17/07/2007

REFLEXÕES XIV

BUSH, A SAÚDE E A EDUCAÇÃO

Não farei referência à saúde e à educação de Bush, mas à dos seus vizinhos. O acto não foi improvisado. A agência AP conta como iniciou as suas palavras: “Neste país temos corações grandes”, disse em espanhol perante uns 250 representantes de grupos privados e religiosos, fundações e ONGs que foram a Washington com os gastos pagos pelo seu governo. Deles, procediam dos Estados Unidos aproximadamente 100.

A reunião, chamada Conferência da Casa Branca sobre as Américas, faz parte das ideias que Bush desenhou no começo da visita por cinco países latino-americanos no início de Março, sobre o que o seu governo esperava da região no pouco tempo que lhe resta no cargo.

Bush convocou a conferência para falar de diversos temas, nomeadamente educação e saúde. “Para nós é importante ter uma vizinhança saudável e educada”, disse nas declarações improvisadas durante uma conversa com seis dos presentes, Guatemala, Estados Unidos, Brasil, Haiti e México, que partilharam a sua mesa à maneira de colóquio.

Afirmou coisas inacreditáveis, tais como “o trabalho árduo que estamos a realizar na vizinhança”.

Falaram: Bush, o Secretário do Tesouro, o Sub-secretário de Estado para Assuntos do Hemisfério Ocidental e a Sub-secretária de Estado para Assuntos Públicos. Junto deles, presidiram os grupos de trabalho nos quais se baseou a reunião, vários membros do gabinete. Todos falaram até pelos cotovelos.

Mencionaram que Bush criou no Panamá um centro que capacitou mais de 100 doutores de seis países de América Central. Referiram-se, com grande ênfase, ao “Comfort”, um dos maiores navios-hospitais do mundo, que acaba de aportar no porto do Panamá, depois de ter visitado a Guatemala.

Bush dedicou 55 minutos do seu tempo a essa actividade, que teve a sua sede num hotel da cidade de Arlington, Virgínia, na periferia de Washington.

Sem hesitar, Condolezza, Secretária de Estado, juntou-se ao coro para falar de Cuba.

Segundo outra agência de notícias, quando o nosso Conselho de Estado, cumprindo as normas constitucionais, acabava de convocar as eleições, ela declarou que “Os Estados Unidos esperam que os próprios cubanos decidam sobre o seu futuro”, e acrescentou: “Washington não tolerará a transição de um ditador para outro”.

No seu discurso inicial, Bush afirmou conceitos realmente insólitos para o chefe de um império global planetário, bem consciente do seu poder e do seu papel pessoal, registados pormenorizadamente pela agência espanhola de imprensa EFE: “O Presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, instou hoje os governos da América Latina a serem honestos, transparentes e abertos.” […] “O mandatário afirmou que as sociedades abertas e transparentes são as que levam a um futuro esperançoso.”

“Esperamos que os governos sejam honestos e transparentes. Rejeitamos a noção de que esteja tudo bem e que haja corrupção no seio de um governo…”

“Beneficia-nos ajudar um vizinho que o precisar. Renova a nossa alma e eleva o nosso espírito colectivo. Acho que a quem muito lhe é dado, muito lhe é exigido, e a nós, como país, foi-nos dado muito, pelo que acho que somos obrigados a ajudar as pessoas”, insistiu.

Bush está ciente de que mente e que os seus embustes são difíceis de engolir, mas não se importa com isso. Confia em que, se for repetido mil vezes, muitos terminarão a acreditar nele. Porquê tanto ardil? O que o aborrece essencialmente? Desde quando surgiu o vaivém?

Bush descobre que o sistema económico e político do seu império não pode concorrer em serviços vitais, como a saúde e a educação, com a Cuba agredida e bloqueada durante quase 50 anos. Todo o mundo sabe que a especialidade dos Estados Unidos em matéria de educação é o roubo de cérebros. A Organização Internacional do Trabalho assinala que “47 por cento das pessoas nascidas no estrangeiro que completam um Doutoramento nos Estados Unidos, ficam nesse país”.

Outro exemplo de pilhagem: “Há mais médicos etíopes em Chicago do que em toda a Etiópia”.

Em Cuba, onde a saúde não é mercadoria, podem fazer-se coisas que Bush não é capaz de imaginar.

