20/02/2008

SIM, SENHOR PRIMEIRO-MINISTRO…

"A entrevista da SIC e do Expresso a Sócrates não foi uma entrevista, foi uma sessão de propaganda." A frase é de Vasco Pulido Valente, na sua crónica publicada no jornal Público, de 19 de Fevereiro.

Castanheira Barros, que é o advogado que não desiste de lutar contra a co-incineração no Outão – e no país – enviou-me, por seu turno, esta observação. «Nunca imaginei ser possível pôr dois passarinhos a entrevistar um papagaio. Só mesmo a televisão de Carnaxide seria capaz de uma tal proeza».

Outra opinião: «A entrevista televisionada de 18 de Fevereiro, ao primeiro-ministro José Sócrates, pode ser chamada de conivência jornalística. Neste jogo de cartas marcadas, os que fazem figura de jornalistas estão ali só para fingirem que são isentos. Mas o seu verdadeiro papel é dar as "deixas" e evitar cuidadosamente perguntas que ponham em causa a política neoliberal do governo Sócrates. A técnica destes senhores é cingirem-se aos temas de conjuntura, esquecer os de estrutura e respingar uns salpicos de pequena política. Triste jornalismo este».

Esta visão da cordial conversa foi publicada no site www.resistir.info. Juntas, as três opiniões que transcrevi. completam-se e resumem exactamente o que penso da referida entrevista. Confesso, aliás, que não esperava outra coisa: de Sócrates, o elogio das suas políticas; dos jornalistas, o cuidado de não confrontar o «engenheiro» com a triste realidade social e económica de um país, onde cada vez mais portugueses, quando metem a mão no bolso, só tiram de lá os cinco dedos, como dizia o célebre humorista brasileiro, Apparício Torelli.

Bem pagos – e com emprego certo – os senhores jornalistas não estavam interessados em desagradar ao chefe, coisa perigosa nos tempos que correm. Na verdade, emprego e remuneração dependem sempre – e cada vez mais – de se estar (ou não) nas boas graças de quem manda. E quem manda, por agora, todos sabem quem é. Dobrar a espinha, refrear a língua, ser-se serviçal, faz bem à estabilidade laboral e à conta bancária.

Disse o «engenheiro» que vai conseguir criar os tais 150 mil novos postos de trabalho, pois já conseguiu criar 94 mil. E ninguém lhe perguntou quantos já se perderam, uma vez que o número de desempregados, em finais de 2007, era superior ao registado em finais de 2006, sendo, actualmente, o número mais elevado dos últimos 21 anos. A mistificação, própria para iludir atrasados mentais, passou impune.

Jornalista que se prezasse, que honrasse a sua profissão, teria dito ao chefe dos socialistas e do governo que, para lá da manipulação dos números, há uma realidade vivida por centenas de milhares de portugueses que nem das estatísticas fazem parte. Era forçoso ter lembrado ao distinto entrevistado que o INE só considera desempregados os que não têm emprego ou qualquer ocupação remunerada, e que, de algum modo, procuram obter um emprego. Os “biscateiros”, ou os desempregados que já desistiram de procurar emprego não contam, pelo que o desemprego real atinge muito mais de meio milhão de pessoas. A somar a isto, há milhares de portugueses, sobretudo jovens, em permanente subemprego, com situações precárias, saltando de call center para call center, sujeitando-se a situações verdadeiramente dramáticas em termos de retribuição e perspectiva de futuro.

Depois, há os milhares de portugueses que já desistiram de Portugal, o que seria, se vergonha fosse palavra – e conceito – que fizesse parte do património do PS e do seu capo, uma situação incontornável quando se fala de desemprego, recuperação económica e desenvolvimento. Quantos milhares de novos emigrantes já se espalharam por essa mundo fora, desde que Sócrates é senhor presidente do conselho de ministros? Só em Espanha e Inglaterra contam-se por 200 mil, e sempre a subir.

Isto é: os jornalistas não tiveram a coragem de confrontar Sócrates com as consequências reais das suas políticas, tanto na questão do desemprego, como nas outras áreas abordadas, com a Saúde e a Educação à cabeça. Em vez disso, foi um acabrunhante «sim, senhor primeiro-ministro», reverencial e calculista, não fosse o diabo tecê-las. Eles sabem bem do que Sócrates é capaz, e como certos jornalistas já sentiram na pele a chicotada das irritações do chefe dos socialistas. (Que me desculpem os socialistas a sério).

Mas estamos conversados a este respeito. Afinal de contas, as coisas não mudaram assim tanto desde os velhos tempos de Salazar e Caetano.

Uns dias antes, um homem que não se conforma com a situação miserável a que o país chegou, perguntava. «Como é que se percebe que, em 2006, em Portugal, 100 famílias tenham visto crescer os seus rendimentos em 36%, quando a esmagadora maioria da população teve os seus vencimentos estagnados?». A pergunta, feito por Carvalho da Silva, na apresentação de um estudo sobre as desigualdades elaborado pela CGTP, revela que, no outro lado da moeda, existem mais de 300 mil famílias sem rendimentos. Face a isto, quem se poderá espantar que Portugal seja, no âmbito da UE, o país onde o fosse entre ricos e pobres mais largo é, e, ainda por cima, está em alargamento constante?

