de euros, em lucros líquidos, à razão de quase 8 milhões de euros por dia. E que, só nos primeiros seis meses deste ano (já em plena crise, portanto), esta gentinha embolsou nada menos que 727 milhões de euros.

Aqui, a nossa querida Fátima Campos Ferreira podia ter perguntado para onde foram parar estes lucros todos, que bastante jeito faziam agora. Tanto mais que esses lucros foram conseguidos à força das comissões, juros, taxas e outras alcavalas que rapam impiedosamente os bolsos das famílias e das pequenas e médias empresas portuguesas. Coitada. Não se lembrou de pergunta tão elementar. Ou lembrou-se que os seus convidados não apreciariam a pergunta…

Mas que se há-de fazer? Estamos nas mãos deles.

O novo Código do Trabalho socialista provoca a redução de salários, simplifica os despedimentos, reduz direitos, aumenta a precariedade e o desemprego, põe a vida dos trabalhadores nas mãos da entidade patronal, já que os horários de trabalho serão definidos pelo patrão. Na prática pode ser-se obrigado a trabalhar a qualquer dia e a qualquer hora. O trabalho extraordinário deixa de ser considerado como tal, e passa a ser pago em dias de descanso, colocando as horas trabalhadas num chamado banco de horas.

Mas que se há-de fazer? Estamos nas mãos deles.


Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 22/10/2008.
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