Os países do Terceiro Mundo não dispõem de recursos para criarem centros de investigação científica, e Cuba, no entanto, tem-os criado apesar que os seus próprios profissionais eram muitas das vezes exortados e incentivados para desertarem.

O nosso método de alfabetização “Eu posso, sim", está hoje gratuitamente ao serviço de todos os países latino-americanos, aos quais, se desejarem aplicar o programa, serão apoiados na adaptação às suas características próprias com a produção dos materiais impressos e de vídeo correspondentes.

Países como a Bolívia aplicam-no em castelhano, quetchua e aimará. Somente os que ali aprenderam a ler e escrever em apenas um ano, são mais do que os alfabetizados pelo império em toda a América Latina, se existir algum. Não falo de outros países como a Venezuela, que fez verdadeiras proezas educacionais num brevíssimo espaço de tempo.

“Eu posso, sim” beneficia outras sociedades fora do hemisfério ocidental. Basta assinalar que na Nova Zelândia é utilizado na alfabetização da população Maorí.

Em lugar dum estabelecimento de treino para profissionais médicos na América Central, por onde já passaram ao redor de 100 – o que nos alegra – o nosso país tem hoje dezenas de milhares de bolseiros da América Latina e do Caribe, que durante seis anos se formam gratuitamente como médicos em Cuba. Não se excluem, é claro, os jovens norte-americanos, os quais levam muito a sério os seus estudos.

Cooperamos com a Venezuela na formação de mais de 20 000 jovens, que estudam Medicina e assistem às consultas nos bairros pobres, atendidos por especialistas cubanos para se familiarizarem com a sua futura e difícil tarefa.

O “Comfort”, com mais de 800 pessoas a bordo, entre pessoal médico e a tripulação, não poderá atender um grande número de cidadãos. Resulta impossível realizar programas médicos por episódios. A reabilitação, por exemplo, em muitos dos casos precisa de meses de trabalho. Os serviços que oferece Cuba ao seu povo numa policlínica ou num hospital habilitado são permanentes, e os pacientes podem ser atendidos a qualquer hora do dia ou da noite. Temos formado os reabilitadores necessários.

As operações da vista também precisam de uma especial habilidade. No nosso país os hospitais oftalmológicos operam à vista mais de 50.000 cubanos por ano e atendem 27 tipos de doenças. Não existe lista de espera no transplante de córnea, que requer uma organização especial. Façam uma pesquisa activa nos Estados Unidos e poder-se-á ver quantas pessoas precisam serem operadas realmente entre os habitantes do país, que por não serem nunca examinados por um oftalmologista atribuíam as suas limitações a outras causas e correm o risco de ficarem cegos ou seriamente afectados da vista. Comprovarão que são milhões de pessoas.

Não incluo no número mencionado as centenas de milhares de latino-americanos e caribenhos que são operados, uma parte em Cuba, e a maior parte deles nos seus respectivos países, por oftalmologistas cubanos. Só na Bolívia somam mais de 100.000 por ano. Neste caso participam, junto dos nossos especialistas, médicos bolivianos formados na Escola Latino-americana de Medicina (ELAM).

Veremos como o “Comfort” resolve a situação no Haiti, prestando serviços de saúde durante uma semana, onde em 123 comunas de 134 no total com que conta o país, tem médicos cubanos e formados da ELAM, ou estudantes haitianos do último do curso, para combaterem a SIDA e outras doenças tropicais.

O problema é que os Estados Unidos não podem fazer o que faz Cuba. No entanto, pressiona brutalmente firmas produtoras de excelentes equipamentos médicos fornecidos ao nosso país, para impedirem que reponham determinados programas computorizados ou alguma peça sobressalente que têm patente dos Estados Unidos. Posso citar casos concretos e o nome das firmas. É nojento, embora tenhamos soluções que nos tornam menos vulneráveis nesse terreno.

Há menos de 6 meses, Bush ainda não tinha inventado a ideia de universalizar a produção de combustível a partir de alimentos dentro e fora dos Estados Unidos. Os que conhecem o valor das gorduras e dos alimentos proteicos na alimentação humana sabem das consequências que tem para grávidas, crianças, adolescentes, adultos e idosos a carência dos mesmos. O peso da sua escassez recairá nos países menos desenvolvidos, isto é, na maior parte da humanidade. Para ninguém será uma surpresa a elevação dos preços dos alimentos básicos e da instabilidade social que trará consigo. Ontem, sexta-feira 13, o petróleo subiu a 79,18 dólares o barril. Outra consequência da dança dos papéis e da guerra no Iraque.