A ilustrar o que acabei de dizer, dou-vos um belo e sugestivo exemplo. No campo Grande, foi construído, e está em fase de comercialização, um condomínio de luxo. Os preços começam em 1 milhão de euros nos pisos inferiores, vão subindo conforme a altura, e terminam em 4,5 milhões de euros, nos pisos superiores, ou seja, oscilam entre os 200 mil e os 900 mil contos. Uma ninharia. Apenas quero esclarecer que os pisos superiores (os tais de 900 mil contos), já foram todos vendidos.

Entretanto, milhares de portugueses, especialmente jovens casais, perdem as suas casas, pois o desemprego ou a degradação dos seus salários retiram-lhes o direito a uma habitação digna e, inclusivamente, à sua própria subsistência, tal como a Constituição da República determina e a Declaração Universal dos Direitos Humanos consagra. Em Portugal, pelo que se vê, tanto a Constituição da República, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, só têm aplicação prática em 10% da população.

Esta teria sido outra boa questão para colocar ao senhor presidente do conselho. Mas é próprio dos passaritos reverenciarem o palrar dos papagaios.

Mas já que estamos a falar em desemprego e baixos salários, termino, para desanuviar, com uma interessante lista que ilustra precisamente o contrário. Trata-se uma breve recolha de exemplos onde se verifica que os senhores políticos têm sempre uma dourada linha de fuga após os seus gloriosos tempos de governação. Ou seja: que políticos e senhores da alta finança estabeleceram um eficaz vaivém de cadeirões e gabinetes, um toma-lá-dá-cá de convenientes conivências, de tal modo que ser-se ministro escancara as portas dos conselhos de administração de empresas públicas ou privadas, e ser-se gestor é meio caminho andado para se chegar a ministro.

Vamos, tão, à tal lista, onde podemos constatar como nomes célebres da política estão – ou estiveram – em altos cargos da gestão empresarial.

- Fernando Nogueira: de Ministro da Presidência, Justiça e Defesa, chegou a presidente do BCP Angola;

- José de Oliveira e Costa: de Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais,
saltou para presidente do Banco Português de Negócios (BPN);

- Rui Machete: de Ministro dos Assuntos Sociais, foi a presidente do Conselho Superior do BPN e presidente do Conselho Executivo da FLAD;

- Armando Vara: ministro-adjunto do primeiro-ministro (demitido por indecente e má figura), passa a director adjunto da CGD, depois a administrador e, finalmente, a vice-presidente do BCP;

- Paulo Teixeira Pinto: de Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, a presidente do BCP. (Depois de 3 anos de "trabalho", sai com 10 milhões de indemnização e mais 35.000 euros x 15 meses por ano, até à hora da sua morte…);

- António Vitorino: de Ministro da Presidência e da Defesa vai a vice-presidente da PT Internacional e a presidente da Assembleia-Geral do Santander Totta;

- Celeste Cardona: de Ministra da Justiça passou a vogal do CA da CGD;

- José Silveira Godinho: de Secretário de Estado das Finanças, a administrador do BES;

- João de Deus Pinheiro: de Ministro da Educação e Negócios Estrangeiros, a vogal do CA do Banco Privado Português;

- Elias da Costa: de Secretário de Estado da Construção e Habitação, a vogal do CA do BES;

- Ferreira do Amaral: de Ministro das Obras Públicas (que entregou todas as pontes a jusante de Vila Franca de Xira à Lusoponte) a presidente… precisamente da Lusoponte;

- Mira Amaral: de Ministro da Economia a administrador da CGD, de onde é reformado, após 18 meses de exaustivo trabalho, com uma reforma de 3.600 contos mensais.

E, caros amigos, por falta de espaço e tempo, fiquemo-nos por aqui, que para exemplo já basta. Mas são estes – ou outros parecidos – que compram os tais apartamentos de 900 mil contos.

Entretanto, viva a República!

E – principalmente – viva a Democracia nacional-socialista, que é, actualmente, o maior albergue de parasitas de que há memória neste desgraçado país.


Crónica de: João Carlos Pereira
Lida nas “Provocações” da Rádio Baía em 20/02/2008.
(Não deixe de ouvir em 98.7 Mhz e participar pelos telefones 212277046 ou 212277047 todas as quartas-feiras entre as 09H00 e as 10H00).

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Ó parvalhão já não te lembras quando querias ser veriador e os teus camaradas não te deram luz verde para que isso acontecesse , mal seria para todos os municipes,por isso é que bateste com a porta ao partido que te meteu num reles presidente da junta que foste onde só conseguiste arranjar merda.

20/2/08 7:47 da tarde  

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