21/05/2008

QUANDO OS REIS VÃO NUS

O facto, só por si, não tem um significado por aí além, pois ninguém é perfeito, nem o senhor Pinto de Sousa, também conhecido por «engenheiro» José Sócrates. Por isso, ter sido apanhado em transgressão, violando a chamada Lei do Tabaco, que em boa hora criou – alguma coisa de meritório, enfim, saiu da sua cartola – bem podia ser levado à conta dos pecados menores, se bem que, para quem tanto apregoa o rigor, o bom carácter e outras virtudes que tais, tenha sido algo verdadeiramente muito feio.

Não que me espante, pois a ideia que tenho do sujeito que governa o país permite-me pensar que o acto transgressor não destoa no quadro da personalidade do dito cujo. Para mim, Sócrates está nos antípodas da imagem que tenta vender ao país, ou seja, é um rei que vai nuzinho de todo. Coisa que, segundo as sondagens, parece estar a ser constatada por um número cada vez maior de portugueses.

Fumou, então, o seu cigarro, às escondidas (mas não o suficiente) e o gesto chegou à opinião pública. Que não sabia que estava a violar uma lei; que pedia perdão pelo facto; que ia – vejam lá bem! – deixar de fumar. E riu-se.

Se violar a lei – que seria o primeiro a não poder ignorar – já tinha sido mau, a emenda foi pior do que o soneto.

Não sabia? Depois da algazarra que toda que a lei suscitou? Bom… quando na rua já lhe chamavam mentiroso, o que lhe chamarão agora? Reles trampolineiro? Aldrabãozeco de trazer por casa?

Pede perdão? Então, quando se transgride uma lei basta pedir perdão? Se assim é, pois que se fechem todos os tribunais, esquadras da PSP e postos da GNR, tarefa que o Governo, aliás, parece já ter encetado. Pague mas é lá a multa e deixe-se de tretas, que é o que acontece a quem prevarica, conheça ou não as leis. Olhe! A sua ASAE explica-lhe como é.

Deixa de fumar? Ó senhor «engenheiro» Sócrates! Mas o senhor fumava? Eu pensava que era um grande atleta, capaz de correr meias maratonas (ou por lá perto) e não dispensar umas corridinhas em calções, nem que fosse na Rússia, em plena Praça Vermelha. Afinal, era só para a rapaziada pensar que estava a ser governada por um tipo bestial e sem vícios de qualquer natureza. Olha quem…

Faça-me um favor – e ao país: não deixe de fumar, pode ser? Fume muito, muitos maços por dia e, se possível, vários cigarros de cada vez. Aos três e aos quatro. Fume, satisfaça o vício, encha-se de nicotina e alcatrão, intoxique-se, envenene-se sem remédio. Se o fizer, estará a prestar, de facto – e pela primeira vez – um verdadeiro serviço a Portugal e aos portugueses.

A sério: de tudo isto, o que fica, então, não será a transgressão em si mesma, coisa que se resolvia com a multa, e pronto. Isto é: coisa que se resolvia com dignidade. Mas não: o que fica é o retrato do carácter defeituoso de Sócrates, capaz de recorrer à mentira grosseira (fartinho de saber que não podia fumar onde fumou estava ele…) para salvar a pele e, ainda por cima, não ter o senso do ridículo suficiente para ter evitado aquela de ir deixar de fumar. Como disse – e bem – Marcelo Rebelo de Sousa na RTP, afinal Sócrates não terá deixado de fumar pela única razão válida para o efeito, ou seja, porque o fumo faz mal à saúde, mas porque foi apanhado em falso. E isto, meus amigos, é estupidez chapada.

Mas deitemos esta beata fora e vamos a outras – às verdadeiras – malfeitorias do «engenheiro». Um dos boys de estimação do PS, o doutor Vítor Constâncio, promoveu, por mérito, um quadro do Banco de Portugal que está de licença sem vencimento (leia-se: a amanhar a vidinha noutro lado) há para aí uns oito anos. É a política do regabofe para a aristocracia reinante, a par da política de contenção para a plebe. Haja dinheiro para a boyada, que o resto logo se vê.

Entretanto, as idas a Cuba de centenas de portugueses, para serem operados às cataratas, estão a pôr os nervos em franja a certos sectores da nossa distinta sociedade. Pula o senhor Bastonário da Ordem dos Médicos. Uiva o senhor que diz representar os médicos oftalmologistas. Grasnam alguns senhores deputados nos seus poleiros na Assembleia da República. Murmura qualquer coisa incompreensível a balbuciante ministra da Saúde.
Parece que agora todos têm, afinal, solução para os milhares de portugueses que esperam por uma primeira consulta ou por uma operação que lhes devolva uma visão capaz – ou impeça a cegueira.

Mas onde andavam, nas últimas décadas, estas aves raras, estas hienas de jardim, estas rãzinhas de pântano? Se já havia soluções, porque não as aplicaram em tempo oportuno? Na ânsia de lutarem pelos seus privilégios – uns – ou esconderem a sua insensibilidade e incompetência – outros – não percebem suas excelências que apenas estão a demonstrar ao país que o que sempre os animou não foram os interesses reais da população, mas outros desígnios nada confessáveis. Estão cegos de raiva, é o que é.

Depois disto, só os cegos de espírito é que não viram que interesses se movem à nossa volta, mesmo em áreas tão sensíveis como a Saúde e, dentro dela, numa das mais sensíveis e dramáticas vertentes: manter a luz dos olhos. E se já sabíamos que esta gente não tem alma, isso agora ficou provado. Ou por outra: também vimos estes reizinhos na sua repugnante nudez.

Mas ao mesmo tempo que o país se deixava cegar no meio da baforada de fumo que o senhor «engenheiro» expeliu, os combustíveis voltaram a aumentar. Agora, aumentam todos os dias – ou quase. Atrás disso, tudo aumentará. As petrolíferas, que também vêem aumentar fabulosamente os seus lucros, não sofrem nada com os aumentos. Pelo contrário: só arrecadam. O governo, idem, idem, aspas, aspas. Depois, note-se que o senhor presidente da Galp acompanhou o senhor «engenheiro» na sua viagem à Venezuela. São ovos do mesmo cesto. E, curiosamente, ficámos a saber, pela boca desse cavalheiro que administra a Galp, que a culpa da subida de preços – disse ele – é do «Mercado».

Assim sendo, daqui proponho que acabemos com essa coisa das eleições e dos governos, das constituições e dos parlamentos. O «Mercado» é que decide da nossa vida, e está tudo dito. Ora, como o Mercado é assim uma espécie de ser divino, que todos sabem que existe, mas ninguém viu, então está bem. Siga o baile, e haja muita fé… no tal Mercado.

Mas cá para mim, um dia descobriremos que, disfarçados atrás do Mercado, também andam uma data de reizinhos a comer à grande e à francesa. Todos nus, também. Como veremos, no dia em que os agarrarmos pelas goelas.

Mas, para isso, é preciso ter testículos, que é coisa que vai faltando ao bom povo português…


Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 21/05/2008.
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