Há apenas 48 horas o Secretário de Segurança dos Estados Unidos, Michael Chertoff, declarou que “tinha a sensação visceral de que poderia acontecer um atentado na temporada estival” nesse país. Uma coisa semelhante expressou a Secretária de Estado e posteriormente o próprio Presidente dos Estados Unidos. Mas ao mesmo tempo que informavam dos riscos potenciais, envidavam esforços por tranquilizar a opinião pública.

O governo dos Estados Unidos que tudo vê e tudo escuta, com ou sem autorização legal. Dispõe, aliás, de numerosos órgãos de inteligência e contra-inteligência com inúmeros meios económicos destinados à espionagem. Pode obter a informação de segurança que precisar sem sequestrar, torturar ou assassinar em cárceres secretos. Todo o mundo sabe dos verdadeiros propósitos económicos que perseguem com o uso mundial da violência e da força. Qualquer ataque contra a sua população o pode evitar, salvo que prevaleça a necessidade imperial do estrondo para prosseguir e justificar a brutal guerra que decretou contra a cultura, a religião, a economia e a independência de outros povos.

Devo concluir.

Amanhã, domingo, é o Dia das Crianças. Nelas penso quando escrevo esta reflexão. A elas a dedico.


Fidel Castro Ruz
14 de Julho de 2007

2 Comments:

Blogger JIM said...

Tenho lido todas estas crónicas de Fidel de Castro. Sinceramente, quando as leio, não posso deixar de me emocionar com a forma como ele aborda a diferença existente entre uma super potência e o seu próprio país, país que eu conheço e que comparo ao fogo que Prometeu roubou aos deuses para dar aos homens. Para mim Cuba é a chama da esperança da humanidade.
Eu vi de perto tudo aquilo de que ele fala.
Já são umas vezes que vou a Cuba, mas vou trabalhar no campo, junto com os cubanos.
Estive na Escuela Latino Americana de Ciencias Medicas, e conversei com alunos de diversos paises latinos-americanos e dos PALOPS.
Aparte a formatura em medicina convencional podem fazer especialização em alternativas.
Estive em Tarará, um centro de tratamento de leucemia, para crianças e jovens afectados por Chernobyl e não só.
Em 2002, 26 de Julho, estive numa manifestação, no Malecón, para comemoração da vitória da Revolução Cubana. Foi qualquer coisa de impressionante.
Não havia lá ninguém de "Cabeceiras de Bastos". Quem estava, estava de vontade.
J.C.Pereira, não vou alongar-me, mas,como dizia Fidel Castro em relação aos equipamentos médicos, lembrei-me de uma conversa que tive com cientista cubano que trabalhava no estudo de Org.Gen.Modificados.
Dizia-me ele, "sabes José, todo o embargo que eles nos fazem fez despertar em nós um espirito inventivo que nos faz ultrapassar as as dificuldades que nos são colocadas".
Uma vez disse à esposa de um antigo embaixador cubano em Portugal
"Que gostaria de morrer em Cuba" a sua resposta foi "Cuba é uma terra de vida não de morte. Morte só Patria ou Muerte".
Ficaria aqui a escrever sobre "Mi Cuba querida"
sei lá até quando, tanto é o respeito que tenho aquela ilha, aos seus governantes, ao seu povo e principalmente à ideia de Liberdade que desperta nos povos explorados deste nosso mundo.
Um abraço fraterno.

18/7/07 11:06 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Caro José

Não sei se mereço - ou melhor: sei que não mereço - «entrar» nas considerações que são feitas quando o seu sujeito é Fidel ou Cuba. Ou a luz de esperança numa sociedade livre da vontade imperial dos mercadores de tudo - até da vida e da morte.

Em todo o caso, acompanho as suas reflexões sobre o assunto e nao preciso de reafirmar que Cuba, os seus governantes e o seu povo são os faróis que nos ajudam a atravessar este mar violento de mentira, violência, exploração, morte e sanguinolenta rapinagem, que é este mundo dirigido pelos EUA e os seus vassalos de maior ou menor (como é o caso de Portugal)
grandeza.

Uma coisa me parece certa: não somos tão poucos como alguns julgam, nem tão passivos como muitos de nós tememos.

Um grande abraço.

19/7/07 10:34 da manhã  

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